segunda-feira, 17 de julho de 2023

A liberdade educacional

Fausto Zamboni

A liberdade educacional é também uma defesa contra a rigidez que fatalmente acomete os grandes sistemas que, devido ao tamanho e à complexidade, têm dificuldades em adaptar-se às situações sempre novas da vida social.

Além disso, a diminuição das responsabilidades dos pais provoca um afrouxamento moral de toda a sociedade. Por isso, milhões de americanos preferem educar os filhos em casa.

A aprendizagem, para Ivan Illich *, deveria resultar de um encontro espontâneo entre pessoas com os mesmos interesses, de forma semelhante ao que vinha ocorrendo, há milénios, na cultura superior: os intelectuais se reuniam em cortes, salões, cafés ou qualquer outro ambiente – como se vê nos diálogos socráticos – para discutir os assuntos de interesse comum.

Jonh Taylor Gatto salienta que a formação da maior parte dos pais fundadores dos Estados Unidos foi bastante flexível e que pouco deveu-se à escola. A liberdade de ação foi fundamental para que os novos líderes formassem a própria personalidade em resposta às necessidades da situação.

Abraham Lincoln [foto], orador e escritor de relevo, não frequentou a escola por mais de cinquenta semanas, e o resto aprendeu em casa e no contato com a realidade viva da sua época.

Foto: Mathew Brady

David Farragut, o primeiro almirante da marinha dos Estados Unidos, foi nomeado aspirante a oficial com dez anos, quando participou de seu primeiro combate naval. Com doze anos, já comandava a primeira tripulação, conseguindo dominar as ameaças de sublevação; aos quinze anos, foi caçar piratas no Mediterrâneo. Estudou a mecânica da ação vulcânica estimulado pela impressão que lhe deixou uma erupção do Vesúvio. Numa longa estadia em Túnis, o cônsul norte-americano lhe ensinou francês, italiano, matemática e literatura.

Thomas Edison logo deixou a escola, por ser considerado um aluno defasado. Passou o resto da infância vendendo periódicos e aos doze anos foi trabalhar em trens, onde fazia pequenos serviços. Aproveitando uma velha máquina tipográfica, começou a imprimir seus próprios panfletos sobre as vidas dos passageiros e sobre as coisas que via nas viagens. Em pouco tempo tinha mais de quinhentos assinantes.

Durante a guerra civil, por estar mais perto dos canais de informação, conseguiu vender em grandes quantidades. Tornou-se depois, sem a ajuda da escola, um grande inventor.

A mesma origem humilde, independência e capacidade de empreender marcaram a vida de Benjamin Franklin, cuja erudição e domínio de várias línguas seriam incompreensíveis para a pedagogia moderna.

Aprendeu a ler, na infância, com a Bíblia, com livros de polêmica teológica e com clássicos como Plutarco e Defoe. Aperfeiçoou a escrita imitando o estilo dos periódicos, nos intervalos de uma jornada semanal de sessenta e quatro horas. Para aperfeiçoar a precisão e a elegância do vocabulário, transcrevia os artigos em versos e depois os transformava novamente em prosa, confrontando com o original para corrigir possíveis falhas.

Aos dezesseis anos, decidiu superar por conta própria as deficiências em matemática.

Lia também os livros de Locke e os diálogos socráticos, procurando imitar nas conversações o estilo do “humilde perguntador cético”.

George Washington, apesar de ser originário de uma família rica, ficou órfão aos dez anos e sem direito a herança, pois não era o primogênito. Considerado inculto por seus contemporâneos, entroa na escola aos doze anos, já sabendo ler e escrever. Lá, durante dois anos, aprendeu geometria, trigonometria e agrimensura (seu primeiro emprego, antes de completar dezoito anos.

Foto: Gilbert Stuart Williamstow

Nessa idade, analisava por conta própria documentos legais, recibos, letras de câmbio, arrendamentos e patentes.

Estudou boas maneiras, copiando um velho livro dos jesuítas e aprendeu, por conta própria, geografia e astronomia.

Antes de completar dezoito anos, havia lido vários clássicos, como Fielding, Defoe, Sêneca e Júlio César. A par desses interesses não desdenhou instruir-se em corte e costura e construiu o projeto arquitetônico da própria casa.

Aos vinte anos, dava seus primeiros passos no empreendedorismo industrial e no cultivo de produtos agrícolas. Não apenas plantou trigo, mas investiu em moinhos e na comercialização da farinha, prosperando consideravelmente.

Sua participação na independência americana foi decisiva: além de ser general na guerra de independência, foi um dos autores da constituição americana e o primeiro pre3sidente do país.

Texto: Fausto Zamboni, in “Contra a Escola”, páginas 100 e 101
Digitação: JP, 17-7-2023


* Ivan Illich, Filósofo Austríaco, Sociedade sem escolas, Petrópolis Vozes, 1985.

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