quinta-feira, 31 de julho de 2014

O Pato


Jonathas Filho
Há algumas semanas, ainda convalescendo de uma “virose”, deitei-me e comecei a divagar pensando em vitória... a nossa tão esperada Vitória que recomporia muito das finanças das nossas vidas. Adormeci e sonhei. Como sonhador nato, com título auferido já há bastante tempo, me vi sentado em uma daquelas antigas cadeiras de barbeiro olhando para uma pequena televisão em preto e branco, num lugar onde nunca estive antes, mas que me parecia conhecido. Déjà vu? Regressão? Universo paralelo? Quem sabe?

Na tela, um gajo apresentou-se dizendo ser “O Repórter Animal” e que a Cidade de Promessas teria naquele instante o “Momento Bicho ”. No quadro seguinte ele entrevista uma senhora da localidade.
– Boa tarde. Qual o seu nome?
– Dolores das Dores...
– Lindo nome! Qual o seu animal de estimação?
– Ah, seu moço... eu adoro um pato que vive aqui em casa, o nome dele é Brasileiro.       
– Engraçado, Dona Dolores... qual a relação do nome com o animal?
– Sei não, seu moço. Eu nem crio patos; ele apareceu por aqui ainda pequeno e foi ficando... ficando... e ficou. Quem deu o nome a ele foi o Eurípedes, o jardineiro... disse que esse pato tem todo o “jeito” de brasileiro.
O senhor não sabe, mas outro dia quase perdi as minhas poucas economias por causa dele...

Nisso, entra no ambiente o Pato.Todo sestroso e cheio de manha; devia saber que era o alvo da conversa. Malandramente, parecia ter-se “vestido” das melhores penas para tal acontecimento. Eu mal podia acreditar no que via: um pato cheio de meneios e trejeitos de galã, enfatiotado e usando gravata borboleta azul.
Perdido no tempo, saboreei cada gesto e palavra daquela surreal entrevista...

– Bem... a senhora falava que quase perdeu suas economias por causa dele...
– Pois é, seu moço... se sente ali na poltrona, que a história é longa. Um neto meu veio passar uma tarde comigo e ele, o pato, cheio de ciúmes, ficou grasnando alto o tempo todo. O menino, coitado... com a melhor das intenções, foi oferecer-lhe sua simpatia e carinho, levando algumas migalhas de pão dormido. O pato, bruscamente recusou e agressivamente “mordeu-lhe” as mãos. Tive que sair às pressas para levar o menino ao Pronto-Socorro para fazer curativos. Quando lá cheguei, um soldado da Policia de plantão quis saber a causa das lesões. Enquanto meu neto estava sendo atendido por um enfermeiro, expliquei detalhadamente ao agente da lei o que aconteceu e o policial foi taxativo, dizendo que seria necessário preencher um B.O. e que, com certeza, os responsáveis pela criança e o pato, provavelmente seriam chamados para prestar maiores esclarecimentos. Isso é crime, disse ele... de lesão corporal, artigo 121 do Código Penal, com penas estipuladas.

Em seguida, solicitou o nome e endereço dos envolvidos. Quando eu disse que o pato se chamava Brasileiro, ele quase me deu voz de prisão, vociferando que isso era um desrespeito, pois brasileiro não é pato. Disse-lhe também o meu nome e que o menino lourinho era meu neto, Lourenço, de 10 anos, filho da minha filha.

Terminados os pequenos curativos, a inquieta “autoridade” indicou que deveríamos segui-lo até a velha caminhonete da Polícia para virmos para cá buscar o pato “delinquente”, para as devidas acareações com o doutor Delegado. Daqui fomos para o Distrito. Com o pato a tiracolo e abraçando meu neto, esperamos em pé por mais de uma hora para sermos atendidos pelo Delegado que, ao chegar, informou debochadamente que tinha saído para uma diligência. 
                                                                                                                                     
Entrem, emitiu num tom jocoso. Soldado, relate os fatos, gritou... enquanto palitava os dentes e passava um encardido lenço na testa suada.

Mediante as informações passadas pelo soldado de polícia, peremptoriamente o Delegado reagiu num excesso de destempero: “Isto é um atentado à vida. O pato está preso e estabeleço a fiança de cinco mil reais para ser solto”. 
– E o que a senhora fez?, perguntou o repórter.
– Eu ponderei com o Delegado que não tinha posse daquela quantia... nem lá, nem em casa e nem no banco e desatei a chorar. Soluçando disse também que era uma aposentada do Aerus, do plano 1, e que não tinha aquele dinheiro.

Eu olhava para a tela e me comovi com a narrativa daquela senhora que disse ter seus soluços interrompidos pelo garoto, o neto Lourenço, que interveio esbravejando:
 - Pois é Vovó... a senhora é vítima do sistema e ainda vai ter de pagar o Pato?
Nesse momento do sonho, devo ter me virado na cama e acordei.

Passei o resto da noite acordado pensando que todos nós continuamos “sonhando” em receber nossos haveres por direito legítimo, entretanto, o que temos visto são alguns colegas escolherem seus lados e “se encolherem neles”, ignorando outros bravos combatentes, sem somar esforços a eles, como se o problema não fosse comum a todos ou os interesses fossem diferentes.

Sem a união de todos em torno da Aprus, a única associação que de fato representa os participantes do fundo de pensão Aerus, continuaremos “queimando combustível” sem conseguir atingir a Vitória ainda em vida e “ficaremos é pagando o pato”, somente reclamando como vítimas desse sistema injusto, infame e dissoluto.
Título, Imagem e Texto: Jonathas Filho, é um galo velho. 31-07-2014

2 comentários:

  1. Jonathas, vc é um prosador nato. Com essa mente imaginativa vc pode candidatar-se a escritor. Que tal um livro sobre a saga Aerus? Pense nisso...

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  2. Kirido Habitzreuter, obrigado pela sua generosidade mas, acredito que a minha mente imaginativa ainda é muito pequena para tentar essa "cândida altura". Desculpe o trocadilho porém, tenho certeza de não ser tão brilhante assim. Quanto ao livro sobre a saga Aerus; todos nós o estamos escrevendo. Você, o José Manuel, o Bolognese, o Jim Pereira, a Angel Nunes, eu e outros mais, estamos escrevendo essa saga com a indignidade que nos é perpetrada pela injustiça reinante e com lágrimas nos olhos, no coração e nos bolsos. O livro terá muito mais do que 3130 páginas; sendo uma para cada dia, enquanto durar essa aflição. Grande abraço. Jonathas Filho.

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