João Pereira Coutinho
O PAPA VEM A FÁTIMA e a festa já começou: falo de um certo ódio
antirreligioso que se multiplica em artigos de jornal, entrevistas,
reportagens, até livros inteiros. Com um zelo que nem o mais crente dos crentes
consegue imitar, lá temos as acusações de “falsificação”, “construção
histórica”, “negócio” e sei lá que mais.
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Foto: Francisco Aragão |
Estes eflúvios sempre me
provocaram o maior espanto. Como é possível um ódio tão profundo por algo em
que não se acredita? Não seria o desinteresse a atitude mais aconselhável – e,
no fundo, mais racional?
Dou um exemplo: o Verão
aproxima-se. E, com ele, aproximam-se dezenas de festivais que prometem
congregar milhares de fãs em torno de um ídolo qualquer. Pessoalmente, nem
morto me enfiariam nesses recintos. Mas nunca me passaria pela cabeça dedicar
horas, dias, meses de vida a denunciar, oralmente ou por escrito, a natureza
ruidosa, alienante, anti-higiênica ou simplesmente imbecil desses convênios.
Exceto, claro, se me obrigassem a lá ir, a respirar o mesmo ar, a contrair as
mesmas doenças – e a abanar a cabeça com a mesma ferocidade. A intolerância só
é compreensível em legítima defesa.
O mesmo devia valer para a
intolerância antirreligiosa: ninguém obriga ninguém a ir a Fátima. Mais:
ninguém obriga ninguém a acreditar no que quer que seja. E, no entanto, o
fanatismo do tempo age como se a Igreja Católica tivesse absoluto domínio sobre
os seus corpos e almas. Isto explica-se? Naturalmente, sim. E explica-se com a
própria essência do fanatismo.
Para um fanático, não basta
que o mundo, a começar pelo religioso, o deixe em paz. De Ricardo III (o
ficcional) a Adolf Hitler (o real), existe na paz – na ideia simples de que é
preciso viver e deixar viver – um estranho sabor a derrota.
O fanático precisa de guerra.
Porque o fanático gosta de punir a realidade quando essa realidade não é uma
cópia fiel da sua virtuosa cabeça.
Título e Texto: João Pereira Coutinho, Sábado, 5-5-2017
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