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"Angústia", óleo de David Alfaro Siqueiros
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José Carlos Bolognese
No dia 12 de outubro atingimos
a incrível, inaceitável e injustificável marca de 5 anos e meio de um covarde e
arbitrário calote em nossa aposentadoria. Mas, falar em perda de de poupança e
pensão é muito pouco, pois esses termos, por mais que se esforcem, não podem
definir o que é passar a vida trabalhando, atento ao passar dos anos, poupando
para um futuro um pouco menos incerto e descobri-lo comprometido pela
irresponsabilidade de terceiros.
Aposentar-se de um emprego de
muitos anos não significa retirar-se da vida. Ao contrário, poderiam ser os
melhores da vida de um trabalhador se o trato fosse feito com gente séria.
Contudo, da maneira como são tratados os aposentados nesse país, parece ser o
sonho dourado de todos os governantes brasileiros, senão mesmo uma política de
estado, ver o trabalhador ser extinto junto com seu emprego.
Não é incomum uma pessoa em
situação como a nossa, remexer o passado e se perguntar com algum embaraço, se
fez algo de errado. Com vergonha até, perguntar-se, se contribuiu para o seu
sofrimento e o dos familiares. Mas não é preciso ir muito longe para descobrir
que se há uma vergonha aí, ela não lhe pertence. É uma vergonha alheia, criada
por mentes que não abrigam esse sentimento.
Desde o começo - antes e
depois do fim da Varig - os fatos que contam são:
1) Um fundo de pensão privado
foi criado para complementar as aposentadorias dos trabalhadores na aviação.
2) A estrutura jurídica do
Aerus foi baseada em leis vigentes no país - e não comprada em uma banca de
camelô.
3) Os funcionários das
empresas pagaram religiosamente a sua parte no contrato.
Nada disto foi defendido, fiscalizado ou protegido pelo estado como era sua obrigação. Daí, a trágica situação em que se encontram os aposentados do Aerus até este mês de outubro de 2011. Sem esquecer os demitidos e os familiares dos mais de 580 que faleceram sem ver solução alguma.
Quando reclamamos nossa
aposentadoria de volta, não damos a ninguém o direito de duvidar que seja
legítima. Nós realmente pagamos parte de nossos salários segundo um modelo
instituído dentro de perfeitos marcos legais.
Assim como uma mentira não
vira verdade só por ser muito repetida, uma verdade não vira um delírio só
porque sua repetição incomoda.
Eu também concordo com o
ministro do STF quando ele fala de uma emenda que pode tornar a justiça não
apenas mais ágil, mas... muito mais ágil. Concordar é uma coisa. Acreditar
porém, é bem outra. Em que mundo vive essa gente que sempre, ao ser
questionada, declara-se comprometida com os mais profundos interesses sociais,
mas não consegue ou não se esforça para ir do discurso à prática? Das
autoridades aceitaria com prazer se, ao declararem suas boas intenções,
estivessem sinceramente compreendendo que nós, ao falarmos do calote em nossa
aposentadoria, estamos falando em termos muito reais, que nos faltam recursos
para pagar um plano de saúde. Em vez de declarações genéricas sobre princípios
republicanos, geralmente desprezados no mundo real, preferia que um ministro,
uma autoridade dessas, perguntasse como é que a gente faz pra viver. De que
forma vivemos o problema de não poder ir ao dentista quando um dente dói.
Quando e como compramos um par de óculos novos porque o nosso quebrou ou ficou
defasado. Se temos acesso ao lazer e, se ele, como às demais pessoas, faz
falta.
De minha parte quero deixar
bem claro que não serei grato a nenhuma autoridade, pois ao virem com uma
solução para o Aerus, depois de tantos anos sabendo o que essa demora
acarretou, não vão pensar por certo naqueles aos quais ela não alcançou. Serei
grato apenas a Deus e aos colegas que realmente se empenharam desde o começo
para reparar uma injustiça histórica. Às autoridades concederei apenas os
cumprimentos por terem afinal enxergado a luz da razão.
A caminho do sexto Natal sem o
nosso dinheiro, esperamos que essa luz ilumine essas autoridades dissipando as
trevas da hipocrisia. E se mais este Natal for como os últimos cinco, quando
passamos vergonha por não podermos estar como pessoas normais, vamos lembrar
que é a vergonha dos outros que faltou se mostrar. A vergonha alheia.
Título e Texto: José Carlos Bolognese
Edição: JP
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