[O cão tabagista conversou com...] Consuelo Maria: "Não acredito em ACORDO antes do julgamento da Defasagem Tarifária"

Nome completo: Consuelo Maria Troncoso Di Marco

Nome de guerra: Consuelo Maria

Quando começou a trabalhar: Comecei a trabalhar em março de 1978 como Professora de Ciências para o supletivo do primeiro grau, mas como professor nunca foi bem remunerado, em 1982 pedi exoneração de cargo e fui trabalhar como comissária de bordo na antiga Cruzeiro do Sul. Em 1º de outubro de 1984, após pedir demissão da Cruzeiro do Sul, comecei a voar na Varig.

Você começou na Cruzeiro do Sul em 1982?

É, eu comecei na Cruzeiro do Sul, porque o Rio não estava selecionando comissários para a Varig, só São Paulo e como moro no Rio me inscrevi na Urca para a Cruzeiro do Sul e comecei o Curso de Comissário em outubro de 1982. Minha turma foi voar o DC-9 que veio fazer uma experiência para a Cruzeiro, meu primeiro voo foi no dia 4 de janeiro de 1983.

Então, ficou só um ano na Empresa?

Não, no mês que ia fazer dois anos, comecei a voar na Varig, ou seja, pedi demissão da Cruzeiro no dia 30 de setembro de 1984, e comecei a voar na Varig no dia 1º de outubro de 1984. Coisas da "Nossa Varig"...

Deixa ver se eu entendi… você não pediu demissão, fez parte de uma transferência para outra empresa. É isso?

Não você entendeu errado. Pedi demissão da Cruzeiro num dia e no outro já estava na Varig, ou seja, a Cruzeiro abriu mão do aviso prévio.

Ok. E por que pediu demissão da Cruzeiro?

Quando resolvi ser comissária, queria ser comissária da Varig, infelizmente, só tinha vagas para a base São Paulo. Aí, para voar na Varig comecei pela Cruzeiro, que já era da Varig, tanto é que o nosso Curso de Comissários foi dado pela Varig.

E como foram esses dois anos na Cruzeiro?

Esses dois anos na Cruzeiro foram bons, o pessoal da antiga Cruzeiro, quando digo antiga Cruzeiro era aquele pessoal que estava voando Cruzeiro quando a Varig comprou a Cruzeiro, era muito legal, mas como antigos da Cruzeiro só gostavam da Cruzeiro, da Varig não.

A Varig tinha até apelido," Madrasta", bons tempos, e eu só pensando quando é que vou ser funcionária Varig…

Bom, aí você começa a voar na Varig… sentiu alguma diferença?

Senti no início, me senti uma estranha no ninho, ou seja, o pessoal da Varig trabalhava mais devagar a bordo, mas era mais  profissional. Quando digo profissional, me desculpe o pessoal da antiga Cruzeiro, profissional em tudo, desde o trato com o passageiro, a maneira de se apresentar para voar, e os Chefes de Equipe em relação aos auxiliares.

E tinha um avião que aprendi a gostar, que foi um dos grandes marcos da Varig, o "Electra".

Foto retirada daqui

Ora, e o que tinha de especial esse avião?

O Electra tem muito de especial, a ponte aérea, você mesmo sabe, era a"Galinha dos Ovos de Ouro" da Varig. Nenhuma Empresa atendeu tão bem na ponte aérea como a Varig com o Electra, até hoje ninguém a superou.

E na ponte tive a oportunidade de voar com muita gente conhecida, dentre elas elegi a mais simpática a Rita Lee.

Voltando à "Galinha dos Ovos de Ouro", infelizmente acho que um dos motivos do endividamento da Varig foi o fim da ponte aérea de Electra.

E quem você elegeu como mais antipático?

Como simpático, antipático são conceitos subjetivos, quem lê vai estranhar, mas para mim o Jô Soares foi a pessoa mais antipática que conheci na ponte. Com excesso de peso necessitava de duas poltronas, não gostava que ninguém sentasse ao seu lado, na maioria das vezes era impossível e reclamava de tudo, da manutenção da aeronave ao serviço de bordo. Olha, reclamações sem fundamento, porque quanto à manutenção a Varig sempre foi muito cuidadosa e o serviço de bordo no Electra era maravilhoso, ou seja, superior aos serviços de bordo dos voos nacionais de hoje.


