quinta-feira, 10 de janeiro de 2013

Constituição

João César das Neves 

Em Portugal apenas um partido costuma habitualmente invocar a Constituição: o PCP. Mais ninguém cita a lei fundamental, exceto nas tentativas sempre falhadas de a rever. A razão é evidente: o texto concebido em 1976 é estruturalmente comunista. Apesar de sete revisões (1982, 1989, 1992, 1997, 2001, 2004 e 2005) no século XXI ela continua a pretender «abrir caminho para uma sociedade socialista» (preâmbulo) e quer o «planeamento democrático do desenvolvimento económico e social» (art. 80 e). Por isso os marxistas são os únicos satisfeitos com ela. Todos os outros a querem mudar mas, como nenhum deixa que os outros a mudem, ficamos na situação caricata de ter uma lei básica a que afinal ninguém liga.
Prova disso é a (falta de) atenção dada ao Tribunal Constitucional. Desde que começou a trabalhar, a 31 de Maio de 1983, essa meritíssima instituição já emitiu 17 609 acórdãos, uma média de quase 2 por dia (incluindo domingos e feriados). Praticamente nenhum interessou ao país, que ignora alegremente esta frenética actividade jurisprudencial.
Tudo mudou a 5 de Julho de 2012, abrindo-se uma nova era na democracia. Com o Acórdão n.º 353/12 o referido Tribunal surgiu como uma força decisiva da República, intervindo politicamente para modificar o Orçamento de Estado. A partir de então todos os que anseiam bloquear as reformas estruturais centram aí as suas esperanças. E, como a Constituição é marxista, as hipóteses de paralisar o país são excelentes. Assim a nossa lei básica, que não resolve nenhum problema, ainda pode estragar tudo.
Título e Texto: João César das Neves, Destak, 10-01-2013

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