Alberto Gonçalves
Há oito dias, escrevi aqui
sobre o livro Homossexuais no Estado Novo, onde a "jornalista" São
José Almeida inventariou, sem o consentimento dos próprios e com alegada
legitimidade académica, a orientação sexual de diversas figuras mais ou menos
ligadas ao regime anterior. A coisa veio a propósito de um livro recente de
José António Saraiva, Eu e os Políticos, nova colectânea de mexericos (a
acreditar na imprensa) que deu brado principalmente por causa da anunciada, e
entretanto cancelada, apresentação a cargo de Pedro Passos Coelho. No fundo,
limitei-me a notar que, excepto pelas inclinações ideológicas dos autores, não
compreendia o escândalo provocado pela segunda "obra" face à
indiferença ou à exaltação suscitadas pela primeira.
Pois bem. Num blogue que
mantém no Expresso (Tudo Menos Economia), Francisco Louçã [foto] resolve proclamar que
o opúsculo do arq. Saraiva foi "defendido naturalmente por um cavalheiro
do mesmo calibre que dá pelo nome de Alberto Gonçalves, no DN, e porventura por
ninguém mais". Na mesma página, em resposta a um leitor que discordava da
afirmação, o dr. Louçã acrescenta: "Que bem que lhe fica defender o
Gonçalves, que defende o Saraiva como pode e mais não consegue." Abaixo,
em resposta a outro leitor, o Louçã, perdão, o dr. Louçã (não quero intimidades
com gente dessa) aconselha: "Leia todo o artigo do Gonçalves para ver como
ele banaliza o feito do Saraiva." Questionado por um terceiro leitor
acerca do Homossexuais no Estado Novo, afinal a referência que permitiria
determinar a "banalização", o dr. Louçã esclarece: "Não
li."
Regresso à crónica da semana
passada para lembrar a minha "defesa" arrebatada do Eu e os
Políticos, da qual sinceramente não fazia ideia. Talvez por não ter existido.
Fundamentado nas citações e alusões que saíram nos jornais, chamei-lhe "baldinho
de lixo", e garanti não duvidar de que se tratava de "uma
porcaria". É certo que não cheguei a exigir a lapidação ou o enforcamento
do arq. Saraiva, mas isso deve-se apenas à brandura do meu carácter. Em
qualquer dos casos, suponho, "lixo" e "porcaria" não são
epítetos habitualmente utilizados na defesa seja do que for. Em qualquer dos
casos, ou o dr. Louçã é demasiado burgesso até para os padrões do Bloco de
Esquerda ou, para recorrer à deprimente retórica parlamentar, o dr. Louçã
faltou à verdade. Em português, palpita-me que o dr. Louçã mentiu. E mentiu de
maneira tão tosca, no sentido em que a verdade é tão fácil de repor, que o
facto só tem uma explicação.
Ao longo da sua curiosa
carreira, o dr. Louçã contou sempre com uma plateia de bonequinhos amestrados
que levam a sério os incontáveis disparates que regularmente profere. Se a
criatura se alivia de uma mentira pequenina, os bonequinhos acreditam. Se a
mentira é grande, os bonequinhos acreditam também. Há muito que a criatura
percebeu não valer a pena enfeitar as absurdas intrujices que diz, um produto
com procura suficiente para, no estado bruto, permitir-lhe ganhar a vida sem
preocupações. À semelhança dos correligionários dele, o dr. Louçã é,
literalmente, um mentiroso profissional, ofício para cúmulo favorecido pela
reverência dos media, a indigência da universidade que o emprega e o enviesado
primarismo do nosso "debate" público. E como mentiroso profissional é
incansável: se o dr. Louçã dá os bons-dias, é garantido que está a chover.
Admito que nada disto possui
particular importância. Simplesmente não gosto que me acusem de proezas que não
pratiquei. Por uma vez, convém que as desastradas mentiras do dr. Louçã não
fiquem impunes. Por uma vez, uma singela vez, é higiénico avisar que tudo o que
sai da cabecinha daquela criatura não passa - vamos lá rever a matéria - de um
lixo e de uma porcaria. E agora espero encarecidamente que o dr. Louçã não me
acuse de defendê-lo a ele, uma inominável vergonha e uma calúnia ainda maior do
que a da defesa do arq. Saraiva.
Título e Texto: Alberto Gonçalves, Diário de Notícias, 26-9-2016
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