![]() |
Foto: Manuel de Almeida/Lusa/i |
António Ribeiro Ferreira
O senhor Presidente da
República parte quarta-feira para os Estados Unidos. Boa viagem. Mas antes de
deixar a terrinha fez questão de compartilhar com os portugueses o seu estado
de alma sobre os desempregos e os filhos dos que não têm trabalho hoje, amanhã
e daqui a uns anos. Para Cavaco Silva, vão ser tempos insuportáveis. É verdade.
Tem toda a razão. Mas essa gente vive a sua tragédia em silêncio, tenta
sobreviver por todos os meios possíveis e imaginários. Não tem a protecção de
ninguém. Do poder político, que corta nos subsídios e na sua duração porque não
há dinheiro; dos sindicatos, que apenas se preocupam com os afortunados que
ainda têm trabalho; dos partidos, que andam preocupados com os direitos
adquiridos e com as violações constitucionais dos cortes de ordenados e
subsídios de férias e Natal de quem recebe o salário do Estado a tempo e horas;
dos empresários incompetentes, que viveram e querem viver encostados ao Estado
e que não suportam a mínima concorrência interna ou externa; dos empresários
competentes que estão sem crédito na banca, atolados de impostos e burocracia e
estão essencialmente preocupados em manter os seus negócios e ter dinheiro ao
fim do mês para pagar os salários aos seus trabalhadores. São, de facto, tempos
insuportáveis para quem tem cabeça e dois braços para trabalhar e ninguém lhe
dá emprego. Mas mais insuportável é olhar para o país e ver tanta gente
insuportável a protestar por tudo e por nada, numa vã e miserável tentativa de
manter tudo como dantes, alheia a tudo e a todos, mesmo aos que passam por
tempos insuportáveis. Insuportáveis são as greves dos transportes públicos.
Insuportáveis são os indignados com os cortes nas linhas do Metro ou da Carris.
Insuportáveis são os que marcam paralisações supostamente gerais para manter
regalias e direitos que os que vivem tempos insuportáveis há muito perderam.
Insuportáveis são os reitores das universidades públicas que não querem viver
com menos dinheiro do Estado.
Insuportáveis são os ecologistas que param obras
de barragens por causa de umas árvores e ameaçam pôr no desemprego insuportável
centenas de pessoas. Insuportáveis são os médicos que se gabam de boicotes a
medicamentos mais baratos que nem os que vivem tempos insuportáveis podem
comprar. Insuportáveis são as leis para filhos e enteados, que permitem o
desemprego para uns e a segurança para outros. Insuportáveis são os autarcas do
regime que usam o seu peso político para não cortarem a sério no endividamento
das câmaras. Insuportáveis são os que fingem não saber a que estado chegou este
país miserável em que uns tantos miseráveis se governaram à grande e à francesa
durante muitos e bons anos democráticos. É verdade, senhor Presidente da
República. Há muita gente insuportável no país a que o senhor preside. Talvez
desse algum consolo à alma dos que vivem tempos insuportáveis ouvir os
carrascos de Portugal pedir desculpa por tudo o que andaram a fazer. Talvez a
vida fosse menos insuportável, mesmo para os que vivem tempos insuportáveis. E
para os que vão passar a viver tempos insuportáveis já a seguir.
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Não publicamos comentários de anônimos/desconhecidos.
Por favor, se optar por "Anônimo", escreva o seu nome no final do comentário.
Não use CAIXA ALTA, (Não grite!), isto é, não escreva tudo em maiúsculas, escreva normalmente. Obrigado pela sua participação!
Volte sempre!
Abraços./-