O anonimato foi justificado com o
imperativo de “proteger a segurança” do membro da resistência infiltrado na
White House. É um escândalo e uma vergonha.
João Lemos Esteves
1. Escrevemos no nosso último texto aqui no SOL que a histeria
anti-Donald Trump prosseguia, alimentada pelo desejo de vingança dos média que
foram derrotados nas eleições de 2016. No entanto, esta semana o facciosismo
dos órgãos de comunicação social (hoje assumidamente da esquerda e da
extrema-esquerda norte-americana) ultrapassou a linha do democraticamente
admissível: o “The New York Times” escreveu porventura a linha mais negra da
história do jornalismo internacional desde, pelo menos, a ascensão do nazismo e
do comunismo soviético (sim, porque – é uma história por contar! – muita comunicação
social ajudou a promover a ascensão de Hitler e, ainda mais, contribuiu para a
execução do terrorismo bárbaro comunista-soviético e respectivo branqueamento
subsequente).
2. Em que termos? Pois bem, o outrora jornal de referência “The New
York Times”, que, nos seus tempos áureos em que se dedicava ao jornalismo
publicou alguns dos trabalhos mais conceituados da imprensa livre e
democrática, decidiu violar as mais elementares regras éticas, deontológicas e
até legais que disciplinam a comunicação social – publicou um editorial (um
“op-ed”) anônimo, alegadamente escrito por um membro da Administração Trump.
O anonimato foi justificado
com o imperativo de “proteger a segurança” do membro da resistência infiltrado
na White House. É um escândalo e uma vergonha.
3. Um escândalo, porque significa que o jornalismo está
definitivamente morto – a partir do momento em que um jornal publica, no seu
espaço mais relevante, um texto anônimo, com claros e inequívocos propósitos
político partidários, cria-se o precedente para legitimar qualquer abuso por
parte da comunicação social. E deixemo-nos de rodeios: a comunicação social,
nos tempos hodiernos, não é um contrapoder; é um verdadeiro poder (o poder
mediático). Ora, o poder mediático torna-se, destarte, no único poder
absolutamente ilimitado: pode inventar o que quiser, pode escrever o que bem
lhe aprouver, pode inspirar manobras de bastidores políticas para
desestabilizar os governantes democraticamente eleitos – sem que haja um
escrutínio, efetivo e consequente, por parte de outros poderes estaduais e
mesmo da opinião pública (que ainda confia na “autorictas”, na veracidade do
que vem publicado nos média tradicionais).
Para nós, a imprensa livre é
um dado civilizacional fundamental – democracia sem uma imprensa livre não
passa de uma mera aspiração lírica. No entanto, liberdade não significa
impunidade; há valores éticos, comunitários e legais que limitam o direito
geral de ação. Pensemos, no caso, de um cidadão que pratica um crime; ele
deverá ser responsabilizado pelo fato que cometeu, não obstante reconhecer-lhe
(e à sociedade no seu todo) um direito
geral de liberdade. A aplicação de uma sanção criminal – por violação de regras
legais – não significa que a sociedade deixou de ser livre; pelo contrário,
trata-se da defesa de valores que a comunidade considera essenciais.
Pois bem, as regras éticas e
legais ditam que os jornais não podem publicar artigos anônimos, em nome da
verdade, da honestidade e da transparência democrática. Nem se diga que o imperativo
de proteção da alegada “fonte” justifica a solução do anonimato – se assim
fosse, estaria aberta a porta para os média publicarem absolutamente tudo sobre
todos, independentemente da veracidade e da credibilidade das informações
veiculadas.
Por outro lado, seria uma
forma de os grupos de comunicação social beneficiarem de um regime amplíssimo
de impunidade, sem paralelo com qualquer outro setor da sociedade. Mais: o “The
New YorK Times”, há poucos meses, publicou um artigo culpando a cobardia do
anonimato difundido nas redes sociais e nas caixas de comentários de jornais
pela crise do regime democrático. Os jornais portugueses (na sua maioria)
copiaram – claro! – a moda, decidindo, inclusivamente, suprimir a caixa de
comentários nos respectivos sites: a democracia portuguesa estaria também a ser
ameaçada pelo espectro da cobardia do anonimato.
