Henrique Pereira dos Santos
Manuel Carvalho [foto], ontem, no Público (como não?) resolve, com a infantilidade e a irresponsabilidade dos jornalistas militantes, chamar nomes a David Neeleman.
O Estado na TAP a fazer papel de otário
"um chico esperto foi
capaz de atravessar o Atlântico Sul" (Manuel Carvalho não deve saber que
David Neeleman é cidadão americano, ou que os EUA e Portugal são separados pelo
Atlântico Norte).
"o que foi do princípio
ao fim uma manobra de videirinhos".
"um aventureiro dos
negócios".
"Portugal um país
patusco, fácil de endrominar por espertalhões com nome estrangeiro".
"um governo se submeteu
aos ditames de uns espertalhões que compraram uma companhia nacional sem terem
de a pagar com o seu dinheiro".
E por que razão se encheu de
fúria Manuel Carvalho?
Porque, na sua própria
opinião, "convém ser justo e recordá-lo, a TAP dá hoje lucro em boa medida
porque a gestão privada lhe abriu novas rotas, a modernizou e reforçou o seu
valor estratégico de ponte entre a Europa, as Américas e a África".
Pelos vistos, o "aventureiro dos negócios" foi capaz de fazer o que os outros todos não conseguiram (a empresa estava em falência técnica, isto é, os seus passivos eram maiores que os seus activos, e estava sem liquidez ao ponto de estar em risco de deixar de pagar salários e as prestações devidas a um dos seus principais fornecedores, a Airbus, quando o "aventureiro dos negócios" pegou nela e a passou de perdócio a negócio, para usar a terminologia de Belmiro de Azevedo, outro "aventureiro dos negócios" de cuja caridade benevolente depende, ainda hoje, o Público).
Aventureiro dos negócios há
muitos, Thomas Edison, Henry Ford, Bill Gates, Elon Musk, etc., etc., etc.,
felizmente para todos nós que precisamos da criação de riqueza para ter uma
"vida boa" (não resisti ao prazer de citar o Bloco de Esquerda, concordando).
Aventureiros de perdócios,
como os jornalistas do Público é que há poucos, por uma razão simples: é muito
difícil convencer um "aventureiro de negócios", como Belmiro de
Azevedo, a perder vários milhões por ano num perdócio como o Público.
Por que razão um perdócio,
como o Público, não consegue passar a negócio ao fim de 34 anos a consumir
capital generosamente disponibilizado pelos "aventureiros de
negócios" que o financiam?
Penso que o próprio artigo de
Manuel Carvalho, que foi director do jornal, consequentemente, com
responsabilidades grandes no perdócio, é cristalino na ilustração das razões
pelas quais aquilo, do ponto de vista da aplicação racional de capital, é um
desastre: "Não venham dizer que Neeleman acabou por "meter" os
203 milhões de euros (226,7 milhões de dólares) na TAP ou que não se serviu da
dívida da empresa para pagar os 61% que adquiriu ao Estado".
Comecemos pela qualidade
jornalística e depois vamos à questão de fundo.
Para fundamentar esta
parvoíce, Manuel Carvalho cita o relatório da IGF que diz exatamente o
contrário do que Manuel Carvalho conclui: "para além de 10 milhões do
preço", ou seja, o relatório da IGF diz claramente que o preço dos 61% de
capital foram 10 milhões e foram pagos por David Neeleman. Depois fala em
prestações suplementares de capital, que foram efetuadas com dinheiro da
Airbus, integrando progressivamente os ativos da TAP à medida que a atividade
da TAP foi remunerando essas prestações suplementares de capital, na forma que
tinha sido contratada (Manuel Carvalho parece ter a ideia de que as receitas
futuras de uma empresa que precisa de capital para as conseguir gerar são um
património da empresa, não admira que o Público nunca tenha passado de perdócio
a negócio).
Mas a parte mais luminosa do
parágrafo em análise é mesmo esta: "se serviu da dívida da empresa para
pagar os 61% que adquiriu ao Estado".
Manuel Carvalho está mesmo
convencido de que se pagam contas com dívidas. Vou ao supermercado, e posso
pagar com a dívida que tenho da compra do carro, diz Manuel Carvalho.
E assim se explica por que
razão, ao fim de 34 anos a consumir capital, o Público continua a ser um
perdócio e não um negócio: os seus principais responsáveis não fazem a menor
ideia de como funciona a economia e as finanças, razões pelas quais acham normal
insultar um tipo que, no caso da TAP "lhe abriu novas rotas, a modernizou
e reforçou o seu valor estratégico de ponte entre a Europa, as Américas e a
África", escudando-se no orgulhoso estatuto que consideram uma dádiva
divina inquestionável: serem grandes "aventureiros dos perdócios".
Título e Texto: Henrique
Pereira dos Santos, Corta-fitas,
6-9-2024
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