Aparecido Raimundo de Souza
UMA COISA
SE TINHA como certa, além da morte. Mário Pertuito Estinhar era feio. Bota
deselegância nisto. Mais disforme que briga de foice no escuro. Não. Briga de
foice no escuro, certamente fichinha, se comparada ao sujeito. Mais assustador
que o filho caçula do Tinhoso, com a sua atual esposa, Dilma Rouboussett.
O capetinha temporão, batizado como Luiz Inácio (em
homenagem ao ex-presidente Lula, que prometeu um tríplex ao senhor das
profundas, em Guarujá) todo dia, pela manhã, aprendia, com seu pai Rabudo, a
fustigar, com um tridente, as novas almas chegadas ao inferno. Isto não vem ao
caso.
Mário Pertuito Estinhar, de dezoito anos, queria
estudar e ser oftalmotorrinoralingologista. Não dava, pelos poucos recursos do
pai. O estudo da matéria, como o nome da profissão, era longo demais. Afora
isto, morava em Santa Cruz, final da linha da Central do Brasil. Santa Cruz
nada. Croácia. Um bairro perto da casa, ou melhor, mesma avenida do famoso
Wellington Menezes de Oliveira (aquele maluco que em 2011 massacrou um monte de
crianças na escola municipal Tasso da Silveira, em Realengo, zona oeste do Rio
de Janeiro). Isto também não vem ao
caso.
Nosso objetivo é o Mário Pertuito Estinhar. Feio
até dizer chega. Mário nascera filho de Francisco Pertuito (carinhosamente
Chiquinho Pertuito) e dona Sebastiana Pertuito Estinhar. O Estinhar, portanto,
ascendia da mãe, dona Sebastiana (conhecida na Croácia e adjacências como dona
Aninha Bombril) em face de trabalhar com um punhado de coisas diferentes.
Na segunda, por exemplo, dona Aninha lavava e
passava, para uma família em Realengo. Na quarta-feira, tomava conta de um
idoso em Bangu, e, nos finais de semana, fazia um bico como doméstica em Senador
Camará. Logicamente isto também não vem ao caso.
Igualmente feios, o casal tinha um orgulho danado
do Mário. Acentuado este orgulho, mais até que a de Maíra, a irmã de Mário,
dois anos mais nova. Maíra nascera para ser doméstica, casar, ter filhos, cuidar
do marido. Já o Mário... o rapazola se mostrava craque com a bola. Num campo de
futebol, não havia quem alcançasse a sua performance, o seu desempenho.
Driblava como ninguém. Assemelhava ao Neymar Júnior. Ou melhor, Neymar perto
dele, merda elevada ao quadrado. Recentemente o técnico Abel Braga do Flamengo,
ao vê-lo atuar numa partida de futebol, em Japeri, fizera um convite para que
entrasse para o clube.
Até aqui tudo nos conformes? OK! Por ser um exímio
jogador, um quase insubstituível atacante, Mário recebia convites para jogar em
pequenos clubes. Assim, pouco parava em casa.
Viajava para cima e para baixo. Filiado a uma galera da própria Croácia,
onde o time “Os garotos Croacianos imbatíveis” fosse jogar, não podia faltar o
Mário desengraçado. A sua difícil e sofrida feiura chegou a tal ponto que os
colegas de bola lhe arranjaram um apelido esquisito, quase desproposital,
verdade seja dita.
Entretanto, como a criatura, de fato, não poderia
jamais ser comparada a um Cauã Reimond, ou ao Reynaldo Gianecchini. Seria
pretensão demais. Para concorrer com ele, o Russo (lembram do Russo?)
assistente de palco da Rede Globo, desde a época do Chacrinha, um galã. A
alcunha que lhe arranjaram caíra nos conformes. Mário, coitado humilde, ignaro,
dócil e manso, pouco se lixava se a turma o achava malparido e desengonçado.
Por ser magro e sem simetria (lembrava um funil
espaçoso em cima e magérrimamente afilado do pescoço para baixo) a primeira
vista dava medo encarar a figura. Além de ser náfego dos quadris, tinha a voz
iscnofônica. Assim, de funil chegaram ao meigo “Infundibuliforme”.
Para aqueles que não sabem, esta palavrinha se
traduz, ou se entende, por tudo aquilo que tem a forma de um cone, um utensílio
terminado por um tubo de boca estreita.
O epíteto pegou. Por sorte ou azar, se alastrou de tal maneira que o
tópico virou febre. Como doença até então desconhecida, se fez aquilatado e
cotado num abrir e piscar de olhos.
De repente, o Mário Pertuito (pertuito passagem
estreita ou boca miúda) feio saiu de cena e a sua exterioridade passou a ser
conhecida pelo novo simulacro. “Amanhã jogaremos na Ilha do Governador. Chamem
todo mundo. Não esqueçam pelo amor de Deus, do Estinhar (estinhar significa
tirar o mel da abelha desde que ela seja abelha e não um zangão) digo, do
‘Infundibuliforme’”.
Nesse tom, o Mário, ou melhor, o
“Infundibuliforme”, se fosse olvidado, o técnico “Arara” virava não uma arara.
Metamorfoseava um sugócio leão rugente e rugoso, capaz de devorar vivo, um por
um, os atletas sob a sua batuta, e ainda, de sobremesa, comer o Chicozinho (o
gandúla) e palitar os dentes com a irmã dele, a Evinha, que, de linda, lembrava
a atriz Sabrina Petráglia.
Em pouco tempo, o jovem “Infundibuliforme” virou
uma celebridade. Não demorou, o time Croaciano passou a disputar partidas fora
do Rio de Janeiro. Da velha Van Sprinter 2010 pularam para um ônibus Marcopolo
1990/1991. Velho, mas confortável. Dava de dez a zero, na Van.
Em seguida, mudaram de mala e cuia para o aeroporto
Santos Dumont, centro do Rio de Janeiro de onde partiam voos Brasil afora.
Houve um jogo em Porto Alegre, que o time croaciano enfrentou um de Canoas. O
locutor da Rede Globo, Cléber Machado, narrou um pedacinho que, diga-se de
passagem, ganhou o mundo:
“Lá vai Rimão tentando se livrar de
‘Infundibuliforme’. O carioca de Santa Cruz não dá trégua. Parou, preparou,
deixou pra trás Rimão, passou por Tulio... olhou pra frente... olhou pra frente
e mandou bala. Goooooooooooool... ‘Infundibuliforme’, ‘Infundibuliforme’ é o
nome dele. Espetacular’”.
De fato, “Infundibuliforme” é zafimeiro. Tem muito
ustório (não confundir com história). Nada a ver. Dispensa este moço da Croácia, um bairro de
Santa Cruz, qualquer tipo de isagoge.
“Infundibuliforme”, lado outro, está no melhor da sua zina. Seu pertuito
não é uma passagem estreita para o nada. Pelo contrário, o jovem
‘Infundibuliforme’ está ligado, direcionado diretamente para o estrelato.
Logo este garoto de dezoito anos alcançará o
alcantil do sucesso e da fama. Sua trilha brilhante não é um macróstico. Em
breve, todos nós veremos o seu triunfo suscático. Não, não veremos. Ontem o
espertalhão do técnico Arara às escondidas vendeu seu passe para a seleção da
República Federal dos Balcãs. A partir de março deste ano, ele
‘Infundibuliforme’ passará a jogar na Bosta, perdão, na Bósnia.
Título e Texto: Aparecido Raimundo de Souza, de São Paulo, Capital. 5-2-2019
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