segunda-feira, 2 de janeiro de 2012

História de um estrangeiro que me queria lembrar os triunfos de Portugal. A sério.


Nuno Rogeiro
Um amigo americano disse-me há pouco (jurando-me não exagerar) que Portugal era desconhecido nos EUA.
Isto, apesar de termos tido heróis na Revolução de 1786 (Pedro Francisco), de havermos reconhecido, antes de quase todos, o novo Estado pós-colonial (mais relevante, dado que éramos o aliado tradicional do Reino Unido), das raízes de John dos Passos e John Philip de Sousa, das grandes comunidades imigrantes em Newark, Nova Bedford e San Diego, das Lajes e, já agora, da paixão de Bill Clinton pelo “Porto de Santa Maria” (passe a publicidade).
Não se conhecia, entre as massas e os decisores, o potencial turístico de Portugal. Não havia uma imagem coerente e sedimentada da nossa história, cultura e patrimônio. Sabia-se vagamente, no cento de Nova Iorque, que éramos privilegiados pela natureza e pelo clima, à beira-mar plantados, mas quantos conheciam o pioneirismo lusitano nos ATM, no pagamento por Via Verde, nos serviços bancários e de supermercado, nas energias renováveis (se descontarmos a desacreditada solução eólica), nas tecnologias de informação e comunicação?
Quantos, continuava o meu amigo (um antigo diplomata), sabiam do desempenho exemplar dos militares, guardas e polícias nacionais em missões (muitas vezes com riscos pouco públicos) de apoio à paz, do Timor ao Iraque, dos Balcãs às Áfricas, onde ganharam sempre mais amigos do que adversários, e onde mostraram a aliança da rusticidade, da técnica e do conhecimento, da adaptação e da determinação (para já não dizer da coragem)?
E quem conhecia a flor frágil, mas ambiciosa, da CPLP, com os tesouros da música do mundo, das riquezas naturais, das possibilidades de expansão, do multiculturalismo e da língua comum, bens tanto mais essenciais quando se sabe que se partiu de guerras cruentas e de uma descolonização desastrosa?
Quem teria ouvido falar das empresas de rigor e sucesso, como a Autoeuropa, modelo para toda a União e para os falidos construtores de Detroit ou da Escandinávia, ou da PT, que nasceu num solo conturbado? E, apesar das fraquezas estruturais e das contradições, quem se lembraria dos prémios internacionais de reconhecimento da TAP?

No desporto, as coisas são mais fáceis, por causa da bola. Mesmo nos momentos mais negros, o Brasil encantava o universo com o futebol. Mas a subida mundial de jogadores de classe (e não só o Eusébio, ou uma geração de ouro que já só cabe nas nossas queridas recordações) e de oito treinadores que conquistaram a Europa diz algo ao Novo Mundo?
Não temos guerra civil há 177 anos, não somos invadidos há 197, não arcamos com campanhas anti-insurreccionais desde 1975, não temos terrorismo nos genes nem na frequência. Quantos americanos sabem que Portugal e paz são sinónimos? – perguntava-me o persistente amigo. E o sucesso escolar e profissional dos portugueses que buscam vidas melhores noutras paragens? – continuava.
Ouvi, tomei nota, transmiti. Ao abrir a janela, vi a crise europeia. Outro amigo chama-lhe “um acidente em câmara lenta””. Onde está o condutor?
Título e Texto: Nuno Rogeiro, revista “Sábado”, nº 399, 22 a 28-12-2011
Digitação e Edição: JP

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