Paulo Hasse Paixão
Democracy is when you ban parties from taking part in democracy. https://t.co/YyYO2zbSEg
— Count Dankula (@CountDankulaTV) August 13, 2023
Os partidos do eixo de poder não podem aceitar que um quarto do eleitorado não alinhe com a narrativa oficial sobre a natureza da realidade, nas suas múltiplas facetas morais, filosóficas, sociais, políticas ou científicas. E esses desalinhados serão rapidamente destituídos de um princípio sagrado da democracia que é até essencial à ética fiscal: a representação. O contrato social que os cidadãos fazem com o estado é de grande simplicidade: o direito de eleger os representantes que decidem sobre as políticas de tributação legitima o acto tributário, e cidadãos não representados não são legitimamente tributados. São pura e simplesmente espoliados.
E isto de retirar o direito à representação a certos segmentos da população, para cúmulo do cinismo e num exercício recordista de double speak, é feito alegadamente em nome da democracia, sendo que o termo tem neste contexto o mesmo significado que tinha na “República Democrática Alemã” do Bloco de Leste ou, estendendo a comparação para fora do seu âmbito estrito, “salvar a democracia” é agora um argumento equivalente ao de “salvar o planeta”. Em nome desta “salvação” é possível desenvolver uma intensa bateria de fascismos. É até possível destruir a democracia, como é até possível destruir o planeta.
A imprensa corporativa alemã
está entusiasmada: há mesmo que interditar rapidamente a opinião inconveniente
ao grande progressismo globalista; há que prender dissidentes, perseguir os
espíritos de contradição, prender os escolhos humanos que impedem a santificada
máquina de compressão dos poderes instituídos de progredir na sua tarefa
diversificadora e equalizadora de povos e nações.
E a creditar as sondagens, os
cidadãos da federação estão bem divididos: 47% querem interditar o AfD. 47% não
querem. E isto apesar de 4 em cinco cidadãos germânicos estarem descontentes
com o seu governo federal e muito particularmente com as suas políticas de
imigração, de que o AfD, por acaso, até é o principal crítico. Não se percebe.
O AfD só já não foi
definitivamente escorraçado do panorama institucional da federação alemã porque
o Gabinete Oficial para a Proteção da Constituição ainda não se pronunciou
sobre o assunto. Acontece que o mesmo Gabinete Oficial para a Proteção da
Constituição já se pronunciou sobre a ala da Juventude do AfD, para a
considerar “de extrema-direita” e, portanto, inconstitucional (escusado será
dizer que qualquer movimento de extrema-esquerda não é assim excomungado, na
Alemanha). Daqui, é fácil tirar a conclusão que o AfD tem os dias contados.
Curioso que ninguém se
pergunte sobre a constitucionalidade de um partido como os Verdes. Não sendo de
todo uma agremiação marginal no quadro dos poderes instituídos da Alemanha, o
partido ocupa atualmente 118 dos 736 lugares no Bundestag, depois de ter ganho
14,8% dos votos expressos nas eleições federais de 2021, e é agora o terceiro
maior dos seis grupos parlamentares, fazendo parte do governo federal. Os 300
delegados do congresso deste partido detestam de tal forma o seu próprio país
que solicitaram que
a palavra “Alemanha” fosse retirada do seu manifesto. E assim foi feito. Mas
isso, aparentemente, não fere os guardiões da constituição nem aleija os
polícias da democracia alemã.
Quase que dá vontade de rir.
A Alemanha é uma federação
relativamente recente, com 140 anos de história e alguns interregnos
regimentais e territoriais. Mas nessa curta existência não faltam exemplos de
interdições à “democracia” para “salvar a democracia”. Bismark baniu os sociais-democratas
por deslealdade ao Kaiser. Os nazis baniram todos os partidos que não eram
nazis. O regime Stasi comunista baniu todos os partidos não comunistas. E agora
os neoliberais e os radicais de esquerda vão banir o único partido no país que
não é neoliberal nem radical de esquerda.
Alemães a serem alemães. Outra
vez.
E Paul Joseph Watson, também.
Título e Texto: Paulo Hasse
Paixão, ContraCultura,
21-8-2023
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