Maka Angola
A Polícia Nacional e a
administração municipal do Cuango procederam, no sábado à tarde, à entrega de
um saco de arroz e de um saco de fuba de milho à família do malogrado Pimbi Txifutxi, morto a tiro por um agente da Polícia Nacional durante a
marcha do Movimento do Protectorado Lunda-Tchokwé, no Cuango.
“Fomos ao comandante da
Polícia Nacional (superintendente Caetano Bravo dos Santos[foto]) e a administradora
municipal [Angélica Umba Chassango] estava presente. Ambos nos disseram que vão
assumir o óbito”, afirma Raimundo Pimbi, irmão da vítima. “Vão dar o caixão e
deram um saco de arroz, um saco de fuba de milho, cinco litros de óleo e cinco
quilos de açúcar.”
De acordo com Raimundo Pimbi,
que liderou a sua família no encontro com as autoridades, no Comando Municipal
da Polícia Nacional, “primeiro, o comandante queria negar a responsabilidade da
polícia pelo crime. Disse que deu senha branca para a paz e não vermelha para
matar. Segundo o comandante, se o polícia matou, a responsabilidade não é do
MPLA, mas do indivíduo. É ele que tem de assumir.”
O irmão da vítima refere ainda
que “a administradora Angélica Umba Chassango disse apenas ‘vamos assumir a
responsabilidade de dar comida e caixão, o resto vamos conversar depois’”.
“Não falaram de prisão, de
fazer justiça, nada! O matador está livre, circula à vontade no Cuango.”
Raimundo Pimbi manifesta, naturalmente, a indignação de toda a sua família.
“É hábito aqui os polícias
matarem e não acontecer nada. Aqui a pessoa é tipo capim ou animal. Pode-se
matar à vontade”, lamenta. “Nós [a família] queremos que a polícia assuma a
responsabilidade pelo crime. O falecido deixou oito filhos e não temos como
assumir essa responsabilidade.”
Raimundo Pimbi conta,
corroborado por vários entrevistados no Cuango, que no dia anterior, o agente
João Mazango “avisou publicamente que no dia da manifestação mataria alguém”.
João Mazango é guarda-costas de Joaquim Tchilóia, chefe de operações do Comando
Municipal do Cuango e comandante da 1.ª Esquadra do Cuango.
“Amanhã [hoje] vamos enterrar.
Ele [agente suspeito] tem de assumir a responsabilidade. Ele matou de
propósito. O rapaz não estava na marcha. O tipo tinha rancor do rapaz. O
comandante dele não fez nada”, reclama Raimundo Pimbi.
Várias testemunhas confirmam
que Pimbi Txifutxi se dirigia para a cantina do irmão Domingos Txifutxi, onde
trabalhava, quando foi alvejado no abdómen. Ou seja, estava a ir trabalhar,
enquanto o irmão Domingos se preparava para assistir, com uma grande caravana,
ao comício do MPLA no município de Capenda-Camulemba.
Maka Angola tentou, sem sucesso, contactar o comandante municipal da Polícia Nacional no Cuango, bem como a administradora municipal. Não retornaram as chamadas.
Maka Angola tentou, sem sucesso, contactar o comandante municipal da Polícia Nacional no Cuango, bem como a administradora municipal. Não retornaram as chamadas.
O menino alvejado pela PIR
Por sua vez, Esperança Silva
Paulo, irmã do menor Nelito Silva Paulo, de 12 anos, também alvejado por um
efectivo da Polícia de Intervenção Rápida no dia da manifestação, esclarece o
que realmente se passou.
“O meu irmão dirigia-se à
escola primária Hoji Ya Henda, onde estuda, porque era dia de limpeza e quem
não aparece leva falta”, conta. “Os PIR estavam a fazer muita confusão e viram
um grupo de jovens a conversar e a rir. Os PIR acharam que os jovens se estavam
a rir deles e começaram a disparar. Atingiram o Nelito, que estava de
passagem.”
Nelito Silva Paulo revela ao Maka
Angola que os agentes da PIR o ignoraram depois de o alvejarem. “O
braço está a doer muito. Os polícias dispararam e foram embora. Abandonaram-me
ali.”
