Nuno Rogeiro
A Europa parte-se, quanto aos imigrantes e
aos refugiados. Todos os acordos são limitados, duvidosos, quase não sinceros.
O dito “populismo” que se propaga, é que devora governos a fio, é a reação
natural às pomposas declarações, às grandes promessas e aos enormes planos, que
levaram ao caos e ao impasse.
Em 2013 explode a crise entre
Passos Coelho e Paulo Portas. Há uma demissão por SMS, nervos e picardia, a
intervenção pacificadora e austera de Cavaco. Salva -se por um triz o
"governo de salvação nacional".
Tudo derivava, para além das
abismais diferenças pessoais, de um problema político real: como reagir, com rigor,
mas sem injustiça social, à crise da dívida soberana e ao ultimato da troika,
depois da bancarrota socrática?
O mesmo para o corrente drama
de faca e alguidar entre Angela Merkel, da CDU, e Horst Seehofer, da
fracção/facção bávara CSU. A chanceler quer continuar uma política de imigração
"responsável", mas que respeite "as responsabilidades e os
compromissos" europeus, enquanto o ministro do Interior exige restrições
severas, e controlos fronteiriços cada vez mais rigorosos, em face do que
apelida de "compromissos ocos" e "falhanços estrondosos".
Seehofer não está sozinho: tem
o chefe do governo da Baviera, Markus Söder, e o chefe das regiões locais,
Alexander Dobrindt, consigo. E percebe que, por causa da pressão demográfica
(real ou imaginada), está a refundar-se o sistema partidário alemão, com o
triunfo relativo do AfD.
Merkel também não luta sem
aliados. O principal apoio vem da legitimidade histórica da sua experiência e
sobrevivência. Depois há o encorajamento – modesto, mas detectável – de
Emmanuel Macron e outros líderes da "velha ideia" de Europa. Por fim,
o suporte de boa parte da CDU e do SPD. Mas estes, como os chefes europeus
referidos, estão também em crise e em recuo.
O principal culpado, o papão,
a besta negra, é, evidentemente, o "populismo".
Mas o que é o
"populismo" senão outro nome para a impaciência de cidadãos cansados
de uma "democracia" meramente representativa e indireta, ritual e
cíclica?
E este "populismo"
não é mais do que a reação a uma outra forma de demagogia. A dos grupos
irresponsáveis da dita "esquerda radical" (o que vale hoje um rótulo?),
que advogaram uma imigração sem verificação biométrica, sem limites, sem
medição das possibilidades de acolhimento, integração, sustentação e incentivo
ao retorno.
A frase destes tribunos,
entretanto abandonados pela plebe, hoje silenciosos, era "deixem entrar, e
depois veremos".
Vimos. Estamos agora na fase
de (a)pagar as promessas.
Todos perceberam, a partir de
2012-2014, que a Europa seria a fortaleza decadente, mas ainda assim próspera,
invadida por sobreviventes de guerras mais ou menos próximas. Todos entenderam
que era preciso ser generoso e lidar com a emergência. Mas do acordo de
princípio nunca se chegou à disciplina dos meios, nem à sólida construção dos
fins.
Estamos assim num novo
impasse, mesmo que as torrentes migratórias já não sejam as avalanches que
italianos, gregos e espanhóis tiveram de enfrentar, quase sozinhos.
Devemos fortificar a guarda-costeira
líbia? Devemos ajudar Marrocos, a Tunísia, o Egito, a construir megacampos de
acolhimento, seleção e triagem? Como acabar com a guerra na Síria, e convencer
os vivos a regressar aos sítios de morte? Como responsabilizar os estados
vizinhos da Síria e do Afeganistão, que deixaram à Turquia, ao Líbano e à
Jordânia todo o ónus humanitário? Como criar um cordão sanitário em torno do
intratável Sahel?
Demasiadas perguntas,
demasiadas incertezas.
Título, Imagem e Texto: Nuno Rogeiro, SÁBADO, nº 740, de 5 a 11 de julho de 2018
Título, Imagem e Texto: Nuno Rogeiro, SÁBADO, nº 740, de 5 a 11 de julho de 2018
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