Humberto Pinho da Silva
Ao ter conhecimento de que o Conselho de Estado
foi interrompido porque membro teve de se ausentar, para assistir a jogo de
futebol, lembrei-me o incidente ocorrido, em Atenas, na antiquíssima Grécia.
Estava Demóstenes a discursar do ambom, expondo os importantes negócios da cidade, quando lhe chega aos ouvidos sussurros e zunzuns abafados.
Alonga os olhos estupefacto e verifica surpreso,
que o ilustríssimo auditório, constituído por políticos, anciões e povo,
estavam abstratos. Uns, dormitavam; outros, cochichavam; e ainda outros,
bocejavam, escancarando a boca como púcaros destapados.
Então, Demóstenes estende o braço, espalma a mão
direita, e sereno declara:
- Vou interromper, para contar curta história...
O estadista, empertiga-se:
“Ateniense necessita de negociar na cidade
vizinha. Ajusta, com alquilador, preço, e aluga burrito.
Pelo ardor da tarde, o calor era abrasador. O
rosto tisnado do comerciante reluzia de suor. A canícula era insuportável.
Sufocado, o homem apeia-se e saboreia a sombra acolhedora do jerico.
O alquilador, que o acompanhava, energicamente, repostou:
- Eu aluguei-lhe o burro, mas não sua sombra... Se
goza o sombreado, terá de negociar...
Atónito, o negociante, retruca iracundo:
- Ora essa! Quem aluga o burro, aluga também sua
sombra!
Estavam na absurda altercação, quando...”
Demóstenes aparta-se do púlpito, compõe a prega da
túnica, desce, paulatino, o palanque; simula ausentar-se, como aparenta
maestro, concluída a sinfonia.
A multidão curiosa cresce, e em uníssono, reclama,
gesticula, delira:
- Queremos saber o fim da história!...
Morosamente, o estadista, galga o estreito
estrado; acerca-se do ambom e de semblante sombrio:
- Ao expor os interesses de Atenas, estavam
enfastiados; agora que conto a história de um asno, acordais!... interessa-vos
mais as aventuras de um jumento, que o destino da Pátria!...
Muitas vezes, povo e alguns políticos, animam-se
mais com questões de lana-caprina, do que assuntos importantes para a nação, e
benefícios para trabalhadores, reformados, e para os infelizes que não auferem
qualquer rendimento.
Título e Texto: Humberto Pinho da Silva,
agosto de 2023
Sacrilégio abominável
O poder dos brados
Lá fora já se usa!...
Onde se fala de socialismo e democracia
Não são só os cérebros que emigram
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