A família levou de imediato o
rapaz para o Hospital Central do Cuango, “mas os médicos recusaram-se a
tratá-lo e disseram também que o hospital não tinha medicamentos”, denuncia a
irmã. “Levámos o miúdo a um posto médico, mas também se recusaram a tratá-lo
porque, como nos disseram, primeiro tínhamos de levá-lo ao Comando Municipal da
Polícia para autorizarem o tratamento. Quando lá chegámos, ameaçaram-nos com
armas, que nos dariam tiros. A polícia dizia que o miúdo tinha sido atingido por
uma pedra. Depois veio o oficial, que o viu, disse que era tiro e levou-nos ao
Hospital Central para ele ser tratado”, continua.
Segundo Esperança Silva Paulo,
no referido hospital, o oficial de dia, cujo nome desconhece, perguntou aos
médicos por que razão se tinham recusado a prestar assistência a um menor.
Responderam que nada podiam fazer sem medicamentos. “O médico passou logo uma
receita para eu ir comprar injecções [seringas e ampolas] na rua, para que eles
pudessem tratar o miúdo. Foi o que fiz.”
Quando o pai da criança, o
soba Mwatchissata, soube do acontecimento, como já reportámos, dirigiu-se ao
comando municipal para reclamar e foi brutalmente espancado com coronhadas de
Kalashnikov e pontapés.
“Os comandantes estavam mesmo
ali dentro. Eles deram a ordem para baterem no soba, que estava vestido com a
sua farda de autoridade tradicional. Primeiro, deram-lhe uma bofetada tão
violenta que ele caiu logo no chão, e ali começaram a espancá-lo”, denuncia a
filha.
Esperança Silva Paulo explica,
com pesar, que o soba “é do MPLA, partido no poder, e tratam-no assim”.
Mas os desmandos da PIR não
terminam com o tiro contra Nelito Silva Paulo:
“Os mesmos polícias deram mais
um tiro nas pernas de uma senhora, residente no bairro Sanguenzo, que ia à
lavra. Eles estavam a avisar a população para ninguém circular porque havia
estado de sítio, por causa da manifestação”, prossegue Esperança Silva Paulo.
A cidadã vai mais longe e
denuncia ainda que outro grupo da PIR intoxicou, com gás lacrimogéneo, vários
garimpeiros que se encontravam de passagem e tentaram prestar os primeiros
socorros ao malogrado Txifutxi. “Vários ficaram estendidos onde foram atacados
e as pessoas estavam a tentar socorrê-los, atirando-lhes água. Um dos
garimpeiros apanhou tantas cacetadas, que lhe rebentaram a testa e foi parar ao
hospital, sangrava muito.”
“A esposa do garimpeiro estava
lá comigo no hospital. Os médicos obrigaram-na a comprar também os medicamentos
na rua para que o marido fosse atendido.”
Detidos e libertados
As manifestações que tiveram
lugar no município do Cuango, na vila do Luzamba e em Cafunfo, resultaram na
detenção de 56 cidadãos na primeira localidade e outros 16 na segunda.
No Cuango, as FAA auxiliam na repressão de manifestações. |
O activista André Candala, da
Comissão de Justiça e Paz em Cafunfo, confirma “a libertação de três sobas
inocentes [Candongo, Muamuxico e um terceiro] que estavam de passagem e se
cruzaram com os manifestantes na altura das detenções efectuadas por soldados
das Forças Armadas Angolanas (FAA)”.
“A repressão envolveu a
Polícia de Intervenção Rápida, a polícia regular, as FAA e a Polícia de Guarda
Fronteira. Chegámos a pensar que a guerra tinha reiniciado, com o tiroteio de
meia hora que esses homens travaram aqui em Cafunfo”, conta.
André Candala informa que
foram identificados mais cinco cidadãos feridos pelos disparos durante o
tiroteio. “No bairro A Luta Continua, o Joaquim apanhou um tiro no braço
esquerdo, a Joaquina na perna direita. Os outros três, alvejados nas pernas,
são do bairro da Elevação. Os homens que foram detidos foram muito bem
torturados, logo a partir do local de detenção.”
Título, Imagens e Texto: Maka Angola, 26-6-2017
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