sexta-feira, 14 de julho de 2023

[Aparecido rasga o verbo] As mentiras que as mulheres gostam de ouvir

Aparecido Raimundo de Souza

Ela:
— Meu bem, eu te amo. Não posso viver sem você ao meu lado.
Ele:
— Nunca te trai. Nunca! Se o fizesse estaria enganando à Deus.
Ela:
— Me ama tanto assim?
Ele:
— Amo!
Ela:
— Muito?
Ele:
— Demais. Você é o amor da minha vida.
Ela:
— Jura?
Ele:
— Por tudo quanto é sagrado. Decididamente não posso viver sem você.
Ela:
— E se eu morresse?

Ele:
— Com certeza morreria de desgosto.
Ela:
— Você não sente uma quedinha pelo seu antigo caso, a Georgina?
Ele:
— Amor, só disponho da luz dos meus olhos pra você.
Ela:
— Tenho ciúmes até das roupas que você usa. Quer saber de um detalhe? Quando te vejo conversando com outras garotas mais jovens que eu, penso comigo: “ — será que ele está querendo me trocar?.” Você é o meu último degrau.
Ele:
— E você a minha derradeira fêmea.
Ela:
— A propósito: teria coragem de me bater?
Ele:
— Nem com uma flor.
Ela:
— Já beijou outra depois que está comigo?
Ele:
— Só minha mãe e minhas irmãs. E, mesmo assim, no rosto.

Ela:
— Nenhum selinho com uma amiguinha mais safadinha?
Ele:
— A minha safadinha é você, lembra?
Ela:
— Se uma vagabunda lhe dessa bola no meio da rua, o que faria?
Ele:
— Chutaria pra gol.
Ela:
— Pra gol?
Ele:
— Claro que não, minha fofinha. Pra escanteio. O dia que você faltar, juro, morrerei de tédio. De solidão. De tristeza. Deixarei de comer, de beber... serei capaz de chegar aos extremos: pôr fim à vida. Meu amor por você é eterno. “Quando estou com você, estou nos braços da paz.” — Lembra desses versos? É de uma música interpretada pela Maria Bethânia.

Ela:
— E quando brigamos?
Ele:
— Mais me apaixono por você.
Ela:
— Me acha chata?
Ele:
— Chata é a mulher do nosso vizinho.
Ela:
— Eu engordei além da conta? Estou barriguda, cheia de estrias?
Ele:
— Não faz diferença. Não te troco por nenhuma magrinha.
Ela:
— Então você me acha uma baleia?
Ele:
— Claro que não, minha princesa. Olha que corpinho de sereia, que sorriso, que olhar, que meiguice, que voz suave e macia... você é a donzela mais bonita deste mundo.
Ela:
— Só deste?

Ele:
— E de outros mais que por acaso existirem. Ponha na sua cabeça o que vou dizer: você é a paixão da minha vida. O meu sol, o meu vento, o meu tudo... resumindo: você é a musa dos meus sonhos. Sem você a meu lado sou vazio profundo, caminho sem volta, dia sem sol.… noite sem estrelas...
Ela:
— Nossa como você está romântico!
Ele:
— É o seu amor que me faz ser assim. Eternamente cativo de você.
Ela:
— Vem cá. Me beija.
Ele:
— Não havia reparado em seu cabelo. Puxa! Você está maravilhosa, divina.

Os dois caem em francas risadas. Chegam a chorar de tanta emoção.
Ela:
— Percebi que hoje você fez a barba. Uauuu...!
Ele:
— Só para não te arranhar.
Ela:
— Cortou o bigode...
Ele:
— Para você ver melhor meu sorriso estampado, e, em tempo algum, se esquecer que ele só existe pelo fato de você estar aqui. Vamos fazer amor?
Ela:
— Agora?
Ele:
— Já.
Ela:
— Não tomei banho. Eu estava na cozinha fazendo seu papazinho...
Ele:
— Que diferença isso faz? Quero você do jeito que está: sujinha, suada, cheirando a cadelinha molhada...

Ela:
— Só um banho!
Ele:
— Depois. Temos o tempo inteiro ao nosso dispor... vamos para a cama.
Ela:
— Preciso lavar a...
Ele:
—... Nada disso. Quero você agora e pronto. Me transformarei no seu cachorrinho. Vou abanar meu rabinho, e, em seguida, te lamberei da raiz dos pés aos dedos dos cabelos. Miaaaaaauuuuuu!...
Ela:
— Como é que é?!
Ele:
— Eu disse que te lamberei da raiz dos cabelos aos dedos dos pés.
Ela:
— Ah, bem. Pensei que estivesse ficando meio pancada... ouvi errado.
Ele:
— Não, minha flor. De forma alguma. Eu é que troquei as bolas.
Ela:
— Espere. Isso que você fez aí não é a voz de um cãozinho, mas de um gato. Em qual dos dois você vai se transformar, afinal?

Ele:
— Em ambos. É pra você ver como sou louco e como é grande, grande, muito grande o meu amor por você!
Ela:
— Meu Roberto...
Ele:
— Minha Angélica...
Ela:
— O que? Quem é a Angélica?
Ele:
— Eu... eu... eu...
Ela:
— Fala. Quem é Angélica?
Ele:
— Quem falou em Angélica?
Ela:
— Você, seu safado. Está me colocando chifres?
Ele:
— Nem pensar nessa possibilidade. E quem é Roberto?
Ela:
— De onde você tirou este Roberto?
Ele:
— Você acabou de vomitar... “meu Roberto”. Quem é o pilantra? Fala, infeliz... quem é Roberto. Fala, ou...
Ela:
— Ou o quê?

Ele:
— Ou apertarei seu pescoço com toda minha força e fúria até você colocar um metro de língua fora do comedor de lavagens. Vamos, desembucha.
Ela:
— Não sei, meu amor... quem é Angélica?
Ele:
— Não mude de assunto.
Ela:
— Foi você quem mencionou Angélica.
Ele:
— Sua infeliz, safada, baranga... pu...

Em contínuo, o sujeito cumpre a promessa. Pula com toda gana e ódio na jugular da beldade e a aperta com toda a força de suas mãos. A pobre criatura mal consegue respirar. Balbucia, aos peidos.
Ela:
— Ca... cal... ma... me... sol... sol... ta... is... so... é femi... femi... ni... ni... cici... cicidioooooo...

A pressão na garganta se faz cada vez mais contundente. A desditosa se estrebucha de dor. Perde a voz. Fica branca. Agoniza. Sem ter como respirar e escapar das garras potentes do tresloucado, literalmente bate com as doze.

Título e Texto: Aparecido Raimundo de Souza, da Lagoa Rodrigo de Freitas, Rio de Janeiro. 14-7-2023

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