Haroldo P. Barboza
No final de 2001, fui
convidado (com mais dois moradores) para participar da elaboração do novo texto
do regulamento (convenção) do nosso condomínio, para registrá-lo e ganharmos um
número no CNPJ. Parecia uma tarefa simples: pegar um texto num prédio próximo,
juntar com o nosso antigo texto e apresentar o óbvio aos moradores para aprovação
geral. Num primeiro momento imaginei que na Assembleia Constituinte antes de
1990, tal procedimento teria ocorrido. Esperávamos leis bem elaboradas, tal o
grande número de personalidades reunidas. Até membros da ABL existiam neste
grupo. Deu no que deu. Até "ponto-e-vírgula" prejudicou o necessitado
(pobre) no momento de interpretar o texto usado para defendê-lo.
Fizemos o trabalho de editar a
espinha dorsal do referido texto. Reunimo-nos a cada duas semanas para efetuar
os ajustes, no intuito de evitar dupla interpretação das normas. Juntamos
várias sugestões de outros moradores. Não pretendíamos incorrer nos mesmos
erros das leis que regem a nação. Apesar de não termos a mesma disciplina das
forças armadas pretendíamos definir regras fáceis de serem seguidas por todos.
É o que está faltando entre os defensores da libertinagem que rotulam de
"democracia" o estado de desrespeito às normas começando pelos que
deveriam dar o exemplo, mas usam das imunidades "para lamentares" -
perdoe o trocadilho – para burlarem as leis em proveito próprio.
Mas começamos a perceber que
cada item mais rígido no sentido de permitir uma convivência equilibrada e
respeitosa entre nós, era alterado para conceder abertura de interesses das
pessoas que se acham mais espertas que a esperteza e não queriam ser punidas
pelas suas atitudes menos ortodoxas. E aqueles que aplaudiam e prometiam
comprometer-se com o texto em elaboração eram os primeiros a transgredi-los,
explicando que a situação do momento justificava a burla. Então propus que para
não gastarmos tempo e papel inutilmente nosso regulamento tivesse apenas uma
norma: "fica proibida qualquer ação danosa ao prédio ou aos seus
moradores, exceto nos casos em que o praticante tenha uma justificativa
plausível para não ter se portado de maneira adequada". Pelo visto tudo
seria burlado desde que se apresentasse uma "explicação comovente".
Não aceitaram. Então abandonei
o projeto. Se for para não cumprir, qualquer texto serve. O registro é mera
formalidade para atender uma exigência do banco para aceitar a conta do
condomínio. O resto é hipocrisia.
Juntando este espírito
reinante nos condomínios da pátria (o nosso não é o único vilão da história),
percebemos porque as leis nacionais são amenas para os grandes facínoras.
Normalmente as turmas dos gabinetes dos governos e das empresas patrocinadoras
de campanhas eleitorais. E bastante rígidas para os pobres de pele não dourada
pelo verão. Estes, por falta de permanência nas escolas e oportunidade de
leitura regular, não sabem descrever uma "explicação comovente".
E o pior é que este clima se
instala na sociedade lentamente, de forma indolor. De repente nos surpreendemos
em não desligarmos a tv quando surgem notícias de chacinas em plena hora do
jantar. Não tiramos as crianças da sala no momento em que as novelas
ultrapassam os limites da ousadia e exibem cenas que derrubam em minutos,
valores que levamos anos para implantar nas cabeças confusas dos jovens. Daí já
considerarmos "normal" quando na página policial surge um fato
relativo ao jovem que matou a avó com pauladas para obter grana para adquirir
as malditas drogas que estão destruindo a sociedade sob o olhar complacente das
próprias vítimas que se recusam a reagir de forma dura como a situação exige.
Já consideramos “honesto” o dirigente público que só desvia 10% dos impostos
para sua conta particular. Mal comparando, quando uma pessoa está se afogando,
pode precisar levar um forte sopapo para que tenhamos meios de salva-la. E
quando vamos socar estes elementos para evitar que nossa nação afunde?
Não estamos empenhados na
prioridade ZERO em salvar nosso navio Brasil já com água nos porões. Estamos
desperdiçando nossas energias com projetos de prioridade 8, como: final de
novelas, paredões do BBBB e enredos de escolas de samba.
Depois deste comportamento de
hipocrisia, que moral nós temos para cobrar de nossos dirigentes uma postura
exemplar durante o período em que permanecem no poder pela procuração em branco
(voto) que lhes entregamos? Os dirigentes de hoje, foram crianças de ontem, que
observaram seus parentes dando “jeitinhos”, “molhando a mão” de garçons para
furar filas em restaurantes, pais estacionando em local proibido, enganando o
vizinho para chegar primeiro numa loja de promoções, comprando produtos
paraguaios e por aí afora.
Agora eles estão nos
devolvendo na vida pública, os ensinamentos que lhes passamos na vida em
comunidade. Aperfeiçoaram as condutas, criaram “esquemas”, passaram a legalizar
desvios através de “licitações” e “laranjas” e aí está o resultado. Um país arrebentado,
cofres com pouca verba e uma conta para ser paga (por nós) nos próximos 51
anos.
Título e Texto: Haroldo P. Barboza, Rio de Janeiro,
27-9-2018
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