quarta-feira, 19 de janeiro de 2011

Menos demagogia


O pesadelo retorna, e redobrado, com as chuvas de verão. Sempre  as mesmas desgraças. E tratadas com a mesma negligência. Em geral, existe um grande interesse pelas vítimas e suas perdas e nenhuma atenção  às causas de tais calamidades. Mas agora parece que a opinião pública  acordou de seu longo torpor e começa a se interessar por uma solução  mais racional e adequada. Vamos ter que levar a sério o aumento de  frequência e intensificação das chuvas, provocado pelas mudanças  climáticas.
As recomendações da Conferência das Partes da ONU são  claras: aplicar o princípio da “mitigação” para eliminar as causas do  aquecimento global; e o da “adaptação” para fortalecer a proteção física das áreas vulneráveis, já identificadas pelo meteorologista Carlos  Nobre. Tese de mestrado defendida na UFF pela médica bombeira Edna Maria de Queiroz revela que 60% das catástrofes naturais são de origem  hídrica – enchentes e deslizamentos -, mas até agora nada fizemos para  planejar ações de controle e prevenção nas bacias hidrográficas,  evitando o assoreamento e protegendo as matas ciliares dos rios.
A  urbe se expandiu aprisionando e desprezando a natureza – precisamos nos  reconciliar com ela. As cidades sustentáveis são hoje parte de uma nova  agenda civilizatória, exigindo mais segurança, melhor circulação, menos desperdício e mais qualidade de vida. A impermeabilização do solo tem  efeitos nefastos que podem ser mitigados com a multiplicação das áreas verdes e garantia de vegetação nas encostas.
O paralelepípedo em vez do asfalto nas ruas e as pedras portuguesas na calçada são medidas  que permitem melhor escoar a água, sem dispensar a manutenção de uma  rede de águas pluviais e bueiros limpos que impeçam a formação de rios  urbanos – como o que vimos correr a 100 km por hora em Franco da Rocha  (SP). Moacyr Duarte, da Coppe, sugere certificados de habitabilidade  para evitar ocupações em áreas impróprias. Afinal, não é apenas a  construção que molesta o ecossistema, diz ele, mas o ecossistema que  ataca as construções que o molestam.
Quanto à adaptação, é importante saber que 80% das perdas materiais e humanas acontecem nos  três primeiros dias do desastre, momento em que o poder público,  desprevenido, está desarticulado e impotente. De fato, inexistem planos  de contingência e gerenciamento de crises. Além do mais, a articulação  federativa é precária e demagógica.
O que precisamos agora é de educação  ambiental para nossos governantes, menos improvisação e populismo e mais vigilância da cidadania. A lei que reduz as emissões de  gases de efeito estufa do município em 20% até 2020 é um bom começo.
Aspásia Camargo é deputada estadual e autora da Lei de Mudanças Climáticas do município do Rio de Janeiro.

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