Carina Bratt
A palavra sadismo deriva do
nome de um aristocrata francês, dramaturgo, filósofo e escritor
pornograficamente libertino conhecido entre nós, como o Marquês de Sade.
Nascido em Paris, aos 2 de junho de 1740, se alistou esse cidadão no exército
aos quatorze anos. A estrema crueldade diária que presenciou durante os doze
anos em que serviu ao seu país, como soldado, o levou a seguir o trilho das
orgias mais depravantes. Testemunhou inúmeras surras, centenas de estupros e
outros infindáveis meios de torturas e castigos corporais, o que, segundo um de
seus biógrafos, ou mais precisamente a escritora Giovana Sanches, “marcou a sua
personalidade até então desconhecida (inclusive para ele próprio), para o resto
da vida”.
Sade deixou as fileiras da
farda e começou a contratar garotas de programas a bel prazer das suas sanhas
mais tresloucadas e igualmente prostitutas baratas, com as quais se entregava a
sua paixão violenta pela crueldade, crueldade essa em seu grau mais elevado.
Essa prática meio que tresloucada, o levou a ser preso por inúmeras vezes. Ao
longo de sua vida, Sade passou exatos vinte e sete anos atrás das grades, vendo
o sol nascer quadrado e não só ele, a lua e as estrelas em igual ótica.
Internado num hospício, veio a óbito em 2 de dezembro de 1814, aos setenta e
quatro anos. Nas masmorras Sade deu vida a vários livros, entre eles, os abaixo
citados pelo seu historiador mais insigne, Gilbert Levy, com destaque para “Aline
e Valcour”, “A Filosofia na alcova”, “Contos libertinos” e “Journées de
Florbele”.
Em toda a sua obra, Sade
descreveu em minúcias, os vários tipos de torturas que existiam desde os tempos
antigos, entretanto, só depois que trouxe toda essa sujeira a público, é que os
especialistas em sacanagens e putarias (notadamente os doutores diplomados no
assunto) passaram a declinar uma atenção mais dirigida a essas atividades. Sade
com toda a sua pornografia publicada, coloca pra escanteio Henry Miller, autor
de vários livros tidos como “sujos e danosos às mentes pagãs”, entre eles, a
trilogia “A Crucificação Encarnada” e “O Colosso de Maroussi”. Com a literatura
obscena desse e de outros autores, se descobriu que desde as manifestações mais
primitivas e conhecidas, o sadismo fazia parte (ou era uma espécie de
componente) das cerimônias religiosas.
A dor, a vergonha, o vexame,
por sua vez, faziam parte de um desses componentes, aliás, necessários por
vários ritos de expiação. Aclarando as ideias de minhas amigas e leitoras,
“expiação” nada mais é que uma derivação de sacrifício, castigo, admoestação,
flagelo, sanção, suplício etc. Os cidadãos da Roma imperial se entusiasmavam
com o espetáculo da agonia humana, sendo o exemplo mais chocante e conhecido,
as pelejas dos gladiadores. Nessa modalidade, homens e mulheres lutavam até a
morte ou enfrentavam bestas selvagens, para deleite de uma plateia de
enlouquecidos. O mesmo sadismo está subjacente ao prazer mórbido que as pessoas
sentem nos dias atuais ao assistirem, ao vivo, lutas de boxe, corridas de
automóvel, touradas, rachas, motocicletas com pilotos pra lá de noiados,
acrobacias de aviões, ou qualquer outro
esporte em que seja alta a chance de morte ou mutilação se fazerem presentes.
Danilo Gentili comunga com a
absurdez de que “cada um de nós temos em nosso DNA, um pouco de sádico, sadismo
esse em grau maior ou menor que o Marques de Sade, dependendo esse particular,
muito da cabeça e do mundo em que vive metida a criatura”. Drauzio Varella em
“Cabeça do Cachorro”, leciona que “o amor e o ódio são paixões intimamente
relacionadas. O desejo de causar dor em quem amamos é normal. Em alguns casos,
essa dualidade é reforçada por incidentes esquecidos da infância”. Freud em
“Totem e Tabu” escreve sobre “um menino que viu os pais copulando e imaginou
que o pai estava atacando a mãe numa briga terrível. Uma criança frequentemente
espancada pelos pais pode associar essa dor com o amor que sente por eles”.
Em “A Psiquiatria e o velho
hospício”, do saudoso médico psiquiatra José Leme Lopes, aprendemos que “A
confusão entre a dor e prazer também podem advir de alguma experiencia de vida
adulta. Os homens em tempo de guerra veem a morte dos inimigos como uma ação
positiva e compensadora. Para pessoas pobres ou oprimidas, espancamento e
crueldade são uma forma de libertar-se do sentimento de impotência que envolve
suas vidas”. A médica Nise da Silveira, em seu fabuloso livro “Imagens do
inconsciente”, discorrendo sobre o sadismo, pergunta: “o sadismo pode fazer
parte do comportamento humano normal?
E responde, ao tema indagado
da seguinte maneira. “Subjacente a todas as formas de comportamento sádico está
um instinto completamente natural: o de querer dominar os outros. Trata-se de
um instinto que motiva nossas grandes realizações e todas as nossas ambições,
mas também nossas piores atrocidades. Essa é a dificuldade de tentar apontar as
causas de certos tipos de comportamento como sadismo. A textura do
comportamento humano, sexual ou não, é feita em um contínuo entrelaçamento de
contrastes. Tudo tem sua causa em tudo”.
Domingo que vem discorreremos sobre o
“MASOQUISMO”. Até lá. Por agora, bom começo de 2020, para todas as minhas
amigas leitoras e seguidoras da Família Cão que fuma.
Título e Texto: Carina
Bratt, de Vila Velha, no Espírito Santo. 5-1-2020
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