Ricardo Noblat
Quanto mais mentem à vontade e
sem constrangimento os cínicos que nos governam ou representam, pior é a
qualidade de suas mentiras.
De fato, a perda de qualidade
tem tudo a ver com o grau de nossa indignação diante do que Dilma chama de
malfeitos.
Se nos indignamos pouco ou
quase nada para que sofisticar as mentiras e torná-las verossímeis?
A mais recente e reles mentira
oferecida ao nosso exame foi publicada na última edição da VEJA. O mecânico
Irmar Silva Batista, filiado ao PT há 20 anos, tentou criar o Sindicato dos
Trabalhadores nas Indústrias de Reparação de Veículos e Acessórios no Estado de
São Paulo.
Em 2008, ele bateu à porta do
Ministério do Trabalho para tratar do assunto com o então secretário de
Relações do Trabalho, o ex-deputado Luiz Antonio de Medeiros.
O ministro já era Carlos Lupi,
presidente do PDT. Medeiros encaminhou Irmar a Eudes Carneiro, assessor de
Lupi.
Eudes trancou-se com Irmar em
uma sala. Primeiro, pediu-lhe que desligasse o telefone celular. Em seguida
cobrou R$ 1 milhão para liberar o registro do sindicato.
Irmar denunciou o caso a
parlamentares do PT – entre eles, o senador Eduardo Suplicy.
Sem sucesso. Então escreveu
uma carta a Lula. Sem resposta.
Um mês depois da posse de
Dilma, Irmar enviou-lhe uma carta por e-mail contando em detalhes tudo o que se
passara. Mandou cópia para Gilberto Carvalho, secretário-geral da presidência.
No dia 9 de março último, o
Palácio do Planalto confirmou o recebimento da carta.
Na semana passada, a
assessoria de imprensa da presidência informou que nenhuma providência a
respeito pode ser tomada porque o trecho da carta que narrava a patifaria
acabara cortado da mensagem.
Não é espantoso? Sumiu da
carta justamente o trecho onde Irmar denunciava o grupo que agia no Ministério
do Trabalho pedindo dinheiro para liberar registro sindical.
Mas sumiu como? Não se sabe.
Assim como ainda não se sabe se a carta para Gilberto apresentou a mesma falha.
Vai ver o trecho mais
explosivo dele chegou truncado aos seus destinatários. Vai ver quem digitou o
e-mail pulou o trecho. Custava a quem o recebeu alertar seu autor que ficara
faltando um trecho? Assim a carta poderia ter sido reenviada.
Bons tempos aqueles onde um
dossiê da Casa Civil sobre despesas sigilosas do governo Fernando Henrique foi
batizado por Dilma de banco de dados. Fazia até algum sentido – embora fosse
mentira.
E o mensalão que Lula se
empenhou para que fosse confundido com Caixa 2?
Mensalão é crime. Caixa 2
também é. Mas Caixa 2 soa como um crime leve, quase inocente.
O que alimentou o mensalão foi
dinheiro desviado de órgãos públicos. Se preferir, “recursos não
contabilizados”, como observou com deslavada hipocrisia o ex-tesoureiro do PT,
Delúbio Soares.
Montagem de falso papelório
político para uso contra adversários é coisa de bandido nos lugares onde as
palavras correspondem ao seu verdadeiro significado.
Aqui foi coisa de “aloprado” –
um sujeito que age por conta própria para ajudar a se reeleger quem repele
ajuda desse tipo.
Sobreviveu ao governo anterior
e atravessará o atual uma das mais perigosas mentiras jamais produzidas. Atende
pelo nome de “controle social da mídia”.
Seria mais adequado referir-se
a ela como “censura”. Diz-se que o controle se fará sem interferir no conteúdo.
Quem acredita?
A mãe de todas as mentiras é
também a mais perversa. Ela atribui a bandalheira à governabilidade.
Como para governar é preciso
contar com maioria de votos no Congresso ou nas Assembléias, os partidos
abiscoitam cargos e fazem com eles o que bem entendem. De preferência, roubam.
A bandalheira não decorre da
necessidade de contar com o apoio de partidos. Decorre da falta de princípios e
de coragem do governante para valer-se da força do mandato obtido mediante o
voto popular.
Afinal, para que servem os
milhões de votos que elegem um presidente ou governador?
Título, Imagem e Texto:
Ricardo Noblat, 28-11-2011
Colaboração: Rogerio Cunha
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