Pois bem, demonstrando mais
uma vez a hipocrisia de certa esquerda, o “The New York Times” resolveu – algo
tragicamente inédito, reiteramos – publicar um artigo… anônimo, dando,
portanto, razão ao Presidente Donald Trump. É uma ironia, mas é uma conclusão
lógica. Por quê? Vejamos.
Ora, se, como era a tese do
próprio jornal nova-iorquino, o anonimato mata a democracia (premissa maior); o
“The New York Times” publicou um texto anônimo (premissa menor); logo, o “The
New York Times” mata (ou, pelo menos, provoca danos) a democracia. É uma
consequência lógica da tese do próprio jornal. A incoerência de alguns média
norte-americanos, dominados por uma nova corrente de extrema-esquerda que tenta
conquistar o Partido Democrata, é facilmente explicável: não acuam por
convicção de princípio, mas tão só por conveniência político-empresarial.
O Presidente Donald Trump fez
bem em exigir ao Departamento de Justiça que tome todas as diligências
necessárias para a reposição da legalidade, obrigando o “The New York Times” a
revelar a identidade do autor do artigo (sancionando, portanto, a prática
miserável e ilegal de textos anónimos) – e, em último caso, recorrer aos tribunais,
ponderando-se a responsabilização civil do grupo proprietário do jornal e do
diretor. Trata-se de defender a democracia, evitando que se crie um precedente
que matará, a médio prazo, definitivamente o jornalismo. As leis do Estado
valem para todos.
4. Dito isto, quem será o autor do tão famoso artigo? Na nossa
opinião, esta história não passa de mais uma monumental mentira: o autor do
texto é um jornalista do “The New York Times”, que utilizou um conjunto de
informações que já circulava em blogues, em livros (de Omarosa, de Martin Wolf
e de Woodward) e de um grupo de pessoas ligadas ao “establishment” republicano
(próximas do “Attorney-General” Jeff Sessions e defensoras do cenário de
conversão rápida de Mike Pence em Presidente dos EUA) que foram reunidas num
único artigo (banal e que já poderia ser encontrado, no essencial, em outras
fontes) como editorial do jornal. E por que o anonimato?
Mais uma pergunta de muito
fácil resposta: porque o anonimato, não se identificando o autor e criando-se a
ideia de que foi escrito diretamente por um membro da equipa de Donald Trump
que pertence à resistência (à boa maneira de saga hollywoodesca, de que, aliás,
nós gostamos de sobremaneira) – confere um impacto político ao artigo que, de
outra forma, ele não teria.
Se o jornalista do “The New
York Times “tivesse assinado o artigo, este seria apenas mais um, passando
despercebido; com o anonimato, o artigo passou a fato político.
Não por acaso, dois dias
depois da sua publicação, apareceu o Presidente Obama a proferir o seu primeiro
discurso de vocação essencialmente política, marcado pela dureza contra o atual
Presidente dos Estados Unidos da América: Obama, curiosamente, estruturou o seu
discurso em torno do artigo anônimo! Sendo que o “The New York Times” já havia
anunciado a intervenção de Obama antes da publicação anônima, o timing da sua
publicação demonstra o único conluio da política americana que é real (e não
mera invenção): o conluio entre os “obamistas” (que já se assumem abertamente
como progressistas radicais) e a maioria da imprensa norte-americana. Isto num
momento em que se aproximam as eleições intercalares…
Anonymous senior Trump official blasts president as erratic and amoral in New York Times essay and writes, 'I am part of the resistance' https://t.co/Oh5Z3kq9jm— USA TODAY (@USATODAY) 5 de setembro de 2018
Oh, a "senior Trump official" you said. But, it may be a "senior prostitute" or a "amoral 'journalist' of NYC"...— Jim Pereira (@jimpereiraRG) 5 de setembro de 2018
5. A propósito de transparência, conforme já mencionámos aqui no
“SOL”, convém ter em atenção que o advogado de Michael Cohen (mais um caso com
o único propósito de desgastar o Presidente Trump), Lanny Davis, foi um
colaborador muito próximo de Hillary Clinton, tendo trabalhado com John Podesta
(o operacional da campanha da democrata derrotada em 2016).
