Pedro Barata
Comecemos pela grande questão: como é possível que, quando estamos na sétima temporada de Sérgio Conceição no banco do FC Porto, o plantel pareça cada vez menos do agrado do treinador, menos à sua imagem? O que aconteceu para que, apesar de todo o peso e importância que o técnico ganhou no clube, fiquemos com a ideia de que cada vez menos jogadores lhe enchem verdadeiramente as medidas, que os futebolistas à disposição são uma espécie de mal menor com o qual o antigo internacional tem de trabalhar?
A cada janela de
transferências, o FC Porto de Sérgio Conceição vai-se tornando menos num FC
Porto de Sérgio Conceição. Vai-se dando um paradoxo: à medida que o
treinador se tornou cada vez mais central no clube, ao mesmo tempo que o
projeto desportivo se foi reduzindo ao que o dono do banco poderia fazer, o
plantel foi fugindo do gosto e das pretensões de Sérgio Conceição. O FC
Porto em que Sérgio Conceição ganha peso — como figura máxima na comunicação,
como imagem desportiva, como grande argumento competitivo — é um FC Porto ao
qual vai chegando gente que, claramente, não satisfaz os desejos de Sérgio
Conceição.
Neste labirinto em que os dragões estão, faltam as bússolas do
passado recente, os pilares da era Conceição. Otávio e Uribe saíram no verão,
Marcano está lesionado, Marega, Herrera ou Telles são assunto de outrora.
Taremi está mas, entre um contrato a acabar e a escassez de rendimento, parece
ausente. Pepe cumpre 41 anos em fevereiro e, como se viu em Alvalade, o tempo também passa pelo eterno
defesa.
Em sentido inverso, o próprio treinador convidou-nos, na conferência de antevisão do dérbi do Porto, a ir ao Transfermakt. E, por muito que Conceição fale em tempo de vacas magras, o portal mostra que tem havido investimento azul e branco: esta época foram Iván Jaime (€10 milhões), Nico González (€8,4 milhões), Alan Varela (€8 milhões) ou Fran Navarro (€7 milhões). Estes €33,4 milhões valeram, até ao momento, dois golos — um deles de Navarro, que já foi cedido ao Olympiacos — e zero assistências na temporada. Varela é o único que foi titular em mais do que cinco dos 27 encontros dos dragões na temporada.
Vamos à temporada anterior.
Chegaram David Carmo (€20 milhões, a mais cara transferência da história entre
emblemas nacionais), Gabriel Veron (€10,34 milhões), Marko Grujic (€9 milhões),
Stephen Eustáquio (€4,21 milhões), André Franco (€4 milhões) e Samuel Portugal
(€2,5 milhões). Época e meia depois destes €50,4 milhões terem sido investidos,
Carmo está na equipa B, Veron foi cedido ao Cruzeiro, Grujic só foi titular em
duas das 16 rondas do campeonato, Samuel Portugal nem se estreou pelo FC Porto,
André Franco tem uma utilização intermitente. Resta Eustáquio, o único dos
12 futebolistas que chegaram ao Dragão nos últimos 18 meses — há ainda os
cedidos Francisco Conceição e Jorge Sánchez — com o estatuto de titular.
O desconforto com a
matéria-prima à disposição parece ter chegado ao espírito da equipa, que hoje
atua como um conjunto descrente, perdido, sem chama ou golpe de asa. Este é,
estatisticamente, o pior FC Porto de Conceição à 16.ª jornada, o que somou
menos pontos (35, abaixo dos 36 da época passada), marcou menos (23 golos,
quando o anterior mínimo com o técnico eram 34) e perdeu mais (três derrotas,
nunca passaram das duas), mas talvez o pior nem sejam os números. O mais grave
é a sensação de falta de soluções, é a desvalorização que o técnico faz do
próprio plantel, escudando-se nas tais “vacas magras” e numa falta de
experiência ou traquejo. O mais grave é pensar que o FC Porto tem 35 pontos,
mas não seria difícil que tivesse menos, bastando recordar os triunfos cheios
de sofrimento contra Farense e Rio Ave, frente a Desportivo de Chaves ou
Vitória SC e Gil Vicente.
Em busca da identidade
perdida, Sérgio Conceição diz que tem de recorrer mais aos jovens da formação.
Mas, paradoxo dos paradoxos, quem tem sido aposta não é da formação nem pode
ser propriamente considerado jovem. Zé Pedro tem 26 anos (faz 27 em junho)
e chegou ao clube já com 24, após ter atuado nas equipas principais de Fafe ou
Estrela da Amadora; João Mendes faz 24 anos em abril e chegou aos 21 ao FC
Porto, já depois de ter realizado duas épocas como sénior no Vitória SC.
Fora as contradições com o
plantel, o 2023/24 azul e branco é um caminho de equívocos e dúvidas, um estado de espírito
inquieto, intranquilo, sem certezas. A pressão alta e agressividade parecem
ter-se ido embora, a solidez defensiva também, até a força nos grandes jogos
desapareceu, ou não houvesse já duas derrotas contra o Benfica e uma frente ao
Sporting.
Sérgio Conceição, treinador de
competência mais que comprovada, está longe de ser o único culpado do momento
do FC Porto. Na verdade, ele é o grande pára-choques do clube nesta altura,
quem leva com toda a instabilidade que surgiu, surge e surgirá, à espera do que
tragam as eleições que se avizinham. Mas é inegável que este FC Porto, em que
Sérgio Conceição ganha relevância como figura central à medida que referências
do campo ou dos gabinetes se apagam, se parece cada vez menos um FC Porto de
Sérgio Conceição.
Há um ano, em janeiro de 2023,
os dragões venceram a Taça da Liga. Com aquele triunfo, tornaram-se detentores
de todos os troféus nacionais, juntando aquela competição ao campeonato, Taça e
Supertaça. Passados 12 meses, a Supertaça foi perdida e a Taça da Liga também.
Amanhã (20h45, RTP1/Sport TV2) há duelo contra o Estoril, a besta negra dos
últimos tempos, para a Taça de Portugal. Os dragões chegam à Amoreira sem
margem de erro.
Título, Imagem e Texto: Pedro
Barata, Tribuna Expresso Newsletter, 8-1-2024
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