domingo, 23 de setembro de 2018

[Pensando alto] Travessia

Pedro Frederico Caldas

Duas posições são assumidas quando se é ainda muito jovem: ateísmo e comunismo. Nessa fase, por mais inteligente, por mais culto e por mais brilhante, não se tem, ainda, a experiência e a maturidade necessárias para, mesmo intuitivamente, se entender como a vida social funciona. Nossa formação doméstica, de rígida disciplina, bom comportamento à mesa, respeito aos pais e aos mais velhos, contenção verbal, asseio pessoal, respeito à propriedade alheia, respeito à esfera individual dos outros, tudo isso parece uma camisa de força a tolher nossos movimentos, nossos próprios interesses e nossas inaugurais inquietações intelectuais. Para além de tudo, não antevemos a importância e a necessidade futura dos ensinamentos escolares. Tudo é disciplina, tudo é obrigação.

Vem a fase escolar em que entramos em contato com a política. O meio estudantil é um ambiente de contestação. O mundo que nossos pais nos apresentaram não presta, é injusto. Urge que façamos algo. Aí, somos introduzidos às chamadas ideias socialistas. Os patrões (capitalistas) são maus, os operários, bons. É-nos dito que se o capitalismo for destruído não haverá mais patrões e empregados e todos terão de tudo. É só uma questão de querer (vontade política). É a real e definitiva abolição da escravatura. Tome-se de quem tem e se dê a quem não tem. Mas não é desonesto tomar de alguém aquilo que às vezes levou uma vida construindo? Bobagem, isso é moral “pequeno burguesa”, afinal, “os meios justificam os fins”.

Os mais curiosos lerão a doutrina comunista, que lhes será repassada de segunda mão, ou, no máximo, farão uma leitura do Manifesto Comunista. Uns poucos lerão Marx, Lenin, Plecanov, Rosa Luxemburgo, Gramsci.”. A leitura de algumas dezenas de livros, cuja bússola doutrinária apontará sempre na mesma direção, dará estofo intelectual para o jovem militante passar a ser um doutrinador dos mais jovens que vão chegando. Essa correia transportadora vai sendo alimentada e o “sistema de captação de mentes” forma uma teia para enredar os novos que chegam.

Ao que sai para a vida adulta, mesmo dobrado pela realidade do quotidiano, fica sempre aquela impressão difusa de que o mundo poderia ser melhor. Sempre que lhe sobrar tempo, que lutar pela sobrevivência não é fácil! -, militará politicamente com esse sentimento e tenderá a dar suporte aos que querem “mudar o mundo”. Ao longo de sua vida, terá o testemunho de que todas as iniciativas políticas para “mudar o mundo” fracassaram, sem exceção; mesmo assim lhe restará a convicção de que “da próxima vez” as coisas funcionarão. E assim o nosso herói celebrará, pela vida afora, os Fidéis, os Genuínos, os Guevaras, os Dirceus, os Chávez, os Lulas... e por aí vai.

Mas isso é uma fatalidade, acontecerá com todos os jovens? Óbvio que não. A maioria intui que a sociedade é algo muito complexo e que a vida econômica é ditada pela liberdade de mercado, formado por milhões de ações, as mais díspares, mas que funcionam com uma boa dose de harmonia. Esses vão cuidar da vida, tendem ao centro e votam pendularmente, às vezes um pouco mais à esquerda, às vezes um pouco mais à direita, mas jamais assumem posições radicais e sempre desconfiam dos políticos que muito prometem. Sabem que a vida econômica de uma nação não difere, em nada, da vida econômica das pessoas e das empresas, ou seja, depende de reinvestir parte do que produziu para continuar crescendo; sabem que as crises não são criadas por quem produz, são sempre criação de governos gastadores; sabem que quanto menor a cargas fiscal maior será o reinvestimento e, por conseguinte, o crescimento; sabem que o crescimento é o que redime a pobreza; sabem que quando ouvem um político dizer que as coisas dependem de “vontade política” estão frente a um ignorante em economia e finanças públicas ou, pior, perante um farsante; sabem que odiar quem produz riqueza não melhorará a vida dos pobres. Enfim, esses não foram contaminados pelo “esquerdismo infantil” e felizmente escaparam da armadilha ideológica.

Muitos outros, caídos na armadilha ideológica, mas de grande inquietação intelectual, escapam do círculo de ferro e tomam contato com o liberalismo econômico e o pensamento político conservador. Ultrapassam os estudos elementares da esquerda e tomam contato intelectual com o pensamento clássico, destilado por milhares de anos de boa doutrina e reflexão. Leem, além dos pilares da filosofia clássica, Adam Smith, Jean-Baptiste Say, James Tobin, Eugene Von Bohm-Bawerk, Ludwig von Mises, Frédérick Bastiat, Hayek, Milton Friedman, Hans-Hermann Hoppe, Henry Hazlitt, George Reisman, Roger Scruton, Murray N. Rothbard, Thomas Sowell, Paul Johson, Edmund Burke, Raymond Aron e outros, muitos outros.

Descobre que a teoria do valor, pedra angular do marxismo, já tinha sido desmontada e completamente refutada, nos anos vinte (!), por Eugene Von Bohm-Bawerk, vale dizer, muito antes de o comunismo ser derrotado pelos fatos, com a queda de todo o sistema, sua espinha dorsal já tinha sido intelectualmente destroçada.

Ah, mas essa travessia não é fácil... Dói, e muito, lançar ao mar companheiros de viagem, ideias irrefletidas, descobrir que todas as tragédias decorrentes de engenharia social, como o Comunismo e o Fascismo, tiveram como arquitetos intelectuais a que se rendeu homenagem. Dói muito descobrir que os intelectuais que querem mudar o mundo, buscam sempre, na nova ordem sonhada, um lugar de destaque para eles; descobrir que, além de terem laborado em terríveis equívocos, tiveram comportamento pessoal incompatíveis com qualquer senso de dignidade. Quer conhecê-los? Leia, por exemplo, Intellectuals, do pensador e historiador britânico Paul Johnson, ou Intellectuals and Society, do pensador americano Thomas Sowell (é possível que as duas obras já tenham sido editadas no Brasil). Escolha o intelectual político de sua preferência, na obra do historiador Paul Johnson, e lhe garanto que sua decepção será enorme. O mau caráter do escolhido explicará muito o seu pensamento.

Mas uma coisa é quase regra: se na juventude são feitas escolhas radicais como ateísmo e comunismo, é sempre na maturidade que esses fardos são lançados ao mar. Dificilmente essa equação se inverte.

Antes que me esqueça, se o seu filho está sofrendo de bullying intelectual na escola, onde medram professores de esquerda, polidos de algum verniz intelectual, estimule-o a ler, por exemplo, um autor moderno, como Raymond Aron (ex-comunista). É um bom antídoto contra a peçonha.
Título e Texto: Pedro Frederico Caldas

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