João Bosco Leal
Em meados da década de 60,
menos de 50 anos atrás, costumava passar as férias escolares em uma propriedade
rural, onde sequer a energia elétrica existia. As geladeiras, para os que na
época possuíam esse conforto no meio rural, assim como os lampiões para iluminação,
funcionavam a querosene ou, quando já mais modernas, a gás.
As parteiras ainda eram muito
comuns em toda a região e raramente uma mulher era levada para que seu parto
fosse realizado em um hospital. Doenças mais comuns e até pessoas picadas por
cobras, muitas vezes eram tratadas por benzedores, trazidos de distâncias até
maiores de onde existiria um médico, tamanha era a fé de muitos em sua
capacidade de cura.
Crianças nuas e descalças
brincavam no quintal de terra das casas puxando um barbante que na outra
extremidade transpassava uma lata de massa de tomate vazia que rolava, como se
fosse um carrinho, ou correndo com um velho cabo de vassoura entre as pernas,
seguro em uma das pontas por dois fios de barbante imitando rédeas, como se
montado em um cavalo e as espigas de milho retiradas do pé ainda pequenas, na
fase em que na ponta possuem uns fiapos, como fios de cabelo, eram as bonecas.
Ao seu lado, galinhas e porcos
soltos cruzavam o esgoto que corria a céu aberto, buscando restos de comida e
eram tocados pelos cães quando tentavam roubar alimentos depositados nas
varandas das casas onde, em um gancho feito com a canela seca de um veado,
também estava pendurado todo o equipamento de montaria dos trabalhadores, que
raramente possuíam uma geladeira ou sequer um lampião a gás, utilizavam
lamparinas a querosene e mantinham a carne salgada, o charque, ou frita e
armazenada em pedaços, imersa em banha suína, em latas de 20 litros fabricadas
especificamente para esse fim.
Todas essas cenas eram muito
comuns no interior do Estado de São Paulo, o mais desenvolvido do país,
possibilitando imaginarmos como seria a vida nas regiões mais distantes, menos
desenvolvidas. Mesmo assim, muitas pessoas com mais de 30, 40 anos, que nunca
haviam ido a um consultório médico ou odontológico e haviam sido criadas em
condições de higiene ainda piores daquelas vividas por seus filhos, possuíam a
dentição perfeita, com lindos sorrisos, sem nunca ter tido uma só cárie ou
qualquer outro tipo de doença.
Atualmente as crianças são
superprotegidas, passam o dia diante da televisão ou de jogos eletrônicos, e
mesmo os que praticam algum tipo de esporte se exercitam muito menos que seus
antepassados. Como não andam descalças e possuem raríssimos contatos com a
natureza ou animais domésticos, como tiveram seus pais e avós, elas não são
expostas a vírus e bactérias comuns no meio ambiente, dificultando a criação
natural de diversos anticorpos em seu organismo.
A agressão física que sofremos
pelo uso das novas tecnologias, necessárias para a produção de alimentos
suficientes para alimentar os bilhões de pessoas que hoje habitam nosso
planeta, está nos tornando seres muito mais frágeis, suscetíveis a diversas doenças
causadas principalmente pelos novos tipos de alimentação e a inatividade
física.
Ao despertar escovamos os
dentes com uma pasta repleta de produtos químicos; tomamos café produzido com
muitos agrotóxicos; inseticidas são aplicados quase que diariamente na produção
de hortaliças, frutas e verduras; antibióticos são usados em larga escala na
produção de aves e suínos; a água que bebemos contém flúor e outros produtos
para purificá-la e equilibrar seu PH, enquanto as fábricas despejam milhares de
carros, caminhões e motocicletas diariamente nas ruas, aumentando
exponencialmente a emissão de gases poluentes na atmosfera.
Com o conhecimento gerado
pelas pesquisas realizadas nos últimos cinquenta anos, surgiram novas drogas,
vacinas, exames preventivos, equipamentos hospitalares e tantas outras
possibilidades que a média de vida do brasileiro quase que dobrou no período.
Enquanto a evolução científica
prorroga a expectativa de vida e nos proporciona maiores confortos, os veículos
mais acessíveis a todos, a diminuição dos trabalhos braçais, a consequente
falta de exercícios físicos e os alimentos industrializados, nos tomam a saúde.
Título, Imagem e Texto: João Bosco Leal
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