domingo, 5 de janeiro de 2020

[As danações de Carina] O que sabemos sobre sexo pervertido e outras anomalias? – Parte três

Carina Bratt

A palavra sadismo deriva do nome de um aristocrata francês, dramaturgo, filósofo e escritor pornograficamente libertino conhecido entre nós, como o Marquês de Sade. Nascido em Paris, aos 2 de junho de 1740, se alistou esse cidadão no exército aos quatorze anos. A estrema crueldade diária que presenciou durante os doze anos em que serviu ao seu país, como soldado, o levou a seguir o trilho das orgias mais depravantes. Testemunhou inúmeras surras, centenas de estupros e outros infindáveis meios de torturas e castigos corporais, o que, segundo um de seus biógrafos, ou mais precisamente a escritora Giovana Sanches, “marcou a sua personalidade até então desconhecida (inclusive para ele próprio), para o resto da vida”.

Sade deixou as fileiras da farda e começou a contratar garotas de programas a bel prazer das suas sanhas mais tresloucadas e igualmente prostitutas baratas, com as quais se entregava a sua paixão violenta pela crueldade, crueldade essa em seu grau mais elevado. Essa prática meio que tresloucada, o levou a ser preso por inúmeras vezes. Ao longo de sua vida, Sade passou exatos vinte e sete anos atrás das grades, vendo o sol nascer quadrado e não só ele, a lua e as estrelas em igual ótica. 
Internado num hospício, veio a óbito em 2 de dezembro de 1814, aos setenta e quatro anos. Nas masmorras Sade deu vida a vários livros, entre eles, os abaixo citados pelo seu historiador mais insigne, Gilbert Levy, com destaque para “Aline e Valcour”, “A Filosofia na alcova”, “Contos libertinos” e “Journées de Florbele”.

Em toda a sua obra, Sade descreveu em minúcias, os vários tipos de torturas que existiam desde os tempos antigos, entretanto, só depois que trouxe toda essa sujeira a público, é que os especialistas em sacanagens e putarias (notadamente os doutores diplomados no assunto) passaram a declinar uma atenção mais dirigida a essas atividades. Sade com toda a sua pornografia publicada, coloca pra escanteio Henry Miller, autor de vários livros tidos como “sujos e danosos às mentes pagãs”, entre eles, a trilogia “A Crucificação Encarnada” e “O Colosso de Maroussi”. Com a literatura obscena desse e de outros autores, se descobriu que desde as manifestações mais primitivas e conhecidas, o sadismo fazia parte (ou era uma espécie de componente) das cerimônias religiosas.

A dor, a vergonha, o vexame, por sua vez, faziam parte de um desses componentes, aliás, necessários por vários ritos de expiação. Aclarando as ideias de minhas amigas e leitoras, “expiação” nada mais é que uma derivação de sacrifício, castigo, admoestação, flagelo, sanção, suplício etc. Os cidadãos da Roma imperial se entusiasmavam com o espetáculo da agonia humana, sendo o exemplo mais chocante e conhecido, as pelejas dos gladiadores. Nessa modalidade, homens e mulheres lutavam até a morte ou enfrentavam bestas selvagens, para deleite de uma plateia de enlouquecidos. O mesmo sadismo está subjacente ao prazer mórbido que as pessoas sentem nos dias atuais ao assistirem, ao vivo, lutas de boxe, corridas de automóvel, touradas, rachas, motocicletas com pilotos pra lá de noiados, acrobacias de aviões,  ou qualquer outro esporte em que seja alta a chance de morte ou mutilação se fazerem presentes.

Danilo Gentili comunga com a absurdez de que “cada um de nós temos em nosso DNA, um pouco de sádico, sadismo esse em grau maior ou menor que o Marques de Sade, dependendo esse particular, muito da cabeça e do mundo em que vive metida a criatura”. Drauzio Varella em “Cabeça do Cachorro”, leciona que “o amor e o ódio são paixões intimamente relacionadas. O desejo de causar dor em quem amamos é normal. Em alguns casos, essa dualidade é reforçada por incidentes esquecidos da infância”. Freud em “Totem e Tabu” escreve sobre “um menino que viu os pais copulando e imaginou que o pai estava atacando a mãe numa briga terrível. Uma criança frequentemente espancada pelos pais pode associar essa dor com o amor que sente por eles”.

Em “A Psiquiatria e o velho hospício”, do saudoso médico psiquiatra José Leme Lopes, aprendemos que “A confusão entre a dor e prazer também podem advir de alguma experiencia de vida adulta. Os homens em tempo de guerra veem a morte dos inimigos como uma ação positiva e compensadora. Para pessoas pobres ou oprimidas, espancamento e crueldade são uma forma de libertar-se do sentimento de impotência que envolve suas vidas”. A médica Nise da Silveira, em seu fabuloso livro “Imagens do inconsciente”, discorrendo sobre o sadismo, pergunta: “o sadismo pode fazer parte do comportamento humano normal?

E responde, ao tema indagado da seguinte maneira. “Subjacente a todas as formas de comportamento sádico está um instinto completamente natural: o de querer dominar os outros. Trata-se de um instinto que motiva nossas grandes realizações e todas as nossas ambições, mas também nossas piores atrocidades. Essa é a dificuldade de tentar apontar as causas de certos tipos de comportamento como sadismo. A textura do comportamento humano, sexual ou não, é feita em um contínuo entrelaçamento de contrastes. Tudo tem sua causa em tudo”. 

Domingo que vem discorreremos sobre o “MASOQUISMO”. Até lá. Por agora, bom começo de 2020, para todas as minhas amigas leitoras e seguidoras da Família Cão que fuma.
Título e Texto: Carina Bratt, de Vila Velha, no Espírito Santo. 5-1-2020

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