Um grande túnel azul, verdadeira estufa, é cenário de venda de mercadorias de procedência duvidosa, se tornando um verdadeiro empreendimento do crime. Enquanto isso, o único Shopping formal da região fecha as portas de sua praça de alimentação face à decadência da região que caminha para se tornar uma nova Feira de Acari
Quintino Gomes Freire
Começando praticamente no Largo da Carioca, em frente à loja de esquina com a rua da Carioca, ocupada por muitos anos pelo Ponto Frio e fechada há quase uma década, o que se vê é um túnel de lona sem fim instalado no canteiro central, onde o pedestre caminha pela “área coberta” da filial do Centro de uma verdadeira feira de Acari. Num calor de rachar – a lona não é exatamente o material mais desejável para manter-se o frescor e a brisa do ar livre – o que se vê é uma sucessão de mercadorias falsificadas expostas no chão por camelôs sentados em cadeiras de praia, comendo quentinhas que cheiram a vencidas, sem que haja sequer um metro de intervalo entre uma e outra exposição irregular de mercadorias. Um pesadelo da mobilidade.
Caminhando-se em direção à rua do Ouvidor, vê-se lojas e mais lojas vazias, mas com suas frentes ocupadas por camelôs vendendo outros tipos de mercadoria no que sobrou da calçada. Mas ainda assim não se consegue circular pelo canteiro central sem ser andando para frente – e olha que atrás vem gente – ou para trás. É como se fosse uma edificação sem paredes, um verdadeiro centro comercial, onde reina o irregular e as placas de “Compro Ouro”. É, sim; ali possivelmente compram o que roubaram daquele senhor espancado na rua Buenos Aires outro dia.
As malas de viagem são um caso
à parte. Mais prestigiado, o “comerciante” que as vende ganhou direito a
“ancorar” o ridículo empreendimento, construção azul que lembra uma mistura de
Nova Delhi com Dakar. São dezenas de malas, mochilas e valises vendidas em meio
às cuecas “Calvin Klein” de 5 e 10 reais. Depois de passar pelo prestigioso
comércio de bagagens, retornamos ao túnel quente e que simboliza o caos e a
desordem instaladas por Marcelo Crivella no Centro, mas que, por conta do tempo
passado e da sua transformação recente em verdadeiro Shopping, parece já contar
com o apoio do prefeito, ou, ao menos, de seus responsáveis pela manutenção da
Ordem Pública. Sabemos que o carioca é bagunceiro, mas tudo tem limite.
Seguranças de prédios na região – os que ainda tem emprego – disseram em anonimato à reportagem que a “Prefeitura tem medo porque sabe que os camelôs da Uruguaiana tem a proteção da milícia e, em alguns pontos, do Jogo do Bicho”. Um deles explicou que os pontos onde os camelôs clandestinos ficam são antigos pontos de contravenção; mas que como ‘ninguém mais joga no bicho ali‘, o ‘dono dos pontos’ alugaria estes pontos para camelôs, que pagariam semanalmente pela ocupação do espaço público. Não sei vocês, mas eu prefiro apostar 100 na Girafa do que ter minha cidade tomada pelo caos. Outro vigia explicou que os camelôs chegam a esconder armas em carros parados nas ruas Reitor Azevedo do Amaral e até mesmo escondem paus e barras de ferro que usam para assustar guardas municipais em cima e embaixo de bancas de jornal da região. Numa esquina mais adiante, um camelô vende tranquilamente quentinhas direto de um carro lotado, enquanto seus ‘colaboradores’ tentam equilibrar cerca de dez máquinas de cartão de crédito. Há quem diga que pudesse já alugar uma loja.
Recentemente, o Shopping
Paço do Ouvidor, na região, jogou a toalha. Encerrou esta semana as
atividades de sua Praça de Alimentação refrigerada e com 1.500m2, com banheiros
luxuosos e 2 escadas rolantes, por conta da escalada da camelotagem ilegal que,
segundo informa uma funcionária do Shopping, ainda tinha o hábito de usar os
banheiros do empreendimento e levar quentinhas para comer nas mesas da Praça,
que, segundo anunciada na época, recebeu um investimento de mais de 5 milhões
de reais para estar à altura de qualquer empreendimento da Zona Sul. Procurada,
a assessoria do Shopping espelhado – prédio mais moderno da região – disse que
está “estudando um novo mix”. “A região está entregue às baratas e
aos camelôs, que mandam e desmandam, inclusive impedindo a passagem de carros,
cobrando pedágio, e agora mais recentemente, proíbem as pessoas de passar e
atravessar de um lado a outro da rua, sem ser pelas ruas transversais. Fazem
cara feia e ameaçam quem tenta penetrar o grande tubo azul”, diz a
comerciante Henriqueta Dias, que fechou seu comércio e colocou sua loja para
alugar. Há 4 anos.
Enquanto grande parte do
Centro se valoriza e vê mudanças, a região da Uruguaiana e do Largo de São
Francisco agoniza, vendo o fechamento de mais e mais lojas, e o aumento da
camelotagem que reina sem qualquer tipo de combate pelas autoridades, cúmplices
absolutas da destruição de um polo comercial valorizado, assim como também da
receptação de produtos roubados, e da venda de mercadoria falsificada nas
barbas de uma polícia que olha pro outro lado e de uma prefeitura que parece
ter decidido que para Reviver o Centro tem que matar a Uruguaiana, que agora
volta a merecer seu nome original.
Título e Texto: Quintino
Gomes Freire, Diário
do Rio, 1-11-2023
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