Aparecido Raimundo de
Souza
O brasileiro nato, infelizmente, não carrega em seu
âmago o espírito de lutar bravamente, de se enfurecer, de sair em campo a céu
aberto, de modo desembestado, e mostrar a sua face mais desbravadora no tocante
aquilo que seus anseios realmente almejam. Em igual ocorrência, como um avião
despencando em queda livre, não aprendeu (e isso vem de berço), não considerou
como meta principal encontrar uma alternativa, tentando se salvar, fosse
procurando por dias melhores, se opondo a morrer esmagado nas mãos de quem
sempre o manteve numa vida de privações e horrores. Tal atitude, senhoras e
senhores, o fez se espatifar em mil pedaços nos confins da puta que o pariu.
Não alimentou, em nenhum momento, o desejo de pelejar acirradamente de unhas e
dentes na busca diária de seus direitos mais elementares. A sua cara de
pobretão (ou brasileiro “meia bunda” — digo, meia boca”) lhe conferiu um
caráter atrofiado e de roldão, formas estranhas de encarar a vida.
Pequenas coisas nos revelam que o coitado veio ao mundo preso nas fraldas repletadas de merda de um ontem que não deslanchou. Esse cidadão ao qual me refiro, em repeteco, para deixar bem sintetizado, não é outro senão o nativo da Terra. Esse babaca, bem sabemos, não passa de um parvo zureta e acaipirado. Um medroso, um ser asqueroso e ignóbil, um chulo corriqueiro e sórdido, um “crápula-vil-maligno”, um “omem” concebido pela sua característica mais acentuada: a veneração pelo estado de viver e morrer, sendo somente a metade. Grosso modo, um “cu-sujo,” um cagalhão. Em paralelo, um pau que não goza, nem a poder de muitas doses de Tadalafila. O brasileiro é isso, indubitavelmente um zero à esquerda ao sul das impudências misturadas às sem-vergonhices, ao cinismo grave e ao enlameado de imoralidades das mais perniciosas. O brasileiro é uma espécie rara de estroina pacífico vivendo num mundo real de leões famintos, onde a sua presença não diversifica para além de um alienígena cripitideo conhecido entre nós como o “Monstro do Lago Ness.”
Deveria ser o contrário! Como assim? Vamos tentar
explicar. O nosso “Monstro do Lago Ness” não vive nos Campos Altos da Escócia,
no Reino Unido. O pesadelo que nos enfia o ferro até os colhões tem certidão de
nascimento, carteirinha de “poderoso,” atropela diuturnamente aquela vagaba que
usa uma calcinha suja de menstruação no rosto carcomido pela vergonha e mantém
uma espada enferrujada no colo. Desde que nos conhecemos por gente, não
chegamos à conclusão de “por qual motivo ou circunstância” uma vadia conhecida
como “justissssssa” usa uma espada enferrujada e mantém, na porra da face
disforme, uma birosca — melhor dito, uma venda. Voltando ao miserável do
brasileiro, essa pessoinha de aparência fúnebre é e sempre será vista como um
rato de esgoto. Um verme, uma lombriga, um ser tipo um vulto sem antecedentes,
sem biografia e sem autor. Reparem, como diria Suassuna, “ainda que fique de
frente com um espelho limpo e esplendoroso, a sua própria imagem se negará a se
fazer presente com receio de ser contagiada pela desonra e, consequentemente,
pela covardia.” O brasileiro, em suma, (sempre some). O escafeder está no seu DNA.
Ele somente tem o prazer sexual de mostrar as
covinhas faciais, ou de sair às ruas, pintar e bordar, gritar e desmunhecar,
dando o rabo e se prostituindo. Em passos paralelos, se glorificando inteiro e
sem reservas, sem uma gota de pundonor, nas épocas carnavalescas, onde, apesar
de retardado e desnorteado, adora viver mancomunado aos encantos dos efúseros
maltrapilhados. Efúseros nada mais é que um aglomerado de burros e jumentos
tresloucados dançando a dança do capeta com a cuca chapada de cachaça. Esse infeliz,
senhoras e senhores, ama o “fodido” como o Manoel Gomes venera aquela “caneta
azul.” Falando em caneta... por conta, o brasileiro se veste na cueca rosa de
um sujeito sem eira nem beira. É comum vê-lo travestido de bufão esferográfico
na Marques de Sapucaí desfilando para uma plateia imensa de loucos e alienados
como uma folha branca fugida de uma resma desnorteada, pronta para ser
rabiscada, e, como tal, faz questão de arreganhar todas as suas enfermidades,
aflorando as peripécias da sua doença interior sem cura, como esse “esquisito”
que os boçais querem o impeachment. Aliás, não se fala em outra coisa. O
impeachment hoje faz mais sucesso que os folhetins sexuais das novelas da Rede
Globo.
