Rui Albuquerque
Os comentários de Pacheco Pereira e
de Jorge Coelho sobre o processo de Lula da Silva, hoje
proferidos na Quadratura do Círculo, só podem ser fruto de
ignorância ou de má-fé. Ou de ambas as coisas juntas, claro. Tomemos apenas
três exemplos dos muitos disparates ditos.
Primeiro, dizem os dois
que «não estão dentro do processo, que não sabem se Lula da Silva é ou
não culpado e que vão aguardar que a justiça brasileira se pronuncie».
Nesta última parte da afirmação está obviamente implícito que os recursos ainda
não esgotaram a matéria de facto e que é ainda possível que uma última
instância dê os factos como não provados ou que conclua pela inocência do ex-presidente.
Pois bem, há já duas sentenças que dão os factos como provados e que condenam
Lula da Silva à pena de prisão. A segunda sentença, em resultado de recurso
apresentado sobre a primeira, agrava mesmo em dois anos a medida da pena
anteriormente aplicada. Por outro lado, o recurso para a última instância já
não poderá alterar matéria de facto, cuja prova está feita e a decisão de
culpabilidade decretada, mas somente matéria de direito, isto é, dizendo de uma
forma elementar, avaliará se o direito decretado para os factos anteriormente
comprovados está bem ou mal determinado.
Segundo, «este
julgamento é político», afirmaram os dois, de tal modo político é que,
disse Coelho, os juízes que ontem se pronunciaram foram nomeados, se calhar,
por presidentes desafetos ao petista. Pois bem, 5 dos 6
juízes que votaram contra a concessão do habeas corpus a
Lula foram nomeados por governos do PT, o partido de Lula da Silva.
Terceiro, «os
juízes condenaram ontem Lula à pena de prisão», foi sendo dito nas várias
intervenções. Pois bem, e no seguimento do que já foi dito sobre o estado da
matéria de facto, ontem os juízes do Supremo em momento algum se pronunciaram
sobre o mérito das decisões das duas instâncias que já julgaram o processo:
limitaram-se a decidir sobre o pedido de habeas corpus aplicado
a este caso. Explicando melhor: tratou-se de decidir se a prisão pode ser
decretada havendo duas sentenças de duas instâncias diferentes no mesmo
processo, com idêntica decisão («dupla conforme»), ou se devem deixar esgotar-se
todos os recursos para se decretar a prisão. Note-se que, nesta fase do
processo, os recursos já não poderão incidir sobre os factos, que estão
considerados, neste processo, provados. Os juízes entenderam que sim, indo, de
resto, ao encontro da jurisprudência do tribunal, que já decidira do
mesmo modo em casos semelhantes. Decisão contrária, que fosse favorável à
pretensão de Lula, seria, assim, uma excepção à tendência das decisões deste
tribunal para casos semelhantes proferidas nos últimos anos. Foi isso mesmo que
foi dito pela juíza Rosa Weber, nomeada juíza deste tribunal por Dilma Rousseff,
em 2011, para explicar o sentido do seu voto de ontem, contrário à concessão
do habeas corpus e, aliás, contrário às suas convicções
pessoais, como ela mesmo enfatizou. De resto, aliás, se a decisão fosse
diferente, isto é, se coincidisse com as pretensões do ex-presidente Lula,
outros detidos, como Eduardo Cunha, teriam necessariamente que beneficiar do
novo sentido jurisprudencial da Corte.
Enfim, serão Pacheco e Coelho
inocentes ou culpados dos disparates que dizem? O veredicto não é fácil.
Título, Imagem e Texto: Rui Albuquerque, Blasfémias, 6-4-2018
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