terça-feira, 26 de novembro de 2024

[Aparecido rasga o verbo] O triste fim do Sardinha

Aparecido Raimundo de Souza

FICO TENTANDO entender a história daquele cidadão nascido em Évora, que veio de Portugal como primeiro bispo do Brasil com a difícil missão de converter os indígenas à doutrina católica. Contam, os estudiosos, que essa criatura era autoritária demais e extremamente impaciente. Usava métodos pouco ortodoxos para convencer os nativos às leis da igreja. Com os homens, metia-lhes a Bíblia em meio às fuças. Surrava, os com uma espécie de cinto de couro português que trazia em volta do pescoço.

Às crianças não fugiam às regras: aplicava, aos pequenos, castigos severos. Longas horas de joelhos, sobre caroços de milho, ou feijão. Com as meninas e mulheres —, bem, com elas, ele procurava mostrar a palavra da forma mais grossa e dura —, geralmente em reuniões “compridas” e enfadonhas que se estendiam “compridamente” pelos campos e canaviais existentes nos arredores das grandes aldeias.

Talvez, por essa razão, desde que chegou em terras brasileiras, nos idos de 1552 — ou 453 anos atrás, Dom Pero Fernandes — designado bispo da Bahia, por D. João III, tenha caído no centro mortal de onde nascia o ódio dos pobres e infelizes nativos, inclusive aqueles que o ajudaram a inaugurar a primeira diocese, ainda sobre o governo de Tomé de Souza. Esse ódio deve ter se propagado e, por consequência, se estendido e se alastrado como erva daninha por toda a região.

Juntamente com a notícia de que um bispo muito perverso e ruim, até dizer chega, andava por aquelas bandas aprontando coisas em nome do monarca que comandava tudo, sentado tranquilamente em seu trono, em Lisboa.
— Comigo é assim... — teria dito, certa vez, Dom Pero, a um repórter curioso.
— Assim como?
— Ajoelhou, tem que rezar.
As índias que viviam em recantos mais afastados, acabaram molestadas por Dom Pero — tendo que se deitar com ele à força e não somente deitar, praticar, em paralelo, sexo triplo: normal, oral e anal.

Os livros não contam, mas o primeiro bispo deixou por aqui uma renca de filhos, o que levou a entrar em conflito com Manuel da Nóbrega (não o cara da “Praça é Nossa,” do SBT), um outro jesuíta que também pintou no pedaço com outros, pois não aguentava mais dar o rabo para os seguranças do monarca. Os historiadores narram episódios mentirosos, alegando que as desavenças com Manuel e outros da confraria se fundavam no fato de Dom Pero achar que eles se coadunavam por demais complacentes com os costumes indígenas, deixando a coisa correr à Bangu, ou à solta.

Contudo, a bronca tinha raízes mais profundas. O religioso gostava de transar com as índias abaixo de quinze e quando elas engravidavam, ele se escondia sob a autoridade da batina. Duarte da Costa, outro que não apreciava os métodos de Dom Pero, escreveu uma longa carta à Dom João relatando as falcatruas do inoxidável bispo. Furioso, Dom Pero embarcou, decidido a ir até Lisboa com a finalidade de limpar a sua barra com o monarca. Levou, consigo, cem pessoas, cujas cabeças deveriam atestar a sua mais estimada e intocável idoneidade moral. Afinal, ele não era amigo do Ale... Ale... do cabeça de ovo.

Todavia, por puro azar, o navio em que viajava, com essa comitiva, naufragou (tinha gente demais, parecia até com a comitiva do “Brazzzil” no inoperante G-20) na foz do rio Coruripe, na costa alagoana. Sobrevivente do infausto acontecimento, o sujeito foi aprisionado juntamente com a leva dos cem que o acompanhava, pelos índios caetés. Corria o ano de 1556. Atados com cordas pelos integrantes dessa tribo, foram todos levados para uma ilha deserta e ali bem alimentados para que não morressem.

O primeiro a virar churrasquinho no espeto dos caetés foi Dom Pero Fernandes, que se parecia bastante com uma sardinha gigante. Daí a história registrar esse fato da sua passagem por aqui, ou por lá, culminando a sua malfadada e infelicita sina, não pelo simples fato de ter sido devorado pelos índios, igualmente pelo estereótipo de se parecer, realmente, com esse peixe. Talvez, ainda, num chute de acerto, se devesse exatamente por ter Dom Pero, na sardinha, o sobrenome.

Dois dias depois de capturado, Dom Pero Fernandes Sardinha realmente passou à história como o primeiro bispo a servir de comida para um bando de malucos e, assim, dar início a um grupo novo de canibais ferozes que depois de tosar ao ponto a carne do desditoso Sardinha, culminou com pedaços dele servido a toda a aldeia, nacos regados ao molho pardo e outros condimentos tribais, enquanto as suas genitálias se faziam devoradas avidamente em meio a um mar de risos pela ala feminina, que achou “excelente e de boa qualidade” a linguiça de Dom Pero Sardinha. Devoradamente comido o Sardinha, veio, um outro para substituí-lo. O Bispo Leitão. Obviamente uma nova história, que brevemente contaremos em outra crônica.

Título e Texto: Aparecido Raimundo de Souza, de Vila Velha no Espírito Santo, 26-11-2024

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