sexta-feira, 16 de setembro de 2016

Isabel dos Santos e o custo dos barris de petróleo

Rui Verde


Isabel dos Santos [foto] deu uma entrevista à cadeia americana de televisão CNBC, tendo o belo Lago de Como, em Itália, como cenário idílico.

É permanente a intervenção de Isabel dos Santos nos órgãos de comunicação anglo-americanos. Está tudo muito certo, mas a verdade é que isto implica a globalização do problema angolano. Não podem querer ter o pódio internacional, e não serem alvo do escrutínio internacional.

A “boa notícia” que Isabel dos Santos deu aos americanos e ao mundo foi que a sua gestão na Sonangol já tinha baixado os custos de produção do barril de petróleo para 12 dólares americanos por unidade. Recorde-se que, quando Isabel tomou posse em Junho de 2016 como presidente do Conselho de Administração, os custos de produção rondariam os 14 dólares. Diz agora, passados dois meses, que conseguiu reduzir dois dólares através de negociações com os fornecedores.

Isabel dos Santos faz esta afirmação com um sorriso convincente, mas não convence, porque tecnicamente é impossível defender esta sua afirmação.

Vejamos porquê.

A produção de petróleo é uma actividade muito complexa, envolvendo uma multitude de fornecedores que habitualmente realizam contratos com um prazo dilatado em virtude dos elevados investimentos necessários. Esses contratos não se alteram à velocidade da luz. Podem ser alterados, claro, mas através de negociações, senão vai tudo parar a tribunal e é um imbróglio.

Podemos admitir até que os contratos tenham sido negociados, mas o seu efeito não é imediato. Isabel dos Santos não poderia dizer que os custos de produção baixaram já para 12 dólares. Poderia, isso sim, dizer que face a negociações ocorridas tem a perspectiva de que estes venham a situar-se abaixo dos 12 dólares. Isso pode acontecer ou não na realidade.

E a realidade é que a contabilidade da Sonangol não é totalmente fiável, como demonstrou a auditora E&Y na sua certificação legal de contas com reservas de 2015, realizada em Abril de 2016. Em relação ao seu core business, existem 400 mil milhões de kwanzas de movimentos financeiros com o Estado cuja natureza não se consegue determinar com precisão. E há outros 400 mil milhões de kwanzas de perdas não identificadas plenamente. Finalmente, existem ainda movimentos na ordem dos 200 mil milhões de kwanzas que não se sabem se são ou não recuperáveis. Temos então dúvidas de auditoria na ordem do bilião de kwanzas, ou de um trilião de kwanzas, se usarmos as denominações numéricas norte-americanas (verificar pontos 1, 2 e 3 do Relatório de Auditoria da Sonangol EP Consolidado de 2015).

Portanto, antes de anunciar qualquer descida ou subida nos custos operacionais, a gestão da Sonangol teria de apresentar números transparentes e fidedignos sobre a Sonangol. Só depois de sabermos os números de partida em Junho de 2016 poderemos saber os números de chegada em Agosto de 2016, o que em todo o caso é demasiado cedo.

Por isso, em vez de exercícios de relações públicas sem qualquer suporte técnico, era melhor termos números sérios e correctos. Neste momento, o que se sabe sobre a Sonangol é que chegou a uma situação de falência técnica, acrescida de uma situação de opacidade contabilística. Tudo o resto é conversa fiada, seja em inglês ou em quimbundo.

Sabe-se também que o famoso negócio Cobalt foi rescindido, e em Agosto último analistas norte-americanos escreviam que as acções da Cobalt Energia (CIE) estavam em queda dado que a empresa não conseguira aprovação para vender dois blocos de petróleo em Angola. Em Agosto de 2015, a Cobalt, com sede em Houston, EUA, anunciou que iria vender à Sonangol a sua participação de 40% nos campos offshore angolanos. A parte da Cobalt valeria US $ 1,75 biliões, de acordo com o registo na Comissão de Valores Mobiliários norte-americana (SEC). Simplesmente, não tendo dinheiro, a Sonangol cancelou o contrato.

Também é público, e foi noticiado pelo Maka Angola, que a empresa está com dificuldades de crédito nos mercados financeiros internacionais.

Mas o problema não se resolve usando uma agência de comunicação para encher o espaço noticioso com excelentes e grandiosas notícias, que acabam por perder toda a credibilidade por falta de qualquer sustentação realista. Quanto maior o “buraco”, mais as “boas notícias”, até tudo rebentar.

Para se perceber se os custos operacionais teriam descido, seria necessário proceder à sua desagregação, identificar os seus componentes e depois apresentar os números anteriores e os da actualidade. Só assim poderia verificar-se se houve ou não alguma descida de custos. Para baixar os custos, existem algumas vias. Uma será óbvia, e consiste na diminuição das margens de intermediação e na extinção dos comissionistas; outra é a introdução de nova tecnologia mais barata, que apenas terá resultados a médio prazo; outra ainda é a extinção de postos de trabalho. Admite-se que tenham sido efectuados alguns cortes de comissões e afins. Mas não se pode afirmar tal sem números desagregados e analisados.

Até lá, estamos no meio de uma peça de teatro rocambolesco. Não se desce preços por magia. Só na ficção dramática ou de outra espécie. 
Título, Imagem e Texto: Rui Verde, Maka Angola, 16-9-2016

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