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Jogadores da Alemanha posam
com a Taça da Copa do Mundo depois de vencer a Argentina no Maracanã, no Rio.
Foto: Ivan Pacheco/VEJA.com
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Já está mais do que evidente, a esta altura, que os petistas pretendiam transformar a Copa do Mundo numa espécie de máquina mortífera da política. Ânimos exaltados, nacionalismo à flor da pele, a Seleção Canarinho esmerilhando em campo e, ao fundo, aquela velha canção: “Duzentos milhões em ação/ Pra Frente Brasil/ Salve a Seleção…”. A síntese era uma só: “Brasil, ame-o ou deixe-o”. Depois que o PT incluiu, por exemplo, meu nome numa lista negra de nove jornalistas que estariam torcendo contra a Copa e seriam responsáveis pelas hostilidades a Dilma nos estádios, passei a receber insistentes convites: “Por que você não vai embora do Brasil? Por que você não muda para Miami?”. A pergunta me é feita, claro!, por pessoas que insistem em não morar em Cuba, na Coreia do Norte ou na Venezuela. Um recado: não mudo, não! Fico aqui mesmo e quero o Brasil de volta. Sigamos. A pantomima nacionalista-autoritária estava ensaiada, mas deu tudo errado! A Copa, organizada pela Fifa, deu certo. A infraestrutura básica funcionou. As obras de mobilidade não vieram. O país volta a ser nesta segunda o que quer que fosse antes do início do torneio.
Sem ter uma resposta eficiente
a dar, na expectativa de uma nova e estrondosa vaia — que chegou neste domingo!
—, o governo lançou, então, a operação “Caça-CBF”, com o auxílio do
subjornalismo áulico e de certa crônica esportiva que ficaria melhor se fosse
embalsamada e posta no museu, numa atividade com o patrocínio da Caixa
Econômica Federal, do Banco do Brasil e da Petrobras. Descobriu-se que a
confederação é a grande vilã e se falou abertamente na intervenção do estado no
futebol — o mesmo estado que não conseguiu entregar as obras. Os mais afoitos
tinham uma explicação simples e errada para o desastre: a corrupção na CBF, sua
estrutura encarquilhada etc. Digamos que tudo isso seja verdade: que tal a
gente devolver, então, os títulos de 1994, 2002 e da Copa das Confederações? Só
a derrota é filha da corrupção? A vitória não?
É claro que eu acho que a CBF
tem de mudar, mas vamos parar de conversa mole! Há, sim, na expressão feliz de
Aécio Neves, gente tentando criar a Futebras, e eu insisto que é preciso é ter
menos estado e mais mercado no futebol. Ao estado cabe, aí sim, cuidar de
algumas leis estruturantes do futebol — já chego lá. Em maio de 2013, a revista
alemã Der Spiegel publicou uma excelente reportagem (clique aqui para ler versão em inglês) sobre a revolução
havida no futebol do país nos 12 anos recentes. O gancho era o fato inédito de
dois times alemães disputarem a final da Liga dos Campeões: o Bayern de Munique
e o Borussia Dortmund. Como aquilo era possível? Vale a pena ler o texto.
Uma lei obriga, por exemplo —
e, neste ponto, sim, o estado pode entrar — os times da primeira e segunda
divisões do país a manter o que eles chamam “academia” de jogadores. No Brasil,
conhece-se a “escolinha”. Mas não se trata da coisa bisonha que funciona por
aqui, não, de improviso. É preciso manter funcionando centros de treinamento
especialmente voltados para essa atividade. Antes que técnicos de outros países
começassem a visitar a Alemanha para descobrir os seus segredos, como acontece
atualmente, a liga profissional do país mandou técnicos em peregrinação pelos
grandes centros de futebol do mundo — como Espanha e Holanda — para saber como
os outros trabalhavam.
O futebol alemão passou,
revela a revista, por uma revolução tática. Os alemães chegaram à conclusão,
também, de que seu jogo era duro demais. Era preciso mudar uma cultura. Um
trecho da reportagem chama a atenção. Referindo-se a jogadores como Philipp
Lahm (capitão da Seleção) e Bastian Schweinsteiger — que todos vimos sair quase
destruído de campo, com o rosto ferido — diz a revista (traduzo):
“De fato, eles são algo feminis, retraídos, versáteis. No
passado, os fãs do futebol estavam acostumados com os chamados machos Alfa,
jogadores como Oliver Kahn e Stefan Effenberg, que venceram a Liga dos Campeões
de 2001 com o Bayern de Munique. (…) Ou Lothar Matthäus, o líder do time que
ganhou a Copa do Mundo de 1990. Eles chamavam a atenção por seu estilo de jogo
duro e poderoso, por seu comportamento grosseiro e por seus casos rumorosos com
mulheres. Em outras palavras: eram ‘homens de verdade’. Mas isso também os
fazia tediosos. Lahm e Schweinsteiger, ao contrário, parecem eternos garotos.
