Humberto Pinho da Silva
Admirava-se Demóstenes que a
multidão delirasse ao escutar marinheiros ignorantes que subiam à tribuna e não
ouvisse, com o mesmo entusiasmo, seus discursos, que eram literariamente
perfeitos.
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Busto de Demóstenes, no Museu do Louvre |
Ao lamentar-se a ator, seu
amigo, este disse-lhe para recitar poemas de Eurípedes ou Sófocles.
Demóstenes recitou alguns
poemas. Em seguida, Sátiro, declamou, e nem pareciam os mesmos...
Desde então, Demóstenes
convenceu-se que para ser ouvido, com entusiasmo, não bastava construir bem as
frases, era necessário falar com convicção e ardor.
Isolou-se num subterrâneo,
para que não fosse ouvido, e metendo seixos na boca (era um pouco gago) lia e
discursava para as paredes.
E nunca mais deixou de cuidar
da forma como se exprimia, acompanhando os discursos com gestos e diferentes
intuições.
Certa vez, estando a tratar de
assuntos de Estado aos atenienses, verificou que pouca atenção prestavam.
Aproveitou o momento para
demonstrar que o povo não passa de criança-adulta, principalmente quando está
em multidão.
E, interrompendo a importante
dissertação, disse-lhes:
“Lembrei-me agora de caso e
vou contar-vos, antes que o esqueça”.
Todos os olhos se cravaram no
orador.
“Um homem alugou um burro para
ir a Atenas. O dono do burro acompanhava-o a pé. O calor era diabólico. Não
havia sombras. Tudo fervia. Então, o homem desmonta e senta-se na beira da
estrada, à sombra do burro. O dono do burrico, que sufocava de tanto calor,
protestou, dizendo: “Aluguei o burro, e não a sombra!”. Retorquia o outro,
argumentando: “Alugando o jerico, aluga, também, a sombra dele!”
Demóstenes suspendeu com
elegância a capa e desceu do púlpito.
A multidão reclamou, excitada:
“Queremos ouvir o resto da
história!”
Mas o orador, voltando-se para
aquele mar de gente curiosa, rematou:
”Para vós é mais importante a
história de um burro do que os negócios de Atenas!”
Esta perícope lembra-me o povo
do nosso tempo: escuta com mais atenção o corrupto, o ambicioso, do que o
virtuoso, cuidador do bem da Nação.
O povo não passa de
criancinha, de memória curta; de cata-vento, que vira, consoante sopra a última
brisa.
Sempre foi assim e assim será…
porque não há nada mais volúvel do que o ser humano.
Título e Texto: Humberto Pinho da Silva
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