domingo, 28 de maio de 2017

Surpresas

Vasco Pulido Valente

Manuela Ferreira Leite e o nosso muito querido Marcelo, como toda a gente, não veem obstáculos à próxima regeneração da Pátria, a não ser que venha por aí uma grande surpresa. Com certeza não repararam ainda na existência e no carácter político do Presidente Trump.

Trump, para o público bem-pensante, não passa de um objeto de ódio. Mas sucede que ele é também, e com mais consequência, o representante do isolacionismo que, depois de quase oitenta anos, voltou a dominar a América. Como a Inglaterra, no fim do século XIX, princípio do século XX, a América acabou por se cansar do papel de polícia do mundo, que de facto carrega desde 1941.


Ainda com tropas em dezessete países, está farta de guerras e de gastar dinheiro com elas. O que Trump disse em Bruxelas na inauguração do edifício da NATO (que custou mais de mil milhões) é uma clara afirmação disso mesmo. Com a sua costumada brutalidade, o homem avisou a União Europeia que tinha de pagar a sua parte na defesa comum, que vinte e três dos seus vinte e oito membros não pagam, e as dívidas acumuladas no passado recente, que, segundo parece, são enormes.

E para esclarecer melhor onde queria chegar não invocou, como era tradicional, o artigo 5 do tratado da Aliança Atlântica, pelo qual a América estende a sua proteção à Europa dita Ocidental. Os senhores da UE, que se fundou e cresceu ao abrigo desse guarda-chuva, não ficaram contentes. Para começar, irão ter de investir dois por cento do PIB em armamento e, a prazo, sobre eles paira a ameaça, que Trump deixou implícita, da completa anulação das responsabilidades americanas nos assuntos da UE, que ele considera irresponsável e parasitária.

A referência ao expansionismo de Putin como que dava a entender que a Europa devia tratar dele sozinha; enquanto a América trataria do equilíbrio entre as grandes potências. Ora, se assim for, a Europa, que não é manifestamente uma grande potência, cai de novo no seu antigo problema: como evitar a hegemonia alemã? Ou mesmo, a leste, a hegemonia russa?

Mais do que isto, que não é pouco, os murmúrios sobre os “excedentes” da Alemanha e a inquietação sobre a política comercial de Trump – outro sintoma do isolacionismo – provocaram uma imprevisibilidade universal pouco favorável ao investimento. Só os mestres do optimismo português andam descansados.
Título e Texto: Vasco Pulido Valente, Observador, 28-5-2017

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