quinta-feira, 10 de novembro de 2011

Uma revolução contra a crise varreria, em primeiro lugar, muitos dos atuais pseudo-revolucionários

A "Tomada da Bastilha", no centro se vê a prisão de Jourdan de René de Bernard, marquês de Laundry (1740-1789). 
Quadro de Houël,Jean-Pierre-Louis-Laurent (1735-1813)

Nuno Rogeiro
Tem-se falado, nalguns meios selectos de Lisboa a Atenas, de uma saída da crise: a revolução. A revolução assistida por magmas de civis, e a revolução conduzida por majores, ou, mais picarescamente, generais.
Faz isto ainda sentido? Uma primeira nota diz-nos que uma verdadeira revolução em Portugal se faria contra todos os que, desde a última, construíram o Estado, o regime político e o sistema de governo. Contra o "capitalismo", que lucrou pecaminosamente, mas também contra o "socialismo" e o "comunismo", cujos delírios, desastres e falhanços nos levaram, em linha recta, às mãos extremosas dos banqueiros.
Um "levantamento popular" colocaria na fila para o cadafalso (em sentido figurado, espera-se) o CDS e o MFA, o PCP e o PSD, o PS e os restos da Junta de Salvação Nacional, o Conselho da Revolução e muitos Conselhos de Administração.
Os que julgam agitar as massas, pedindo revolta contra o "terrorismo do Estado", são selectivos na indignação. Condenam as "mentiras" do actual PM, mas silenciam as fábulas felizes que foram sendo servidas ao povo, nas últimas décadas. Escandalizam-se com os cortes de subsídio dos funcionários, mas nunca expuseram o caso dos que, desde 1974, são aposentados, reformados, subvencionados ou beneficiários da política.
Os "revolucionários" parciais que por aí se vêem precisam de explicar quando é que se indignaram com o pagamento de reformas vitalícias a (todos) os ex-políticos. E deviam explicar se pertencem ou pertenceram às mesmas categorias de subvencionados. E mais precisavam de explicar se pertencem ou pertenceram a organizações que sobrevivem com dotações do Estado.
A ruptura não é brincadeira. Sá Carneiro disse um dia, respondendo às tiradas de um pretoriano de gabinete, que não tinha medo das revoluções feitas com secretárias. Ou à secretária.
É evidente que, além de exilados, clandestinos e de resistentes, muitas revoluções foram feitas por f(r)acções, descontentes ou agravadas, do antigo pessoal dirigente. Veja-se o caso de forças armadas e de polícia, amotinadas, que passam de instrumentos repressivos dos regimes para instrumentos repressivos contra os mesmos. Mas trata-se de transição. Se as revoltas não são meros enredos palacianos, ou danças de cadeiras, os equilibristas acabam sempre por ser desmascarados.
Por outro lado, é certo que os relógios andam para trás. Os que acham que não há revoluções nem golpes de Estado possíveis, num clube de cavalheiros como a União Europeia, esquecem-se que, olhando só para os países do Sul (Portugal, Itália, Espanha e Grécia), eles já foram repúblicas ou monarquias parlamentares, e tornaram-se depois ditaduras militares, ou regimes de partido único.
Para que o relógio volte atrás, claro, é preciso um conjunto de circunstâncias. A crise social e a miséria económica são duas delas.
Por outras palavras: a revolta é real, a revolução não é improvável e o golpe de Estado não é impossível.
Mas a mudança que aí vier não é a que alguns pensam. E sobretudo não será o que alguns desejam.
Título e Texto: Nuno Rogeiro, revista Sábado, nº 392, 03 a 09-11-2011

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Não publicamos comentários de anônimos/desconhecidos.

Por favor, se optar por "Anônimo", escreva o seu nome no final do comentário.

Não use CAIXA ALTA, (Não grite!), isto é, não escreva tudo em maiúsculas, escreva normalmente. Obrigado pela sua participação!
Volte sempre!
Abraços./-