A extrema-esquerda vota orçamentos de
Estado aprovados em Bruxelas e acha os pobres racistas. Não fossem as saias e o
ódio à bandeira, como se distinguiriam esses deputados de um qualquer
socialista?
Rui Ramos
Uma das maiores partidas que
Salazar pregou às esquerdas foi não se ter deixado sepultar no Mosteiro dos
Jerónimos. Imaginem a alegria que agora teriam as esquerdas, se pudessem
dividir o país, como fizeram os seus correligionários do outro lado da
fronteira, com a profanação do túmulo do general Franco. Em vez disso,
resta-lhes pôr saias nos assessores nascidos com o sexo masculino (é assim que
se deve dizer?), e esperar que dê fotos na imprensa e comentários nas redes
sociais. Para além das saias, há a bandeira da República Portuguesa. Em 1910,
para marcar a ruptura de regime, os antepassados carbonários da
extrema-esquerda insistiram numa nova bandeira, com as cores da revolução. E é
essa mesma bandeira que o esquerdismo, depois de a ter imposto ao país, agora
acha “imperialista”, pelo menos na opinião dos fãs da deputada do Livre.
Em 1910, os revolucionários
mudaram as cores da bandeira e eliminaram a coroa. No entanto, mantiveram as
armas nacionais e adicionaram-lhes a esfera armilar. A ideia era ainda anexar a
história que a bandeira contava. A extrema-esquerda de hoje, porém, não gosta
dessa história. Todo o passado português lhe parece criminoso. Gostaria, por
isso, de o apagar. Nada disto, aliás, é muito original. Decorre, de maneira
muito pedestre, da colonização das universidades portuguesas pelo radicalismo
acadêmico americano.
Pensarão: mas não é isto um
erro, que só pode hostilizar e ser estranhado pela maioria dos portugueses? Não
é, porque esta extrema-esquerda não aspira a persuadir maiorias. O que lhe
importa são umas dezenas de milhares de votos, sobretudo em Lisboa, que lhe
sirvam para aceder aos subsídios do Estado. Esta, de resto, já não é a
extrema-esquerda do COPCON, mas de António Costa, isto é, mais um alicerce do
domínio do PS. Vota orçamentos de Estado aprovados em Bruxelas e acha os pobres
racistas. Não fossem as saias e o ódio à bandeira, como se distinguiria um
deputado de extrema-esquerda de um qualquer deputado socialista?
No outro extremo, a vida
parece mais fácil. Bem sei que é costume haver muitas queixas em Portugal sobre
a injustiça com que a direita é tratada (por mais democrática, é sempre
fascista; por mais filantrópica, é sempre racista). Mas quando o que interessa,
como no caso do Chega, é a fama de ruptura e de iconoclastia, essa tradicional
má vontade contra a direita é muito útil. Pensem em André Ventura. O novo
deputado não precisa de truques de indumentária nem sequer de grandes guerras
simbólicas para passar por radical e perigoso. Pelo contrário, pode até
permitir-se o luxo da moderação, como numa entrevista de ontem.
Que disse Ventura? Que se
recusa a falar com a Alternativa para a Alemanha, que considera “um partido
ridículo, extremista e desumano”; que pretende ser uma muralha contra esse tipo
de extremismo em Portugal; e que quer que a deputada do Livre tenha mais tempo
para falar do que os outros, porque “nós temos de ser tolerantes”. Eis a face
hedionda do fascismo português. Eis a propostas tremendas que fazem os
porteiros do regime exigir que na Escola Prática de Cavalaria de Santarém os
Chaimites estejam de motores ligados, prontos a arrancar para Lisboa ao
primeiro sinal de que Ventura vai obrigar mais um deputado do CDS a
levantar-se. André Ventura poderia até dormir durante todas as sessões da
próxima legislatura, confiante em que os deputados seus colegas nunca se
esquecerão de o lembrar ao povo como uma opção para todos os que estiverem
frustrados com o regime. Com que inveja deve a extrema-esquerda parlamentar, do
BE e do Livre, olhar para o Chega.
Título e Texto: Rui Ramos, Observador,
29-10-2019
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