Quanto tempo ficou voando na Ponte?

Fiquei na Ponte dois meses, foram dois meses maravilhosos.

Aíi retornei para a Nacional, mas por pouco tempo, logo fui promovida para a então desejada "Internacional".

Quais eram, na época, os equipamentos que voavam “internacional?

Quando eu fui para Internacional (1986) eram o DC-10 e o Boeing 747. Na época tinha um grupo voando DC-10 e outro voando Boeing 747, mas passamos todos a voar os dois equipamentos, pois chegaram três Boeing 747 Full Pax. O pessoal do Boeing 747 não gostou da fusão porque só faziam Frankfurt e Nova Iorque…

Nessa época tudo era felicidade?

Que época feliz o auge da Varig e nosso também.

Eu era feliz e não sabia o quanto… Voos lotados, mas, em contrapartida, maravilhosos pernoites em locais maravilhosos, hotéis 5 estrelas, jantares com os colegas e passeios turísticos em dias inativos. Com certeza posso afirmar: curti a minha vida e fui muito feliz, mas ainda sou feliz, mas essa época foi tudo de bom.

Qual (ou quais) o pernoite que mais gostava?

Gostava de quase todos, mas é claro que com dia inativo era melhor, podíamos fazer o que queríamos, e eu aproveitava para passear. Sendo assim o que mais gostava era Roma, seguida de Milão, Londres e Porto. No Porto tem um fato interessante de família, tive a oportunidade de conhecer a cidade onde minha avó nasceu, Guimarães.

Fora deste tinha um que gostava de ir para relaxar, Manaus. Como era bom chegar no Hotel Tropical, colocar o biquíni, passar o dia na piscina e depois comer um bom churrasco, que saudades… bem, é sinal que o tempo passou, sinto saudades e melhor ainda, foram anos bem vividos…

Passou por alguma emergência?

Emergência no sentido da palavra não.

Passei por situações perigosas, três:

A primeira no meu voo de cheque de B-737, cheguei a pensar que era trote, que o que, era emergência mesmo, decolamos do Galeão para Belo Horizonte de translado, e depois o comandante tentou guardar o trem de pouso e nada aconteceu, alijamos combustível e retornamos para o Galeão, com direito a fecharem o Galeão para pouso e decolagem e ambulância e bombeiro na pista, mas não aconteceu nada Graças à Deus, mas fui contar para minha mãe e ela queria por que queria que pedisse demissão.

A segunda não foi bem uma emergência, tivemos que retornar para Lisboa, mal decolamos, porque houve ameaça de bomba a bordo.

A terceira a experiência do comandante William nos livrou de cair no mar em Los Angeles. Na decolagem estava sentada no acento cinco esquerda do B-747, e olhava pela janela da porta e reparava que o Jumbo não ganhava altitude, quando o comandante William me interfonou perguntando se eu estava sentindo algo de diferente. Falei que sim, que o Jumbo não ganhava altitude e eu já estava conseguindo ver a bandeira de um barco.

Aí ele me disse que ficasse atenta e qualquer coisa ligasse para a cabine. Foram minutos meios tensos, mas o Jumbo ganhou altitude e o comandante me interfonou e disse que já estava tudo bem, que o que tinha acontecido é que uma das quatro turbinas tinha dado pane e por isso tinha sido difícil, ganhar altitude mas iríamos prosseguir para São Paulo, pois o Jumbo ainda tinha três turbinas funcionando bem.

Ufa!!!!!!! Essa, confesso para você, minha mão ficou toda suada, que medo!!...

Você voou quanto tempo na Varig?

Na Varig voei vinte e três anos. No total foram vinte e cinco, porque voei dois anos na Cruzeiro.

Estava trabalhando na empresa quando ela fechou?

