segunda-feira, 30 de janeiro de 2012

De novo o Rio e as bobagens do sentimento nativista. Ou: chamemos o certo de “certo” e o errado de “errado” (E mais um bueiro)


Reinaldo Azevedo
Fiz, sim, uma dura crítica ao desempenho do governo do Rio — especialmente do governador Sérgio Cabral — no caso dos desabamentos dos três prédios. Não retiro nem matizo uma miserável palavra e creio que outras tantas devam ser acrescentadas, como farei. Antes, no entanto, são necessárias algumas considerações.
É uma tolice, uma bobagem, afirmar que critiquei “o Rio”. Não! Eu reprovei o comportamento de Cabral e classifiquei de desastrada a ação de resgate das vítimas, com retroescavadeiras operando no canteiro poucas horas depois da tragédia. É um procedimento inaceitável. Mais: faltaram peritos para orientar o trabalho, o que poderia ser vital para se chegar às causas do desastre. Diz-me um engenheiro que o modo como quebra uma viga, o retorcimento da ferragem e até o tamanho dos escombros são pistas essenciais do que aconteceu.
Em nenhum momento sugeri que a população do Rio não sabe votar. Se o sujeito, porque eleito, tem de ficar imune à crítica — ou, então, se estará atacando a maioria que o escolheu —, instituamos a ditadura por intermédio das urnas. É o sonho dourado dos totalitários.
Sugiro a alguns exaltados fluminenses, especialmente a alguns cariocas, e a uns tantos críticos contumazes do Rio que deixem de bobagem. Infelizmente, dadas a baixa qualidade da fiscalização e a corrupção da máquina pública, em todas as esferas, o que se viu pode acontecer em qualquer cidade. Mas é preciso reconhecer a particularidade quando diante de uma. Carregar corpos de vítimas junto com entulho é uma manifestação brutal de incompetência. Ela não revela nada do povo do Rio. Isso é besteira. O tratamento dispensado ao caso é que expõe a blindagem dos governantes locais, o que considero ruim para a cidade e para o estado.

Qualquer profissional de imprensa e qualquer leitor sabem que evento idêntico em São Paulo levaria os governantes locais para o corredor polonês. Não se trata de culpar esse ou aquele pelo desabamento. Trata-se de reconhecer uma operação desastrada de salvamento, de que os fragmentos de corpos no entulho são provas cabais. Em nenhum país do mundo se decreta não haver mais chance de resgatar vítimas com vida depois de 24 horas. E se fez isso no Rio. Sob o silêncio cúmplice da imprensa, que também não estranhou aquelas absurdas retroescavaderias no local já nas primeiras horas de quinta-feira.
Clima de “Estamos todos juntos”
O Rio, infelizmente, tem assistido a uma seqüência de eventos trágicos. Imediatamente, as TVs convocam a rede de solidariedade, o que é compreensível e correto. Mas isso não pode se confundir com inibição da crítica e da cobrança — e ouso dizer que isso está, sim, acontecendo. Reparem que não há, na grande imprensa, a fala de um só especialista em resgate. A história dos corpos despedaçados nos entulhos é tratada como uma fatalidade, um dano marginal, coisa própria a operações dessa natureza. E isso simplesmente não é verdade.
O Rio vem de uma sucessão de governos realmente desastrados e desastrosos. Sérgio Cabral, muito em razão da supervalorizada — e também pouco questionada — implementação das UPPs, conseguiu operar acima do padrão histórico. Entendem muitos formadores de opinião na cidade — e pode até ser que tenham razão; não debato isso — que as eventuais alternativas podem ser piores. Ok. Isso, no entanto, não deve impedir de se caracterizar o erro como um “erro”, ou quem perde é a população.
Regionalismo, meus queridos, para atacar ou para se defender, é sempre um argumento burro. Eu não estou dizendo que a imprensa carioca deva detestar o Rio, assim como a paulista, ou boa parte dela, detesta São Paulo. Ao contrário: deve amá-lo ainda mais. E uma boa maneira de fazê-lo é chamando o erro de “erro” e o acerto de “acerto”. O fato de Anthony Garotinho criticar Cabral não deve tornar Cabral imune à crítica até de quem não é Anthony Garotinho, não é mesmo?
Para encerrar: ilações feitas na imprensa estrangeira de que o desabamento pode indicar risco para os que forem aos estádios na Copa são, claro!, exageros estúpidos. Mas não venham me dizer que o exemplo escancarado de ineficiência no resgate deveria ter sido ignorado. Afinal, é o estado brasileiro que responde pela segurança do evento, não?
Título e Texto: Reinaldo Azevedo, 30-01-2012
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Explosão em um bueiro usado para o escoamento de água da chuva no porto do Rio, hoje, segunda-feira, 30-01-2012. Foto: Bia Alves/Fotoarena/Especial para Terra. A notícia está aqui.

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