quarta-feira, 16 de janeiro de 2013

Reforma das leis de emigração abre porta para que cubanos saiam da ilha-cárcere dos Castros

Francisco Vianna
Os cubanos fizeram filas ontem (14 de janeiro) nos escritórios que emitem passaportes, consulados e embaixadas no primeiro dia de vigência de uma reforma das leis de migração que, finalmente, promete permitir que façam viagens ao exterior, depois de 54 anos de odiadas restrições que mantinham os cubanos como prisioneiros de seu próprio país.

Dezenas de cubanos fazem fila num escritório de emissão de passaportes, em Havana. Uma nova reforma migratória passou a vigorar nesta segunda-feira e permitirá que os cubanos possam viajar ao exterior sem a maioria das restrições do passado, como as “visas de saída”. Foto: AFP/Getty Images
Como um sinal do profundo impacto de mudança, a famosa blogueira habanera Yoani Sánchez e o dissidente Guillermo Fariñas, a quem lhes foi negado a permissão para viajar ao exterior em mais de 20 ocasiões, informaram que as autoridades lhes disseram que permitirão que viajem e regressem. “No entanto, não acredito”, disse Sánchez, que esteve na fila desde domingo a noite nas proximidades do escritório de emissão de passaportes de sua vizinhança, pelo Tweeter. Um empregado do escritório lhe comunicou que poderá ter seu novo passaporte em questão de 15 dias, acrescentou a blogueira, porque seu atual documento de viagem está válido está repleto de vistos de entrada expirados, os quais nunca foram permitidos aos cubanos usar. “Estou entre a esperança e o ceticismo”. 
Em Miami, Vivian Mannerud, agente de viagens de Cuba, disse que sua Airline Brokers Co. (Cia. de Venda de Passagens Aéreas) recebeu vários telefonemas de uns dos 70 mil ‘balseiros’ que abandonaram ‘ilegalmente’ a ilha (fugindo em perigosas balsas e jangadas adaptadas) e a quem não era permitido regressar à Havana sob o antigo sistema de migração. “Eles agora podem voltar ao seu país, usando os mesmos requerimentos dos demais cubanos que regressam: um passaporte cubano válido e um visto”, destacou Mannerud, ao se referir às permissões de reentrada emitidas por Havana.
A reforma, cujo ponto mais importante é o de eliminar a figura do “visto de saída” – absurdo que só existe em ditaduras socialistas – permite aos cubanos agora tecnicamente viajar ao exterior apenas com o seu passaporte e um visto de entrada no país de destino, o que, sem dúvida, está sendo uma das medidas mais populares do ditador Raúl Castro.
Uma pesquisadora universitária, chamada Olga, disse que “antes era impossível viajar. Agora, bem, isso é caro e difícil, mas pelo menos as pessoas podem sonhar e economizar para tanto”. Olga, um nome fictício, pediu para permanecer no anonimato por medo de represálias do governo por falar com um jornalista de Miami.
Victoria Nuland, uma porta-voz do Departamento de Estado, disse ontem numa conferencia de imprensa que as reformas eram positivas, mas acrescentou que “Cuba continua sendo um dos países mais repressivos do planeta”.
Berta Soler, líder das ‘Damas de Branco’, disse que não tinha recebido comunicação sobre a reforma, mas que gostaria de poder viajar a França para receber seu Premio Sakharov que o grupo de mulheres dissidentes cubanas ganhou em 2005, mas nunca obteve permissão do politiburo comunista cubano para ir receber pessoalmente.
Os “vistos de saída” foram criados em 9 de janeiro de 1959, quando a guerrilha de Fidel Castro tentava impedir que os partidários do então deposto também ditador Fulgencio Batista saíssem da ilha. E embora os cubanos tenham sempre odiado essa exigência, um relatório recente de Havana diz que de 2000 a 2012, apenas 0,6 por cento das solicitações para viagens ao exterior foram recusadas. No mesmo informe, o governo destacou que durante o mesmo período, 941.953 cubanos viajaram ao exterior — uma média de apenas 72.457 por ano num país de 11,2 milhões de habitantes — e que “só” 12,8 por cento deles não regressaram. Essas cifras não batem com os números dos relatórios do governo estadunidense que afirmam que de 38 a 40 mil chegaram anualmente aos Estados Unidos durante a década passada.
O jornal do Partido Comunista Cubano, Gramma, destacou num editorial que as reformas foram concebidas para “assegurar que os ‘movimentos migratórios’ ocorram de forma legal, ordenada e segura, bem como para fortalecer as relações com os emigrantes”. Por outro lado, o editorial acrescentou que as políticas estadunidenses que favorecem os emigrantes cubanos, como a Lei de Ajuste Cubano e a chamada política de “pés secos, pés molhados”, são concebidas “para fins de hostilidade, subversão, e desestabilização dos interesses legítimos do socialismo em nosso país”.
O jornal alega que “os esforços americanos para roubar cérebros cubanos, como as considerações especiais dos Estados Unidos aos médicos cubanos que desertam quando vão a eventos no exterior, justificam a necessidade de restringir as saídas de profissionais qualificados e outras pessoas com habilidades que são vitais para o país”. Mas não se referiu ao fato de um médico ganhar apenas 50 dólares por mês em Cuba, praticamente o mesmo que ganha um gari da prefeitura.
Havana está no fundo do poço socialista. Os cubanos que conseguem estudar e se formar em alguma profissão sabem muito bem o abismo que existe entre o que recebem na ilha e o que podem ganhar no exterior, mesmo numa situação de subemprego em relação aos seus colegas nacionais. Um exemplo disso é a Amazônia, onde já existe um punhado de médicos cubanos trabalhando para o governo brasileiro e ganhando em média, dois mil reais por mês, ou seja, quase mil dólares mensais, ao passo que pelo mesmo serviço em Cuba ganhariam em torno de 50 dólares.
Assim sendo, a Amazônia se transformou no sonho dourado do médico cubano que, no entanto, na quase totalidade deles, vem para a região praticar o exercício ilegal da Medicina, uma vez que o nível da medicina cubana é tão baixo – apesar do que diz em contrário a propaganda socialista – que muito poucos conseguem passar nas provas do CFM para reconhecimento de seus diplomas no Brasil. Eles estão lá substituindo, com grande desvantagem para a pobre população local, os médicos da Marinha do Brasil que, tradicionalmente, vinham fazendo o atendimento numa missão de integração nacional e, agora, estando essa força desprestigiada e totalmente desequipada, não pode mais realizar.
Há quem diga que o politiburo cubano está querendo se aproximar e agradar o enorme contingente de cubanos que vive na Flórida e de posse de considerável volume de capital em dólares, na esperança de atraí-los de volta à sua terra natal para que lá invistam seu dinheiro.
Todavia, a ilha tem que mudar muito mais do que isso para que esses cubanos ricos da Flórida tenham um mínimo de segurança institucional para retornar ao seu país, pois não irão querer outra coisa senão construir lá uma nação democrática e capitalista, única maneira de tirar o povo cubano da pobreza extrema e da miséria em que se encontra.
Título e Texto: Francisco Vianna (da mídia internacional), 15-01-2013

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