quinta-feira, 30 de outubro de 2014

As prematuras questões

Luís Pais Antunes

Poucos dias após a apresentação da proposta de lei do Orçamento do Estado para 2015 e passado aquele "entusiasmo inicial" sobre as eventuais novidades do último ano de mandato do actual governo, as atenções parecem estar voltadas para todo o lado menos para as coisas verdadeiramente importantes.

Discutem-se cenários eleitorais, antecipam-se virtudes e desconfortos de eventuais alianças à direita e à esquerda, "trocam-se cromos" sobre putativos candidatos à Presidência da República em 2016, escreve-se sobre auroras radiosas e ocasos tristes, mas pouco ou nada se diz sobre os problemas em aberto e as possíveis soluções a adoptar para os enfrentar.

Enquanto cidadão e eleitor, gostava de saber o que pensam, em concreto, as principais forças políticas e os seus responsáveis sobre os grandes desafios que temos pela frente: o financiamento dos sistemas de saúde e de segurança social; a sustentabilidade das nossas finanças públicas e o insustentável peso da dívida; a evolução da política fiscal para as famílias e para as empresas; as reformas do Estado e do sistema político. Há certamente outras questões relevantes que justificam a atenção dos agentes políticos, mas não quero ser demasiado exigente: já me dava por muito satisfeito se conseguisse ter uma ideia aproximada das soluções que cada um defende. Não meras proclamações de intenções ou tiradas mais ou menos jocosas sobre o que o "outro" propõe. Refiro-me a um rumo claro, medidas quantificáveis e resultados esperados.

Por muitas críticas que possam merecer os caminhos que vêm sendo trilhados pela actual maioria - e algumas são bem certeiras - conseguimos antever aquilo que nos é proposto, pelo menos nalguns dos aspectos que acima mencionei. Podemos discordar, mas conseguimos perceber. Podemos não gostar, mas ao menos sabemos do que é que não gostamos e, se for o caso, contrapor outros caminhos.

O recente debate parlamentar sobre a renegociação da dívida trouxe ao de cima o pior dos cenários: um partido que aspira a ser de novo governo, muito em breve, pouco mais tem para oferecer do que um novo debate sobre o tema… Pior. Confrontado com o silêncio socialista sobre quase tudo o que é verdadeiramente importante, o novo líder da respectiva bancada no Parlamento, Ferro Rodrigues, limitou-se a atirar um lacónico "são tudo questões prematuras neste momento".

Por muito que o pragmatismo e o calculismo se venham afirmando como o alfa e o ómega da actividade política, há limites para aquilo que é aceitável. As pessoas têm o direito de saber qual o caminho que lhes é proposto para resolver as dificuldades com que já hoje se defrontam e que estão na base dos muitos sacrifícios que têm sido chamadas a fazer e que vão ter de continuar a fazer. Os agentes políticos têm o dever de ser claros nas soluções que propõem, assumi-las, quantificá-las e fundamentá-las.

Não há respostas prematuras a questões prementes… 
Título e Texto: Luís Pais Antunes, Jornal de Negócios, 30-10-2014

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Não publicamos comentários de anônimos/desconhecidos.

Por favor, se optar por "Anônimo", escreva o seu nome no final do comentário.

Não use CAIXA ALTA, (Não grite!), isto é, não escreva tudo em maiúsculas, escreva normalmente. Obrigado pela sua participação!
Volte sempre!
Abraços./-