José Miguel Pinto dos Santos
É fantástico não ter medo de sheiks e de
mullahs, allamahs e ayatollahs, nem dos seus rebentos, mas só se isso não
impedir as ações adequadas para anular o seu potencial de destruição.
Uma das reações mais comuns
aos últimos atos de selvajaria islâmica é apelar ao sangue frio das massas: não
devemos ter medo! O melhor modo de fustigar o terrorismo maometano é,
dizem-nos, continuar a fazer o que sempre fizemos como se nada tivesse acontecido
ou pudesse voltar a ocorrer: é não deixar de ir a um concerto por temor, nem de
viajar por receio.
Ilustração: Michael Bedard |
Esta filosofia de vida merece
respeito. Mais: causa admiração. É a do estoico que continua a ler Séneca
imperturbado pela primeira ferroada de uma vespa, ou a do poeta que continua a
declamar na cidade em chamas. Não é louvável a indiferença ao perigo face aos
valores mais elevados do progresso, da filosofia e da arte? É também a da
optimismo e coragem de um Neville Chamberlain (1869—1940), que não se amedronta
com a histrionia de dois bufos, distantes e fracos, nem deixa que ela afete as
políticas estabelecidas do império nem a paz de espírito e estilo de vida dos
seus súbditos. Não é admirável a equanimidade e tolerância face a insultos e
ameaças vãs?
Este modo de estar na vida,
embora estupendo, não deve ser imposto a ninguém. Como todas as moralidades
elevadas, deve ser proposto, não imposto. Embora o possamos lamentar, temos de
reconhecer aos outros o direito a ter medo e a agir em conformidade. O medo,
tal como a fome, é uma reação do organismo que, em geral, potencia a sua
capacidade de sobrevivência. Mostrar fome ou medo é, de facto, rasca. Um
samurai dos antigos nunca mostrava ter fome ou medo: palitava os dentes quando
a primeira apertava, e não pestaneja quando emboscado, para assim mostrar o seu
desprezo por estas duas fraquezas. No entanto, ter medo é uma reação tão
natural como a sua sede.
É natural ter medo durante um
tremor de terra. No Japão todos têm medo de terramotos e sabem o que fazer para
se proteger quando um acontece. No Irão ninguém tem medo de terramotos e
ninguém sabe o que fazer quando um ocorre. Impressiona ver o que sucede durante
um tremor de terra, dos fortes, no Japão. Também emociona observar o que
acontece aquando um tremor de terra, dos fortes, no Irão. Mas por motivos
diferentes.
Não mostrar medo é, de facto, heroico.
Mas há ocasiões em que aconselhar a não ter medo pode ser insultuoso. Quem é o
amigo que diz: “Olá Zé! Foste despedido? Não tenhas medo do futuro! Cumprimentos
à Maria e xi-coração às crianças.” Ou que sindicalista o diria?
Para além de heroico, não ter
medo é, algumas vezes, sinal de estupidez. Acontece não termos medo por
ignorância, porque não percebemos o que está a acontecer. Um empresário que não
se apercebe de uma inovação tecnológica ou organizacional que em breve tornará
o seu produto obsoleto geralmente não tem medo de nada. Também podemos não ter
medo porque não acreditamos no princípio de causalidade: há inúmeros gestores
que põem em risco a viabilidade económica das suas organizações porque não
acreditam na existência de uma relação causal entre déficits e dívida nem entre
dívida e dificuldade de financiamento. Ambas as atitudes geram inflexibilidade
porque sugerem que não há nada a mudar, e, portanto, podemos continuar a fazer
o que sempre fizemos como sempre o fizemos.
E este é o maior perigo de não
ter medo: impedir a adaptação requerida às mudanças do meio ambiente. É
fazer-nos cegos e surdos ao perigo que nos ameaça, tornar-nos sitting
ducks à mercê de qualquer predador. É não nos deixar pensar no que
pode ser feito para contrariar a as ameaças que enfrentamos e depois atuar em
consequência. Se o não ter medo embotar a capacidade de percepção da realidade
ou dificultar a aptidão para reagir à mudança, então é saudável ter medo. É
fantástico não ter medo de sheiks e de mullahs, allamahs e ayatollahs,
nem dos seus rebentos, mas só se isso não impedir as ações adequadas para
anular o seu potencial de destruição. Não são os mais fortes que sobrevivem:
são os que melhor se adaptam.
É chique não ter medo do
terrorismo islâmico. Não haverá grande crise nisso, desde que tal não nos torne
parvos e impávidos à ameaça que nos é posta. Caso contrário, será slam
dunk para os maometanos nos submeterem. Submissão é, aliás, o que
Islão manda e significa.
Título e Texto: José Miguel
Pinto dos Santos, Professor de Finanças, AESE Business School, Observador, 30-5-2017
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