Creio ser mais fácil um boi voar, como nas proezas
da imaginosa Ana Maria Machado, ou do elefante que sonhava em ser bombeiro, de
Sérgio Aboudib. Enquanto o impeachment não sai voando dos sanitários e
deslancha para o uso de traseiros cheios de merda (creiam, senhoras e senhores,
esse dito cujo nunca estará ou se fará pronto para as “limpações dos mais
diversificados rabicós miasmáticos). Em face dessa desgraça anunciada, nós,
meros mortais, seguimos, rabinhos entre as pernas, rindo da nossa falta de sorte.
Mesmo destino, caminhamos a passos largos ao incerto de uma via sem volta.
Desbravamos como vaquinhas de presépio sonhando acordados com uma quimera que
não se concretizará. Ao invés de vivermos de aparências, melhor se nos
concentrássemos nos outros monstros descritos por um tal de Edgar Allan Poe. No
seu tempo, e enfia tempo nisso, Poe com muita propriedade escreveu “A Queda da
Casa de Usher.” Se vivo fosse, escreveria “A Queda da Casa dos Brasileiros
Noiados.” Em igual sequência pariu “Os Assassinatos da Rua Morgue.”
Se vivo fosse, teríamos “Os Assassinatos das Ruas
Brasileiras Que Permanecem Sem Explicações Plausíveis.” Se ainda hoje
respirasse o ar das montanhas, Poe não daria vida ao “Retrato Oval.” Se
enfureceria e mandaria bala no “Retrato dos Brasileiros Sem Futuro e Sem
Esperança.” Poe escreveu ainda “O Gato Preto.” Se vivesse hoje, daria vida e
cor ao “Gato da Toga Preta Que se Fez Deus e Almeja Superar o Verdadeiro.”
Outro autor que mudaria seus hábitos alimentares seria o velho Lovecraft. Esse
escritor mandou a sua imaginação ao fabuloso “Horror de Dunwich.” Temos em
conta que, se não estivesse comendo capim pela raiz e morando, por exemplo, em
Taguatinga ou Guará, publicaria “O Horror de Brasília.” Até Bukowski não
perderia tempo com as suas “Notas de um Velho Safado.” Contudo, daria contornos
especiais às “Notas de um Presidente Bandido.”
William Peter Blatty mandaria seu inoxidável
“Exorcista” vir dar um passeio na Praça dos Três Poderes com a missão de
exorcizar meio mundo, a começar pelos parlamentares da Câmara e do Senado,
entre outras pocilgas. Jo Nesbo não colocaria seu brilhante detetive Harry Hole
nas pegadas do “Boneco de Neve.” Temos certeza de que traria à luz o que
realmente aconteceu de verdadeiro no 8 de janeiro. Os senhores lembram do 8 de
janeiro?! Luiz Fernando Veríssimo não deixaria por menos. Reescreveria “A
Grande Mulher Nua.” Imbuído nesses cinquenta tons de cinza, a sua personagem
seria “A Grande Canja da Mulher Nua.” Resumindo a “ópera do malandro”, o
espertalhão que se deu bem com a Lei Rouanet, quem sabe, o zé-povinho nascido
brasileiro acorrentado às estranhas das suas insanidades, acordasse do marasmo
para a realidade, regaçasse as mangas e fizesse alguma coisa valer a pena.
Objetivando, acima de tudo, mudar o seu brazzzil estropiado, tal como um
Titanic gigantesco afundando em câmera lenta no lamaçal do Lago Paranoá, ou
como o turboélice da VOEPASS que vitimou inocentes no fatídico voo 2283. Aliás,
aproveitando a deixa, o país está num desses ATR-72-500. Destino ignorado. Na
primeira oportunidade de gelo em suas estruturas, ele será efetivamente
derrubado. No momento em que estamos, só nos resta ESPERAR.
Título e Texto: Aparecido Raimundo de Souza, da Freguesia do Ó, São
Paulo, capital, 20-8-2024
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