Rodrigo Constantino
Quando eu era garoto, tinha
uma divisão clara na escola entre o grupo dos inteligentes e aqueles mais
obtusos. Estes nunca eram capazes de captar a ironia daqueles. Falo com
conhecimento de causa: nunca fui inteligente, e ainda não sou. Mas me esforço
bastante. E gostaria de compartilhar com os leitores algumas lições importantes
que aprendi – ou assim acredito – com os sábios.
Comecemos pela tese de golpe
no impeachment de Dilma. Um sujeito burro dirá que não houve golpe só porque a
Constituição foi respeitada, as leis foram cumpridas e houve amplo direito de
defesa. Poderão alegar que, para prevalecer a ideia de golpe, todos –
Congresso, imprensa, Ministério Público, Polícia Federal e até STF – teriam de
estar envolvidos. São limitados, tadinhos.
Meus mestres sábios explicaram
que nada disso importa. Dilma era representante dos pobres e oprimidos, apesar
do alto desemprego e da elevada inflação. Logo, derrubá-la é golpe e ponto
final. Tudo não passou de uma vingança de Cunha, aquele que também caiu logo
depois, pelo mesmo Congresso “sem moral”. As elites não suportam as conquistas
sociais dos mais pobres, eis o fato. Por isso criticam tanto o socialismo.
Basta ver como vivem bem os pobres na Venezuela.
As elites não suportam as conquistas
sociais dos mais pobres, eis o fato. Por isso criticam tanto o socialismo.
Basta ver como vivem bem os pobres na Venezuela
Mas o golpe passou. E agora
Temer, vejam só!, quer aprovar reformas estruturais, reduzindo os direitos dos
trabalhadores. Seu governo quer flexibilizar as leis trabalhistas, que datam da
era Vargas e foram inspiradas em Mussolini. Só alguém muito insensível pode
desejar uma coisa dessas. Onde já se viu um trabalhador poder ter a liberdade
de negociar diretamente com o patrão, sem ser obrigado a aceitar a incrível
ajuda sindical?
“Nos países ricos”, um ser
tacanho poderá responder. Nos EUA, na Alemanha e mesmo nos países escandinavos
os trabalhadores não gozam dessa proteção sindical toda, não desfrutam das
mesmas conquistas trabalhistas. Mas meus amados mestres explicaram: se esses
países tivessem nossas leis trabalhistas rígidas, poderiam ser ainda mais
ricos, tão ricos como nós! Poderiam ser até como uma Venezuela!
Há, ainda, a questão da
previdência: o governo quer reformá-la só porque a conta não fecha e o rombo é
crescente. Tenho pouca paciência para esses bitolados que adoram matemática. Se
fossem mais inteligentes, saberiam que basta imprimir dinheiro para pagar as
aposentadorias. E a inflação? Ora, basta congelar os preços depois. Vide, uma
vez mais, o exemplo venezuelano.
Enfim, posso ser burrinho e
não ter capacidade de compreender ironias, mas ao menos absorvi a inteligência
dos meus professores marxistas. Impeachment é golpe, sindicatos são amigos dos
trabalhadores e os rombos das aposentadorias são ilimitados. Ah sim: viva a
Venezuela e Fora, Temer!
Título, Imagem e Texto:
Rodrigo Constantino, IstoÉ,
23-9-2016
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