Sim, eu sei... Mas o senhor, o que é que
propõe?
José Mendonça da Cruz
Caro Dr. Pedro Passos Coelho,
Votei em si em 2010 e em 2015.
Começo por este esclarecimento para – esperançosamente – o interessar a si e
irritar os seus oponentes, sobretudo os militantes que enchem caixas de
comentários de jornais, revistas e blogs com considerações tão incendiadas quanto
obtusas contra si e a sua governação, junto com acusações de azia e
ressabiamento com que imaginam esmagar quem afinal só lamenta o seu pobre
entendimento. Se o interessei, a si, tanto melhor; se indispus os orcs, tanto
faz: os pobres diabos produzem ruído e autossatisfação, mas é só isso, só
folcore, nunca elegeram ninguém. Os orcs não são problema, Dr. Passos Coelho,
mas eu, seu eleitor, sou. É que eu, embora compreendendo-o, tenho um problema
consigo: é que não sei o que quer.
Austeridade, só? E que
mais?
Compreenda-me. Eu considero-o sério, responsável e prudente como
António Costa não é, e não quero perder mais do que umas poucas linhas a
discutir a sua governação entre 2011 e 2015. Compreendo que fez o necessário
para dar um aroma de seriedade às contas públicas e conquistar a credibilidade
entre instituições internacionais e investidores. Compreendi menos bem por que
razão aceitou para as suas políticas a mesma denominação de «austeridade» com
que os autores da bancarrota baptizaram as consequências desta. Compreendo
ainda menos por que razão a elegeu como proclamação-cerne da sua política. E
não consigo nem começar a compreender por que razão nunca fez cavalo de batalha
da publicidade sobre o controlo da dívida, a baixa das taxas de juros, a taxa
de crescimento superior à média europeia, a recuperação do emprego, o saldo
primário positivo, a animadora taxa de investimento, a animação das
exportações, o equilíbrio da balança corrente, a confiança internacional. É que
além de sinais de bom rumo, essas bem que poderiam ser as fundações de um
programa de governo com esperança e crível. Mas onde é que ele ficou, Dr. Pedro
Passos Coelho? Além de mais austeridade, de mais do mesmo, o senhor prometeu o
quê? Pensou que bastava? Pensa que, esperando, vai bastar?
Não basta.
A
primeira notícia que tenho para si (desculpe-me a presunção) é que não basta
nem vai bastar. Eu sei que o Dr. Jorge Sampaio é, por detrás da sua fingida
apatia e do ar equidistante e aristocrata que se inventou, um dos mais
perniciosos personagens que nos competiu sofrer. Mas, em outras circunstâncias,
em outro sentido, com uma seriedade a que ele era medularmente estranho, não é
verdade que há vida para além do défice? O desespero com que o actual governo
se aferra ao cumprimento desse mesmo défice quando tudo o resto vai mal não
é, a contrario, prova disso mesmo? Pois se a vida para além do
défice vai, com este governo, de mau a muito pior; onde haveria o lamentável
governo de aferrar-se? Mas… e o senhor, Dr. Pedro Passos Coelho, além do
cumprimento do défice que mais teria aí para nós? É que eu ainda não ouvi.
Julgo que ninguém sabe nem ouviu.
O medo não conquista
votos
(ou votos bastantes, ao menos) – isso, julgo eu, o senhor terá aprendido na
eleição de 2015. Então, porque não tira conclusões programáticas para o futuro?
Porque descansa em mais do mesmo e se limita a esperar? Bem pode dizer a um
povo ignorante que entregar o poder aos responsáveis da bancarrota traz a
bancarrota outra vez. O povo não acredita. E se não acredita não é apenas por
ignorância, é também porque pouco tem a perder. É um dos mais pobres e incultos
da Europa; se alguém lhe promete maravilhas, ou ao menos algum desapertar de
cinto, ou ao menos alguns tostões, ou ao menos a promessa da esperança da
ilusão de alguns tostões, como não haveria de acreditar? Ele não conhece mais
nada, ele acha que os políticos e as políticas são todas iguais, e, mal por
mal, prefere aquele que deixa as costas folgar (e se depois será pior é coisa
que só depois se verá). Julga que bastam maus indicadores, umas quantas
advertências internacionais e algum azar para pôr a governação de Costa a
perder? Não julgue. Lembre-se que até Sócrates foi reeleito quando o desastre
era claro e iminente.
Qual é a mensagem
que
o senhor traz, Dr. Pedro Passos Coelho? Se tem (como parece que tem) uma
alternativa a este vicioso ciclo socialista de gastos perdulários seguidos de
resgates penosos, se tem um programa contraditório e mesmo inimigo deste
sórdido fingimento de preocupações «sociais» com que a esquerda funcionaliza,
asfixia, tolhe e empobrece Portugal, é bem altura de o explicar e proclamar.
Tem medo do «eleitorado»? Não tenha. Hesita perante as clientelas com que o PS
é pródigo e nos desgoverna? Não hesite. Como os comunistas, só fazem o que as
deixarem fazer. Em vez disso, em vez de crer na «esquerdização» do eleitorado
por que suspiram e com que antecipadamente se deleitam os media avençados,
em vez de tomar por certo que os dependentes do Estado possam ser todos
contabilizados no mesmo saco cor-de-rosa em que a parcialidade dos media os
imagina, em vez das sondagens amigas de Costa com que o séquito de Costa se
engalana, aproprie-se da abstenção, aproprie-se o senhor, Dr. Pedro Passos
Coelho, da abstenção. Faça seus os desencantados, os cépticos, os abúlicos, os
zangados, e os que esperam um programa claro e melhor. Junte-os aos que votaram
em si. Fale-lhes de progresso, iniciativa, riqueza, dinheiro, bem-estar,
orgulho, respeito, mérito, confiança internacional, progresso. Explique-lhes ponto
por ponto que há uma alternativa de riqueza, modernidade e civilização a esta
mediocridade torpe, a esta maneira arcaica, falida, rasca e rasteira de estar.
Explique-lhes como e por que passos chegamos lá. Experimente, que vale a pena.
É que com menos do que isso nunca terá maioria para governar.
Perfeita!
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