Rui Verde
A ostentação desavergonhada
dos filhos do presidente José Eduardo dos Santos não tem limites. Nem mesmo a
gravidade do estado de saúde do pai afeta a vocação perdulária e exibicionista
dos filhos. Em Cannes, o caçula Danilo, sem qualquer sentido da realidade ou de
decoro, licitou um relógio pelo valor de 500 mil euros (559 mil dólares).
O ator Will Smith, que
apresentava a gala, não se conteve, comentando que o rapaz era demasiado novo
para ter aquele dinheiro todo. E o mesmo comentamos nós.
Enquanto isso, em Angola a
vida continua, mas não para todos. A morte teima em matar cedo e em levar mais
crianças do que noutro país qualquer.
De há alguns tempos a esta
parte, os sumptuosos desfiles de Cannes têm exibido umas quantas personagens
adicionais: os filhos milionários do presidente de Angola. Para o estrangeiro
incauto que se deixe maravilhar ante o glamour na passerelle,
estes filhos pródigos que se encontram entre as pessoas mais ricas de África
pertencem, na realidade, ao país que alberga uma das populações mais pobres do
mundo.
No ano passado, Isabel dos
Santos passeou-se em Cannes na companhia de estrelas dos reality shows:
nessa altura, vimo-la com Kris Jenner, que é mãe de uma pessoa chamada Kim
Kardashian, que se bem se percebe é famosa pelo… seu traseiro.
Este ano, a mesma Isabel apresentou-se
esplendorosamente grávida numa festa da sua companhia de joias De Grisogono.
Longe pareciam estar as agruras geradas pelas “notícias falsas” sobre a morte
iminente do pai.
Mas o deslumbramento decadente
de Isabel foi superado pelo do seu jovem irmão Danilo, que irrompeu em Cannes à
boa maneira do seu compadre Teodorin Obiang, filho do ditador da aliada Guiné
Equatorial.
Como é já do conhecimento
público, Danilo comprou num leilão de beneficência um relógio por 500 mil euros,
valor que alegadamente se destina a uma Fundação chamada amFAR.
Esta Fundação é uma
organização não-governamental destinada ao combate à SIDA, foi criada, entre
outros, pela atriz norte-americana Elizabeth Taylor e é hoje mundialmente
presidida pela famosa Sharon Stone. É uma instituição com a chancela
norte-americana e de Hollywood. A sua sede é em Nova Iorque. A fundação afirma
que segue rigorosos padrões de governação e responsabilidade financeira
exigidos no “Wise Giving Alliance of the Better Business Bureau”, bem como os
requisitos fiscais para a participação na “Combined Federal Campaign.” Este
rigor explica a “piada” do ator Will Smith, que, enquanto apresentava a Gala em
que o jovem Danilo se exibiu, comentou que este era demasiado novo para ter
tanto dinheiro.
É forçoso que a Fundação
inquira acerca da origem do dinheiro de Danilo, jovem estudante em Inglaterra,
sem negócios conhecidos do público. Caso não exerça esse tipo de escrutínio,
incorre no risco de tornar-se instrumento de eventuais lavagens de dinheiro.
A mãe de Danilo, Ana Paula dos
Santos, criou e preside à Fundação Lwini, destinada a angariar fundos –
sobretudo junto de multinacionais estrangeiras – e a empreender ações de apoio
às vítimas civis de minas terrestres principalmente mulheres e crianças. É difícil
imaginar que Ana Paula dos Santos angarie fundos de um lado e veja o seu filho
a esbanjar no outro. Talvez preferisse que os 500 mil tivessem sido gastos com
as mulheres e crianças de Angola, e não em farras na Europa.
Ainda agora, a TPA (televisão
do regime angolano) noticiou que não existe material descartável no Hospital
Pediátrico de Luanda David Bernardino. Faltam seringas, soro, luvas,
medicamentos. As crianças esperam quatro dias para ser atendidas. Bem fazia
Danilo em doar os 500 mil euros ao hospital.
Danilo demonstra de forma
exemplar que a falta de virtude mata qualquer pretensão de seriedade por parte
do regime de José Eduardo dos Santos.
A compra de um relógio por 500
mil euros numa festa em Cannes coloca em questão o próprio regime: não consegue
tratar das crianças do Hospital Pediátrico de Luanda, mas consegue dar 500 mil euros
à criança do Presidente para comprar um relógio azul.
Não falemos sequer de
corrupção ou da origem duvidosa do dinheiro de Danilo. Falemos simplesmente da
falta de senso, de virtude, de discernimento, da humilhação que este tipo de
comportamentos representa para o povo angolano.
Danilo demonstra-o de modo
cristalino: os filhos do presidente já não enxergam o mundo em que vivem. Estão
envoltos por uma bolha de falsa sofisticação que os faz voar de Londres para
Cannes sem perceberem nada.
Já vimos este filme noutras
ocasiões. É o filme que teve como atores os filhos de Kadhafi, o filho de
Obiang, os filhos do Mubarak, para não recuarmos aos tempos clássicos e aos
calígulas que por lá andaram.
Uma só palavra resume o
sentimento: Basta!
Título, Imagem e Texto: Rui Verde, Maka Angola, 26-5-2017
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