Sim infelizmente estava, porque "Infelizmente" foi muito triste ver a Varig fechar, não é porque eu era funcionária, mas porque a Varig foi uma "Grande Empresa" conhecida mundialmente e não merecia ter o fim que teve.

Trabalhava na Varig quando ela fechou. Não fui demitida, nem voltei a voar, pois havia um acordo sindical que quem tivesse 52 anos ou mais não seria demitido, estava estável, por causa do "AERUS"…

Para encurtar, pedi para me demitirem, porque não recebi o "AERUS", porque estava na Varig que não tinha dinheiro para pagar o meu salário, e não voava porque não era funcionária da Varilog…

No "AERUS" fui aposentada por "DIREITO ADQUIRIDO", uma das grandes conquistas da nossa Constituição Cidadã, que acabou de completar 25 anos no dia 5 de outubro.

Me desculpe, não entendi…

Vou escrever de outra maneira.

O "AERUS" entrou em liquidação em abril de 2006.

O interventor, na época, era o Crespo. Me mandou uma carta dizendo que eu seria aposentada pelo "AERUS" assim que saisse da Varig, pois já tinha preenchido todos os requisitos para me aposentar. Isto  é o direito adquirido, conquista da nossa Constituição de 1988.

Porque eu tive o direito de me aposentar pelo Aerus um dia antes da liquidação, por já ter os requisitos completos, mas tinha que parar de voar.

Continuei a voar e em julho a Varig parou de voar e demitiu todos, menos eu e um grupo de comissários, porque havia um acordo sindical, no qual a Empresa se comprometia a não despedir ninguém com idade  entre 52 e 55 anos, estabilidade Aerus, e a Varig cumpriu, porém, nós não recebíamos o salário, e nem voávamos, porque não mais existia a Varig, as linhas foram todas para a VarigLog e nós éramos funcionários Varig.

Concluindo, para poder receber pelo Aerus pedi para ser demitida, fui ao Aerus, assinei minha aposentadoria, comprovando que tinha sido demitida da Varig.

Você disse anteriormente que “infelizmente acho que um dos motivos do endividamento da Varig foi o fim da ponte aérea”…

É isso aí, eu disse.

Entre o problema das tarifas, o fim do domínio da Varig na ponte não foi bom.

Mas o pior para a Varig não foi isso e sim uma vingança branca do PT, vou ser mais clara, "POLÍTICA", o Governo Militar fechou a Panair do Brasil e o PT fechou a Varig. Só houve uma pequena diferença: a Varig ficou com os trabalhadores da Panair, enquanto os trabalhadores da Varig e aposentados ficaram a ver… navios.
 

E eu era PT doente, rs,rs… meu primeiro namorado foi preso como terrorista no início da decada de 70, julgado em Tribunal Militar, ficou sob o AI-5 e só conseguiu voltar para a PUC, na decada de 90, quando se formou em História.

Mas o PT estaria se vingando de quê ou de quem?

O PT, do Governo Militar, porque ajudou a Varig, ou seja, deu todas as linhas da Panair do Brasil para a Varig, inclusive favoreceu a Varig na compra da Cruzeiro do Sul.

Vamos recordar, a Cruzeiro ia ser comprada pela Vasp, até sexta-feira estava tudo confirmado, e no fim de semana a Varig comprou a Cruzeiro do Sul…

A única coisa que o PT se esqueceu é que o Fundador da Varig, na época em que a Panair fechou, presidente  Ruben Berta, já havia falecido, e que a maioria dos funcionários da Varig, inclusive eu (ai se arrependimento matasse) fizeram campanha para a eleição do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

A retribuição foi essa: as pessoas morrendo, tanto funcionários demitidos (da ativa) e, como os aposentados sem ver nossos direitos nos serem concedidos pela Justiça.                    

Depois do fechamento da Varig exerceu alguma atividade?

Não, mas em 2012 me veio a vontade de entender o que tinha acontecido conosco, juridicamente, e retornei para a Faculdade.

