domingo, 1 de janeiro de 2012

Não há mais ilusões. Parar é morrer.


António Ribeiro Ferreira
O ano de 2011 acaba hoje e a grande maioria dos portugueses olha para 2012 como um ano terrível cheio de horrores e tragédias. É natural. A cura já está a ser violenta, dura, e muitos doentes não vão resistir ao tratamento previsto para os próximos 12 meses. Não há dinheiro para tanto antibiótico. É preciso poupar, reduzir as dívidas do passado e obrigar o Estado, as empresas e as pessoas a gastar menos e a viver com menos dinheiro. Já se sabe que as queixas vão ser muitas, os protestos variados e provavelmente alguns terão muita razão. Mas não há alternativas. Os transportes públicos serão reduzidos, os preços subirão e muitos trabalhadores irão parar ao desemprego. É natural que protestem, mas não há outro remédio. Os hospitais-empresa e os outros não podem continuar a acumular dívidas, a pregar calotes sucessivos aos fornecedores e a contratar pessoal com salários elevados. Têm, necessariamente, de poupar, mesmo que a poupança afecte a saúde das populações. A racionalização do Serviço Nacional de Saúde já começou. A ideia de uma saúde gratuita e de excelência já deu o que tinha a dar. O SNS em Portugal tem de ser adaptado ao país que temos, isto é, à riqueza produzida todos os anos. Não há lugar para mais ilusões, fantasias e sonhos. A dependência do crédito fácil, barato e maravilhoso conduziu o país e as pessoas a esta terrível situação. Como é habitual em todos os vícios, seja a droga, seja o álcool, o tabaco ou o jogo, a ressaca é dolorosa e nem sempre leva à cura do viciado. Depende da vontade, da força e da esperança de uma vida melhor e mais responsável. Muitas pessoas e muitas empresas não vão resistir à ressaca. Não vale a pena vender ilusões. Muitos ficarão pelo caminho. Mas os outros, os que resistirem, têm a certeza que o futuro pode ser construído em bases sólidas e não em cima de castelos de areia. É por isso que as reformas que aí vêm no trabalho, nas rendas, na justiça, na Segurança Social e no Estado não podem ser tímidas, feitas por gente com medo de descontentamentos, protestos ou mesmo violentas contestações sociais. Não há lugar para recuos, hesitações, medidas dúbias para agradar a gregos e a troianos. É preciso determinação e coragem. É preciso clarividência para explicar às pessoas que não há outro caminho, que muitos vão ficar sem os direitos adquiridos ao longo de muitos anos e que o Estado não tem dinheiro para socorrer todos os que vão ser atingidos em cheio pela crise e pelos remédios necessários para a ultrapassar o mais rapidamente possível. É preciso dizer a verdade e não esconder as muitas tragédias provocadas por esta aterragem de emergência de uma nave que andou em altos voos sem tripulação à altura e sem dinheiro para pagar o combustível. Os resistentes, os mais fortes, os que aguentarem estoicamente esta violenta ressaca, também devem saber que o futuro não será necessariamente melhor, não depende apenas do seu esforço e da sua vontade. Mas também devem saber que sem isso não há solidariedade europeia e internacional que os salve. O mundo mudou e muito. E 2012 vai ser o primeiro ano de uma nova era em todo o planeta. Nada será como dantes.
Título e Texto: António Ribeiro Ferreira, jornal “i”, 31-12-2011
Edição: JP

Relacionados:

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Não publicamos comentários de anônimos/desconhecidos.

Por favor, se optar por "Anônimo", escreva o seu nome no final do comentário.

Não use CAIXA ALTA, (Não grite!), isto é, não escreva tudo em maiúsculas, escreva normalmente. Obrigado pela sua participação!
Volte sempre!
Abraços./-