Aliás, há cerca de dois meses,
Lanny Davis (que tem como ponto alto da sua carreira a licenciatura na Yale Law
School, a melhor escola de Direito do mundo, juntamente com a Faculdade de
Direito da Universidade de Lisboa) esteve em Praga, na República Checa
representando a candidata derrotada nas últimas presidenciais americanas em
debate com Steve Bannon.
O advogado de Michael Cohen,
apoiante de Hillary Clinton, iniciou aí a sua intervenção incitando ao
impeachment do Presidente Trump (invocando o argumento genérico da sua
impreparação para o cargo, como se ele se pudesse substituir
constitucionalmente à vontade do povo americano); concedendo, no entanto, no
final, que Donald Trump tem razão em certos aspectos do seu diagnóstico da
situação política e social dos EUA. Portanto, para o advogado de Michael Cohen
não se trata de fazer justiça: ele visa apenas fazer política usando o sistema
judiciário. O que suscita igualmente delicados problemas deontológicos: no seu
afã de fazer política, Lanny Davis proferiu uma declaração na CNN que colocou
em causa a defesa do seu constituinte…
6. Não podemos terminar esta nossa prosa sem mencionar a ironia das
ironias.
Lanny Davis é o autor do livro
com o título “ Scandal –How gotcha politics is destroying America”, publicado
em 2006.
Qual a tese central do livro?
Os escândalos criados pelos adversários políticos, alimentados intensamente
pela comunicação social, geram um processo de erosão que excede em larga medida
a dimensão pessoal do candidato – atingem a respeitabilidade das instituições
democráticas; por conseguinte, são ataques à própria democracia.
Será estranho que tenha sido o
advogado que ora se dedica à “política gotcha”, do “vai apanhá-lo”, baseada em
teorias da conspiração, que tenha visionariamente escrito a referida obra? Não
– é perfeitamente compreensível atendendo ao contexto da sua publicação: em
2006, Lanny Davis era um dos mais proeminentes apoiantes de Hillary Clinton na
contenda eleitoral interna democrata que a opôs a Barack Obama. Ora, nessas
primárias, a estrutura de campanha de Barack Obama não deixou de lançar
cirurgicamente acusações de corrupção contra Hillary nos média e nas (então
florescentes) redes sociais – Obama lançou, pois, a moda dos cânticos contra a
“crooked Hillary”. Lanny Davis teve de defender Hillary, apelando (e bem) ao
valor fundamental da democracia – valor que ele põe em causa para defender os
seus interesses partidários…
7. Ora, o que dirá o advogado Lanny Davis hoje, em 2018, que
patrocina Michael Cohen e que alimenta uma campanha de perseguição baseada em
suposições e invenções contra o Presidente, democraticamente eleito, dos EUA –
do mesmo Lanny Davis que, em 2006, escreveu um livro a criticar violentamente
este tipo de postura na vida política?
Talvez o melhor fosse mesmo
Lanny Davis ler Lanny Davis (versão 2006!) para ver se aprende como interesses
partidários (e de grupo) mesquinhos podem levar ao colapso da democracia…
Tudo isto dito e redito,
cumpre concluir: noutros tempos, afirmava-se que a ameaça ao jornalismo livre
levaria ao fim da democracia – hoje, assistimos, em tempo real, ao processo de
ameaça à democracia face ao fim do jornalismo livre.
Título e Texto: João Lemos Esteves, SOL,
9-9-2018
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