Três anos de austeridade
mudaram-nos. Forçados pela necessidade, os portugueses adaptaram-se. Criaram
novos hábitos e recuperaram velhos. Tornaram-se felinos na caça a promoções e
passaram a coleccionar folhetos de supermercado e cupões com fervor religioso.
Voltaram à marmita e à casa dos pais.
Descobriram que a casa não tem
de ser própria, arrenda-se a dos outros. Que os carros não duram apenas cinco
anos, sobrevivem bem mais. E que os usados também são carros. Trocaram as
auto-estradas pelas vias secundárias. O ginásio pela corrida na rua. O cinema
pelo cabo. O restaurante pelo prazer dos jantares em casa. A carne pelos
saudáveis vegetais.
Aprenderam a usar as redes sociais para apanhar boleia e poupar nas viagens à terra. Para lançar um pequeno negócio que alivie o sufoco do desemprego. Descobriram que ganhar pó não é uma inevitabilidade da tralha que têm em casa – é possível ganhar dinheiro vendendo-a pela Net.
Os pais têm menos filhos, e os que têm tiraram-nos do colégio e devolveram-nos à escola pública. Descobriram que há bons produtos de marca branca. E que se vende gasolina dessa cor. A mal, perceberam que o crédito não é fácil. Mas também a reclamar e a regatear pelos serviços com ameaças de mudar quando não lhes baixam o preço.
Habituaram-se a fazer contas à vida. Por causa do Orçamento do Estado, viram-se obrigados a fazer o da Casa. Tornaram-se mais poupados, mas também mais solidários.
A crise empobreceu-nos. Todo este engenho nasceu da necessidade. Mas fez-nos melhores consumidores. Mais atentos e informados. Mais cientes dos nossos direitos.
Melhores do que esperava a troika ou o Governo. O país teve uma quebra histórica no consumo privado e um crescimento da poupança que deixou perplexo o primeiro-ministro. Mas com isso equilibrou o défice externo também mais depressa do que se antecipava.
As estatísticas mostram que vamos saindo do cinto de forças. Mostram que nem só de exportações se fez a recuperação da economia nos dois últimos trimestres. O principal motor foi mesmo o consumo interno. Até as vendas de automóveis já crescem. Mas pelo que se vislumbra do futuro próximo, os novos hábitos vão perdurar.
O Orçamento do Estado para 2014 mantém o cerco às famílias. E aperta-o ainda mais para os trabalhadores e pensionistas da Função Pública. Nos anos seguintes, a margem para o aumento do rendimento pelo alívio dos impostos será estreita. O país continuará vergado pelo fardo dos juros da dívida pública acumulada nos anos de despesismo.
Mas com a mesma rapidez que nos convertemos à frugalidade, vamos abandoná-la quando pudermos. É humano. Nesse dia, em que o País voltar aos antigos padrões de consumo, é bom que o modelo de crescimento seja outro. Mais assente nas exportações e menos no consumo interno. Caso contrário voltará o desequilíbrio da balança corrente, o insustentável aumento das dívidas ao exterior. E a marmita.
Aprenderam a usar as redes sociais para apanhar boleia e poupar nas viagens à terra. Para lançar um pequeno negócio que alivie o sufoco do desemprego. Descobriram que ganhar pó não é uma inevitabilidade da tralha que têm em casa – é possível ganhar dinheiro vendendo-a pela Net.
Os pais têm menos filhos, e os que têm tiraram-nos do colégio e devolveram-nos à escola pública. Descobriram que há bons produtos de marca branca. E que se vende gasolina dessa cor. A mal, perceberam que o crédito não é fácil. Mas também a reclamar e a regatear pelos serviços com ameaças de mudar quando não lhes baixam o preço.
Habituaram-se a fazer contas à vida. Por causa do Orçamento do Estado, viram-se obrigados a fazer o da Casa. Tornaram-se mais poupados, mas também mais solidários.
A crise empobreceu-nos. Todo este engenho nasceu da necessidade. Mas fez-nos melhores consumidores. Mais atentos e informados. Mais cientes dos nossos direitos.
Melhores do que esperava a troika ou o Governo. O país teve uma quebra histórica no consumo privado e um crescimento da poupança que deixou perplexo o primeiro-ministro. Mas com isso equilibrou o défice externo também mais depressa do que se antecipava.
As estatísticas mostram que vamos saindo do cinto de forças. Mostram que nem só de exportações se fez a recuperação da economia nos dois últimos trimestres. O principal motor foi mesmo o consumo interno. Até as vendas de automóveis já crescem. Mas pelo que se vislumbra do futuro próximo, os novos hábitos vão perdurar.
O Orçamento do Estado para 2014 mantém o cerco às famílias. E aperta-o ainda mais para os trabalhadores e pensionistas da Função Pública. Nos anos seguintes, a margem para o aumento do rendimento pelo alívio dos impostos será estreita. O país continuará vergado pelo fardo dos juros da dívida pública acumulada nos anos de despesismo.
Mas com a mesma rapidez que nos convertemos à frugalidade, vamos abandoná-la quando pudermos. É humano. Nesse dia, em que o País voltar aos antigos padrões de consumo, é bom que o modelo de crescimento seja outro. Mais assente nas exportações e menos no consumo interno. Caso contrário voltará o desequilíbrio da balança corrente, o insustentável aumento das dívidas ao exterior. E a marmita.
Título e Texto: André
Veríssimo, Jornal de Negócios, 28-11-2013
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É extremamente interessante quando se lê um artigo como este, verificar que o que eu tenho visto no facebook, nos membros da população Aerus que o frequenta.
ResponderExcluirExatamente o oposto a este artigo. Porque será ?
Continuam as festas, continuam os encontros , continuam os churrascos,continuam as viagens
enfim me faz parecer de que a ficha ainda não caiu
Estou errado ? É só verificar
E ai quando nos deparamos com artigos como este, a coisa toma um contorno simplesmente hilário.
José Manuel