Alberto Gonçalves
É injusto generalizar? Com certeza. Mas a
aversão a generalizações, ou o respeito trémulo pelo islão, não tem corrido
bem. Quando o resultado da reverência é este, talvez valha a pena tentar a
afronta
Salvador Sobral, o Homem que
Salvou a Música, gostaria que não se noticiassem os atentados terroristas. É
uma ideia partilhada por muita gente, aquele tipo de gente que, horas antes do
atentado de Manchester, marchara em Lisboa e no Porto contra a “cultura de
violação”. Ao saber da marcha, que integrou 40 associações e quase tantas
outras pessoas, julguei tratar-se de uma denúncia pública, e inédita por cá, da
barbárie a que o islão submete as mulheres. Erro meu. Afinal, a coisa fora
motivada por uma cretinice a cargo de uns burgueses na Queima das Fitas. Pelos
vistos, meia dúzia de burgueses provam que uma sociedade é, toda ela, propensa
a abusar de raparigas em autocarros, mas milhões de mutilações genitais,
casamentos forçados, apedrejamentos e o genérico desprezo pela humanidade pouco
dizem acerca da realidade islâmica. E as matanças cometidas em nome do profeta
ainda dizem menos.
De resto, os desejos de
Salvador Sobral já estiveram mais longe da realização. Chacina após chacina, as
reações, sentidas ou simuladas, perdem intensidade, e são escassos os “Je
Suis…” a enfeitarem páginas do Facebook. Não tardará o dia em que vinte ou
trinta criaturas mortas por bomba ou camião desçam às manchetes pequeninas ou
sejam embutidas no meio do “telejornal”. E, conforme acontece hoje com
episódios “menores” (uma degolaçãozita ou assim), chegará o momento em que o
horror não mereça uma linha ou comentário.
É verdade que, face às linhas
e comentários que temos, se calhar o silêncio absoluto seria de facto
preferível. Aparentemente, não bastam os “jornalistas” que chamam “incidentes”
a explosões criminosas. Esta semana, com o regresso do terrorismo em grande
escala, regressaram às televisões resmas de indivíduos especializados em
comentar o assunto fugindo do assunto a sete pés. Se a primeira rajada de
argumentos delirantes se esgota, o que raramente sucede, e os especialistas não
conseguem remover o assassino do islão, adoptam com agilidade o Plano B, que
consiste em remover o islão do assassino. O essencial, além de não mostrarmos
medo (do ridículo, presume-se), é perceber que não se pode confundir os
muçulmanos com o terror, embora os comentadores se vejam regularmente
desmentidos pela impressionante quantidade de muçulmanos que insiste em
confundir-se com o terror e pela quantidade maior que, não praticando o terror,
legitima-o pela aprovação tácita ou, no mínimo, pela indiferença. O espetáculo
não é desprovido de piada. Porém, o sangue real que procuram esconder sob abstrações
modera um bocadinho a vontade de rir.
O método não se distingue do
utilizado pelo conhecido Sheik Munir. Instado a explicar Manchester, o homem
cujo cavalheirismo nunca inspirou marcha alguma, optou por ignorar as vítimas,
reduzir o autor ao maluquinho do costume e, sobretudo, exigir “respeito” pelo
islão (Paulo Tunhas dissecou aqui o estilo). Nem de propósito, respeito é justamente
aquilo que, da parte do Ocidente, o islão tem tido de sobra – no sentido
literal da palavra. A cada novo atentado, dedicam-se desmedidos louvores à
“religião de paz”, os quais curiosamente não impedem o atentado seguinte. Nos
intervalos, exerce-se rigorosa cautela para não beliscar a vasta
susceptibilidade da crença e, de brinde, oferece-se abrigo aos seus desvalidos.
Salvador Sobral, através de t-shirt, foi apenas um dos que convidaram os
refugiados para sua casa. Não que os refugiados careçam de convite: dois deles
vieram da Líbia para a Inglaterra, lá criaram os filhos e, ao que consta,
ajudaram um deles a arruinar as vidas de dezenas de inocentes.
É injusto generalizar? Com
certeza. Porém, a aversão a generalizações, ou o tal respeito trémulo pelo
islão, não tem corrido bem. Quando o resultado da reverência é este, talvez
valesse a pena tentar a desconsideração e a afronta. Não temos nada a perder,
principalmente se a alternativa é perder tudo.
Nota de rodapé
Madonna andou por Lisboa e não
foi recebida pelo presidente da câmara: o sujeito, que sinceramente desconheço,
visitou-a no hotel e, à saída, declarou que o hipotético interesse da
cançonetista por uma casa em Sintra é – acreditem – “importante para o país”.
Mas a coisa, já de si extraordinária, não ficou por aqui. Parece que o ministro
da Cultura, que também não sei quem é, requisitou o fecho do Mosteiro dos
Jerónimos para que a senhora e os filhos o visitassem, cito um jornal, “sem
qualquer incómodo” e sob a orientação especializada da própria diretora do
monumento. Consta igualmente que Madonna assistiu a uma exibição de cavalos
lusitanos, preparada de propósito para a ocasião. E há boatos de que a
intérprete de “La Isla Bonita” se terá encontrado com o dr. Costa, em
circunstâncias por esclarecer.
Perante isto, a tendência da
tradicional má-língua é resmungar contra os privilégios das celebridades, o
provincianismo das “elites” (perdão) e uma nação que, pelo menos nas instâncias
“oficiais”, atingiu níveis de demência pouco explorados. Infelizmente, a
má-língua deixa-se dominar pela inveja e, à semelhança dos que não compreendem
as motivações dos “jihadistas”, não consegue colocar-se no lugar do “outro”.
O erro é partir do princípio
de que a hospitalidade em causa é uma regalia desejável. Não é. E quem presume
o inverso deveria imaginar o que sentiria se, em viagem a uma cidade
estrangeira, fosse constantemente importunado por criaturas rústicas e
irrelevantes, se visse condicionado a levar crianças a um claustro, tivesse de
contemplar uma prova de hipismo e, ao que li algures, aturasse um
ex-futebolista do Benfica ao jantar. O único fogacho de sorte de Madonna
consistiu em ter escapado miraculosamente ao prof. Marcelo e às divagações em
torno de Craveiro Lopes. Mesmo assim, haverá gente a passar férias mais
agradáveis no Cazaquistão.
Nada disto é por acaso. Mal se
percebeu que o turismo sustenta, quase sozinho, a nossa patética economia, os
ponderados indivíduos no poder tomaram de imediato a atitude que se impunha:
acabar com ele. Depois de um período dedicado a combater as companhias
“low-cost”, a condenar a evolução das cidades e a introduzir taxinhas para
financiar o regresso a 1970, o PS lembrou-se há dias de impor a autorização dos
condomínios para arrendamentos de curta duração. Na prática, isto visa enxotar
metade dos turistas. A metade restante enxota-se mediante a sujeição dos
desgraçados a suplícios como o de Madonna. E se ainda resistirem um ou dois
incautos, é então que aparece o prof. Marcelo, a propor “selfies” e a resolver
o problema de vez.
Título e Texto: Alberto Gonçalves, Observador,
27-5-2017
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