(…) E isso é uma coisa boa porque o jogo moderno depende de um grupo de
jogadores capazes de fazer quase tudo. Todos eles são igualmente importantes, e
ninguém precisa de um companheiro de equipe que determine tudo e domine o time.
Eis por que foi correta a decisão do técnico da Seleção, Joachim Löw, que tirou
da equipe Michael Ballack, o último dos machos Alfa (…) Ninguém mais precisa de
homens oriundos de um modelo velho e selvagem. Dá-se o mesmo na sociedade. Nós
entramos na era do trabalho de equipe.”
Retomo
Percebam que essa Seleção Alemã formada de caras que são “uns fofos”, para recorrer à expressão de uma das minhas filhas, é parte de um trabalho de educação e de uma tomada de decisão. A Seleção Alemã não começou a ganhar o campeonato quando decidiu criar seu próprio centro de treinamento nas terras quentes da Bahia — os brasileiros ficaram naquela soturna, nesse período ao menos, Granja Comary… Os homens do gelo prefeririam o calor tropical; os dos Trópicos, a neblina… O trabalho vem de longe. Não homenagearam os pataxós por acaso nem mandaram mensagens de agradecimento ao povo brasileiro só porque são bons moços, quase “feminis”, ou “eternos garotos”, como diz a Der Spiegel. Isso tudo é parte de uma estratégia.
Percebam que essa Seleção Alemã formada de caras que são “uns fofos”, para recorrer à expressão de uma das minhas filhas, é parte de um trabalho de educação e de uma tomada de decisão. A Seleção Alemã não começou a ganhar o campeonato quando decidiu criar seu próprio centro de treinamento nas terras quentes da Bahia — os brasileiros ficaram naquela soturna, nesse período ao menos, Granja Comary… Os homens do gelo prefeririam o calor tropical; os dos Trópicos, a neblina… O trabalho vem de longe. Não homenagearam os pataxós por acaso nem mandaram mensagens de agradecimento ao povo brasileiro só porque são bons moços, quase “feminis”, ou “eternos garotos”, como diz a Der Spiegel. Isso tudo é parte de uma estratégia.
Então, sim, está claro que a
CBF tem de mudar, que o mundo avançou nessa área. Mas resta evidente que não
será com intervenção estatal que se vai lograr esse feito. Quando muito, a
legislação pode forçar os grandes clubes a investir efetivamente na formação de
jogadores.
Fim da caipirice
E é preciso também romper o cerco da caipirice, que impede que tanto os grandes clubes como a Seleção contratem técnicos estrangeiros. Não só é preciso que eles venham como urge enviar jovens técnicos para conhecer o trabalho que se faz lá fora. Isso, sim, pode mudar o futebol brasileiro. E, claro!, é preciso tomar cuidado com as cabecinhas tacanhas. Aqui e ali, ouvi e li idiotas a exaltar a equipe costa-riquenha, que só teria jogado aquele bom futebol porque livre das garras do capitalismo e coisa e tal… Trata-se de uma bobagem monumental. Quem está levando a taça para casa é o milionário futebol alemão.
E é preciso também romper o cerco da caipirice, que impede que tanto os grandes clubes como a Seleção contratem técnicos estrangeiros. Não só é preciso que eles venham como urge enviar jovens técnicos para conhecer o trabalho que se faz lá fora. Isso, sim, pode mudar o futebol brasileiro. E, claro!, é preciso tomar cuidado com as cabecinhas tacanhas. Aqui e ali, ouvi e li idiotas a exaltar a equipe costa-riquenha, que só teria jogado aquele bom futebol porque livre das garras do capitalismo e coisa e tal… Trata-se de uma bobagem monumental. Quem está levando a taça para casa é o milionário futebol alemão.
É evidente que é bom uma
equipe contar com Cristiano Ronaldo, com Lionel Messi, com Neymar Jr. Quem não
quer? Mas, só com eles, não se vence uma Copa do Mundo. Sem organização,
disciplina e planejamento, o talento se dissipa e tudo termina no ralo. Com
organização, disciplina e planejamento, consegue-se tudo: até talentos.
Quanto às taras estatistas do
governo e de parte da crônica esportiva, dizer o quê? Fazem parte de um mundo
velho e selvagem. Quem precisa deles?
Título e Texto: Reinaldo Azevedo, 14-07-2014
Só com a queda do Velho, o Novo pode surgir
ResponderExcluirE o Velho, está caindo em todos os segmentos
Abraço Novo
Ivan