quinta-feira, 20 de outubro de 2016

Francisco Seixas da Costa, o Trump português

Maria João Marques
Eu, sem saber como, sempre tive um certo iman para os maluquinhos da net. Por estes dias aparentemente tenho um novo observador bilioso. No meu texto da semana passada no Observador, contei o miserável tratamento que Guterres deu ao seu ministro das finanças, Pina Moura, publicamente despedido enquanto estava na AR a defender o orçamento retificativo de 2001. Logo veio Seixas da Costa comentar, dizendo mais ou menos que eu era uma ignoramus e contava a aldrabice que eu confundira Pina Moura com Manuela Arcanjo. Não sei se a aldrabice se deve a alzheimer precoce ou a gosto pela mentira (ou outro motivo igualmente pouco edificante), mas o certo é que Seixas da Costa não resistiu a contar a dita aldrabice com aquele ar sobranceiro de quem dá lições paternalistas a uma mulherzinha, coitada, e que os machistas tantas vezes adotam.

Entretanto voltou à carga. Ficou zangado com Vasco Pulido Valente porque este não ficou de coração pleno de harmonia universal, nem marcou a correr viagem para o Nepal para quatro meses de meditação celebratória, com o novo emprego de Guterres. Zangou-se também com um cronista que escreve na Sábado e no DN, Alberto Gonçalves of course, a quem acusa de azia – sem perceber que fala de uma qualidade que é afinal sua. E, ainda, com uma ‘uma caixadóculos direitolas de taxa arreganhada’.

Não faço ideia se a direitolas caixa de óculos é a yours truly, e se for até fico feliz de causar irritação na personagenzinha, que há estirpes de pessoas que eu gosto de irritar. Melhor ainda se irrito por ser sorridente. Percebo que Seixas da Costa prefira o ar macambúzio e sério de quem acha que está a salvar o mundo durante todos os minutos que passa acordado, ou a circunspeção sisuda de quem não pode falhar na missão que Marx lhe comunicou durante os seus sonhos mais deliciosos – tudo coisas que se encontram em abundância na esquerda. Prefere também certamente o riso risível a que se entrega ao ler factos indisputáveis das tropelias de Guterres.

Em todo o caso, sobre Seixas da Costa não me interessa muito falar. Se quiserem, podem ir ler o José Meireles Graça reduzir a picadinho a gelatina Seixas da Costa. Mas há um ponto importante. É que só para a cronista feminina a gelatina refere uma característica física: a necessidade de usar óculos. (E, no meu caso – ou no de outra mulher -, o gosto, como percebe qualquer pessoa pensante, porque se não me achasse piada de óculos não os usaria. Donde, concluiria uma pessoa pensante, dizer que eu uso óculos não é algo que me perturbe.) Claro que a seguir, como é sonso de mais (e gelatina) para assumir que queria reduzir a dita cronista à sua característica física de caixa de óculos – sendo que aos cronistas masculinos (oh surpresa) não calhou fazer elaborações fisiológicas – veio acusar outros de falta de sentido de humor. E declarar-se utilizador de óculos.

Ora bem, tendo nos últimos dias (e meses) a criatura Trump sistematicamente feito comentários sobre o físico das mulheres que lhe fazem chegar a pimenta ao nariz, parece-me que é hora de expormos as criaturas malcriadas, trogloditas e machistas a quem salta logo o comentário às características físicas das mulheres que ousam estar no espaço público. Comigo, além do recente bilioso, aconteceu há pouco tempo com o Quadros. Recentemente uma amiga de facebook – que conheço pessoalmente e é bem gira – lá levou com avaliação física by Alfredo Barroso, no meio de uma disputa facebuquiana. (Ah, e que mulher portuguesa não anseia por saber a avaliação que dela fazem portentos de beleza como os todos aqui referidos, de Trump a Barroso?)

O que tem mais piada nisto tudo é que este género de comentários é sempre feito por homens que estão mais para o lado de Quasimodo que para o de Adónis. Até me parece que é uma vingança contra o mundo que porventura já lhes trouxe umas tantas tampas de mulheres. No fundo, estão a acertar contas. Pelo que, além de lhes darmos os epítetos (de australopitecos) merecidos, devemos também informá-los que se tornam ainda mais ridículos, sobretudo junto do mulherio.

Quanto a Seixas da Costa, só me resta repetir o que disse no twitter, depois de ser insultada pela elegante gelatina (tão gelatina quanto o ídolo Guterres): o chá que se bebe em adulto nas embaixadas é demasiado tardio para ainda ter benefícios naquilo que importa. E cumprimentos dos meus óculos. Não são os que eu uso normalmente. Comprei-os para os dias de mood anos 50. Mesmo sendo os óculos dos dias fancy, têm mais gravitas que a pomposidade possidónia do reverendíssimo senhor embaixador. Ah, e olhe que o Gambrinus (onde eu por acaso ia muito com certas pessoas próximas que felizmente já não são) é, como diz o meu filho mais velho, muito século passado. Do tempo em que os homenzinhos podiam (tentar) reduzir a discussão das opiniões proferidas pelas mulheres a graçolas sobre as suas características físicas – e escapar.


Aaaaah, esqueci-me. Obrigada, reverendíssimo embaixador, por me agrupar com dois cronistas como VPV e Alberto Gonçalves. Raras vezes recebi tamanho elogio ao que escrevo.
Título, Imagem e Texto: Maria João Marques, O Insurgente, 18-10-2016

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