“A justiça nada mais é do que um jogo, cujas regras são criadas pelos
governantes e fundamentadas em seus próprios interesses.”
Platão
O governo brasileiro
positivamente não é preventivo. Ele reflete a tendência cultural do povo, que
gosta da última hora, do último dia na fila, como se a sua vida fosse
constituída de uma esperteza completa. Não ter tempo pra nada, nem pra cumprir
os próprios deveres – eis aí o típico da Nação, exemplarmente refletido por
Nélson Rodrigues, nosso Shakespeare de direita: “o brasileiro é um feriado.”
Ora, se somos um feriado e 90%
da população deseja reduzir para 16 anos a maioridade penal, o que faz nosso
pobre governo, sitiado pela completa falta de ideias, a não ser a de reeleição
a qualquer preço?
“Não” – diz ele. Como levar os menores
tadinhos pro sistema penitenciário adulto, se ele é o descalabro que é?
Esquece, no tíbio argumento, de que, em dez anos de poder, a pelegada
aparelhada nada fez pelo sistema. Ele continua degradado e é a cara de nossas
autoridades, policiais e juízes, vale dizer, uma cloaca de corrupção, uma
universidade de bandidagem sem igual.
A nossa justiça é “ppp”, ou
seja, só prende preto, pobre e prostituta, não necessariamente nessa ordem, e
em discussões acadêmicas ou de deontologia jurídica, apressa-se a exibir a toga
privilegiada, arguindo velhos argumentos dos anos 1940 para defender os “di
menor”.
Em países desenvolvidos, nem há
limite de idade para crimes hediondos: delinquiu, matou barbaramente, vai pra
cadeia, em qualquer idade. Aí vêm os juristas do PT argumentar que os menores
podem votar pra presidente, mas não devem ser responsabilizados por crimes de
sangue, porque não têm “a cabecinha formada”.
Então, o que ocorre é que se
forma, burocraticamente, um limite para a impunidade: eu sou “di menor” e posso
matar qualquer um, bastando me apresentar à polícia com a mamãe a tiracolo (“coitado do meu filho, não teve oportunidades!”)
e do outro lado uma família enlutada e destruída para quem o Estado acena com
um adeusinho e um solene “vá a merda”..
.
.
Esse quadro, renitente e
percuciente, volta a toda hora, à espera de que um “di menor” mate um filho de
autoridade: de ministro, governador ou general da cúpula. Mas qual! Eles vivem
cercados de seguranças, “comme Il fault!”,
e jamais serão atingidos. Seus fins de semana são abençoados por helicópteros,
ilhas paradisíacas e surubas memoráveis sem o alcance da patuléia desagradável
das periferias.
Puxadinho, churrasco, baile
funk e música caipira é coisa de pobre desvalido, cuja cangalha misturada
sempre arbitra a violência dos baixos instintos, porque a gentalha não pensa,
não articula pensamentos na língua-mãe, não conhece sentimentos de cor pastel
e, portanto, quando se manifesta é para decidir o mundo através do sistema
reptiliano do cérebro, à mercê dos instintos mais vis.
Uma sociedade que não educa os próprios filhos, a reboque do bolsa-família e de outros artifícios eleitoreiros, infelizmente, senhores, não tem futuro. É um arremedo de sociedade, à procura de um destino. Nós, no Brasil, não temos projeto de civilização, a não ser o de servir a empreiteiras e políticos corruptos em busca de reeleição.
Para esses, é fundamental
remunerar bem os que punem os outros: juízes, políticos e governantes, enquanto
a horda dos que nos vigiam, policiais, professores, médicos, enfermeiros,
cientistas, jornalistas, escritores e outros, ganham muito mal e não há greve
que dê jeito. Esse modelo salarial é invariável, porque a sociedade brasileira,
não preventiva para os pobres, prevê o foro privilegiado para os políticos e/ou
os muito ricos. São sempre eles que nos punem, mercê inclusive de nossos
votos...
A porta arrombada é o
vaticínio de luz das quimeras jurídicas. Sempre uma lei pra tapar um buraco.
Será que ela pega? Ou não pega? Vá explicar a um estrangeiro que temos uma
pletora de leis que não pegam?
E julgamentos que demoram um
decênio com uma procissão de recursos? Já calcularam os honorários advocatícios
e o preço dos recursos? Já imaginaram o desespero dos juízes, ganhando cerca de
30 mil reais, a julgar causas de 180 milhões capitaneadas por louros de olhos
azuis? Como coça a consciência da natureza humana, não é? Que desespero, meu
Deus...
Confiar na justiça brasileira
e nos governantes que gerem todas as portas arrombadas é um verdadeiro
exercício patriótico de hipocrisia. O cidadão que fica reclamando nas filas de
bancos ou por linhas telefônicas (com intermináveis musiquinhas) sabe muito bem
que o seu destino é ser enganado pela molecagem superior.
Na verdade, o brasileiro gosta
e admira os ladrões e infelizmente – devo dizer, apesar dos muitos que não me
pouparão – que nossa representação política é ainda melhor do que o povinho que
a elege.
O brasileiro é deseducado,
safado, hipócrita e merece o que tem. Para nós, quanto mais ladrão, mais
querido – uma lei inelutável da nossa cultura macunaímica e bandidesca.
Enquanto for assim, não haverá
saída, porque numa sociedade em que todos querem levar vantagem, quem escapa
para cima recebe a aura do encanto e o perdão dos miseráveis.
Quanto aos menores,
aproveitados como mão-de-obra barata por traficantes e milicianos, nosso
“futuro da Pátria”, como não têm eira nem beira, serão a massa do martírio, a
nossa mais veemente porta arrombada, demonstrando na prática o quanto
fracassamos como sociedade.
E o futuro, com certeza,
cobrará nossa responsabilidade, sem, contudo, evitar a procissão dos mortos que
ainda hão de vir...
Até quando, meu Deus???
Título e Texto: Waldo Luís Viana, escritor, economista
e poeta, consciente de que clama no deserto e sempre serve a causas inúteis...Teresópolis,
13 de abril de 2013.
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