Há dias, numa tertúlia com
amigos, o tema da ameaça islâmica suscitou acesa discussão. Um dos argumentos
brandidos por um dos intervenientes é o de que, como aconteceu com outros
invasores e outras migrações, os valores do Ocidente acabam por ser aceites e
impôr-se.
E referia, a propósito, o
período das invasões e migrações germânicas sobre o Império Romano que levaram,
não à germanização da Romania, mas à romanização dos bárbaros.
O argumento é poderoso mas
derrota-se a si mesmo, como iremos ver.
Os germanos, apesar de terem
sido os maiores responsáveis pela destruição do governo imperial, não queriam
substituir o Império por algo novo e, de facto, o direito, a moral, a economia,
a moeda, o equilíbrio social, a língua, as artes, etc, mantiveram as referências
romanas. Até a religião cristã, a religião do Império, acabou por desalojar o
arianismo.
Os reis bárbaros eram
geralmente vistos pelas populações como generais de mercenários, ao serviço de
Roma. E mesmo quando vitoriosos, iam ao encontro dos vencidos, adquiriam os
seus hábitos e os seus valores, governavam à romana, ou tentavam. As suas
cortes estavam cheias de poetas e retóricos.
Recesvinto, Rei dos Visogodos,
proclamou em 634 um Liber Judiciorum, completamente tributário do direito
romano. Sigismundo, Rei dos Burgúndios, dizia-se um soldado do Império.
O Norte de Africa estava
completamente romanizado e até os Vândalos, que ali se instalaram, aceitaram a
vida tal como ela era, ao estilo romano.
A imagem que melhor descreve a
situação é a de um belo solar, cujo dono está ausente, e que foi dividido
interiormente em vários apartamentos. Apesar dos sinais de decadência, apesar
de já não existir um único proprietário, o edifício mantém-se de pé, com a sua
original traça exterior.
Isto numa altura em que os
árabes começavam a sua grande jihad.
Mas com os árabes, nada disto
se passou.
Em 632, quando Maomé morreu,
ninguém estava preocupado com os árabes. Eram umas tribos de selvagens, para lá
da Síria.
Os grandes poderes da época
eram o Império Bizantino, o Império Persa e, na Europa, os reis germânicos
mantinham mais ou menos viva a ideia do Império Romano.
Trinta anos depois já os
árabes, galvanizados por uma nova religião, carregavam sobre o Norte de Africa,
e conquistavam Creta, Chipre e Sicília. O Mediterrâneo era deles e os Impérios
Persa e Bizantino batiam em retirada.
A questão que se coloca é: por
que razão não foram os árabes absorvidos pelos valores de populações e regiões,
muitas das quais com civilização superior, como tinha acontecido com os germanos?
A razão é, claramente,
religiosa. Os germanos nada tinham a opor ao cristianismo do Império, queriam
apenas poder e o brilho que o Império projectava, eram como traças atraídas por
uma lâmpada, mas os árabes combatiam por uma nova fé e foi a natureza dessa fé
que impossibilitou a assimilação.
Na verdade os árabes nada
tinham a opor à civilização superior dos povos que conquistam, e assimilaram-na
com grande rapidez, indo beber directamente ao legado helénico.
Nem sequer pretendiam
converter os conquistados, apenas que eles obedecessem a Alá. Ou seja, exigiam
a simples e, para eles, natural, submissão de seres inferiores, degradados,
desprezíveis, e abjectos.
Onde chegaram, instalaram-se
como dominadores. Os vencidos eram seus súbditos, pagavam impostos especiais
(jyzia) e não faziam parte da umma, da comunidade dos crentes. Nenhuma fusão
podia acontecer entre conquistados e conquistadores, nenhum esforço os
vencedores faziam para agradar aos vencidos. Eram estes que tinham de ir ao
encontro dos seus novos senhores e não podiam ir de outro modo que não fosse
como servidores de Alá.
A fé dos vencidos não era
atacada, não merecia sequer a dignidade de ser rebatida. Era simplesmente
ignorada, já que um predador não argumenta com a presa. E esta era a melhor
maneira de afastar o vencido do seu estado de jahiliyyah e conduzi-lo a Alá e à
dignidade da comunidade dos crentes.
Tudo isto implica que onde o
muçulmano se instalou como vencedor, a antiga civilização desapareceu. O
germano romanizou-se ao entrar no Império. Os povos onde entrou o muçulmano,
islamizaram-se, porque a rotura com o passado foi total. Uma nova língua, novos
costumes, um novo direito (sharia), novos valores, instituições e, acima de
tudo, uma nova religião, dominadora e intratável.
A sociedade civil desapareceu,
sendo substituída por uma sociedade religiosa e totalitária.
Foi isto que aconteceu em
todas as regiões onde o Islão chegou, desde a Pérsia a Marrocos. E esteve
prestes a acontecer na Península Ibérica, não tivesse havido algumas circunstâncias
fortuitas que impediram esse desfecho.
É por isso que o argumento
daquele meu amigo é falacioso. Mas é a mesma falácia em que assenta a doutrina
multiculturalista dominante no pensamento politicamente correcto ocidental. A
ideia que, de algum modo, as comunidades muçulmanas são como as outras, serão
assimiladas, e acabarão por se converter aos nossos valores, às nossas leis, ao
nosso modo de vida. Nada na História corrobora tal esperança, bem pelo
contrário, pelo que a sua prevalência se deve apenas à profunda ignorância
ocidental, relativamente aos fundamentos doutrinários do Islão.
E, como dizia Sun Tzu, quem
não conhece o seu inimigo, nem se conhece a si mesmo, perderá todas as
batalhas.
Título e Texto: O-Lidador, no blogue "O triunfo dos porcos", 08-11-2011
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Não publicamos comentários de anônimos/desconhecidos.
Por favor, se optar por "Anônimo", escreva o seu nome no final do comentário.
Não use CAIXA ALTA, (Não grite!), isto é, não escreva tudo em maiúsculas, escreva normalmente. Obrigado pela sua participação!
Volte sempre!
Abraços./-