Estou fazendo Direito na Faculdade Mackenzie Rio e acabei de passar para o terceiro ano, ou seja, quinto período. É claro que a minha monografia será sobre o "Conflito de Competências" entre a Justiça do Trabalho e a Vara Empresarial…

Por favor, explique mais para gente que, como eu, não entende de Direito…

Vamos lá, não existe problema na demissão, mas se ela não for por justa causa, como foi no caso a nossa da Varig, deveríamos receber uma indenização. A indenização, é composta de aviso prévio, décimo terceiro salário proporcional , férias mais um terço, se for o caso proporcional também e quarenta por cento do FGTS. Alias, todos esses itens os quais acabei de falar, fazem parte do artigo sétimo, incisos III, VIII, XVII e XXI da Constituição Federal 1988.

Mais uma coisa: O Direito do Trabalho, tem como um dos seus Princípios, o Princípio da Continuidade da Relação de Emprego, cujo significado é o seguinte: o trabalho é por tempo indeterminado, o que significa se uma Empresa comprar a outra deve receber os funcionários da outra (exemplo, a Varig comprou a Cruzeiro e ficou com os funcionários da Cruzeiro, devido a este Princípio).

Ou a sucessão de dívidas trabalhistas por "Solidariedade". A rescisão por solidariedade deveria ter sido paga pela Varilog ou qualquer uma das Empresas pertencentes ao Grupo Varig.

Como isso não aconteceu, muitos entraram na Justiça do Trabalho, inclusive eu, e todos deram com os burros dentro da água. Resumindo, em 2005 foi feita uma nova Lei de Falências a Lei 11101 de 2005, a qual a Varig foi a primeira a usá-la. Como diz a minha professora de Sociologia Jurídica, no Brasil se tem uma enormidade de Leis, mas algumas são prejudiciais e essa é uma. Porque num de seus artigos veta a sucessão trabalhista, criando assim um "Conflito entre a Competência da Justiça do Trabalho com a Competência da Vara Empresarial". É exatamente sobre isso que escreverei como monografia de encerramento do meu curso de Bacharel em Direito, isso se Deus quiser e eu espero que "ELE" me ajude, a mostrar para os meus professores e colegas de faculdade o prejuízo que a Lei 11101 de 2005, causou aos demitidos da Varig.

Você acredita que o Governo venha a propor um Acordo com os ex-trabalhadores da Varig e Aposentados Aerus?

Prefiro esperar o fim do julgamento da "DEFASAGEM TARIFÁRIA", e sentir como o Governo vai reagir, caso a Varig vença. Porque sem acabar o julgamento da "DEFASAGEM TARIFÁRIA”, NÃO ACREDITO EM ACORDO.

Humm... será apodada de 'pessimista', quiçá, 'sabotadora'... 

Pois é, é isso que eu penso, prefiro ser apontada como pessimista, ou sabotadora, a escrever o que eu não penso.

Concordo com todos os movimentos, é importante que ninguém se esqueça de nós, porém, ACORDO, SÓ ACREDITO DEPOIS DO JULGAMENTO DA DEFASAGEM TARIFÁRIA.

Conversas anteriores:

Thomaz Raposo: “A APRUS apenas trabalha no interesse de todos os participantes e isto não é aceito pelo SNA que quer sempre ser o dono da verdade”

Nelson Schuler: "O desmoronamento foi um DESASTRE que causou para mim e meus três filhos muita ARMAGURA e NOSTALGIA"

Rubens de Freitas: “O desespero era grande e eu decidi acabar com a minha vida.”

Jonathas Filho: “a vida tem certas ironias que, perguntadas, só fazem sentido muito depois”

Janda Mendez: "Deixa eu te dizer uma coisa: depois do choque da falência, foi um tal de salve-se quem puder e farinha pouca meu pirão primeiro"

Alberto José: "eu sempre comentei que estavam 'sangrando ' a VARIG!"

Vitor Grando: “há algo de profundamente pessoal na minha crença em Deus"

Aderval Gomes:“ninguém, em sã consciência, pode estar satisfeito com a situação dos aposentados". 

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