Bruno Farias Lopes
O PS é hoje um partido
largamente irrelevante – mas não pelas razões frequentemente apontadas. O PS
não é irrelevante porque é impossível fazer oposição tendo pedido, negociado e
assinado o Memorando da troika. O PS não é irrelevante porque o governo tem maioria
absoluta. O PS é irrelevante essencialmente por opção. Quando o maior partido
da oposição escolhe este caminho num momento crucial para o país torna
relevante a sua irrelevância.
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António José Seguro, foto: Miguel A. Lopes/Lusa |
As pessoas do PS têm condições
para ser “oposição responsável”, desde que estejam dispostas a admitir um
facto: foi um governo socialista, já em versão zombie, a negociar e a assinar
um acordo com a troika. Não se pede ao PS que exulte com o Memorando, como
parece ser o caso de alguns membros do governo. O que se pede é um reconhecimento
da realidade recente.
O problema é que o PS – o da
liderança de António José Seguro e o outro, da facção rebelde socrática que se
senta no parlamento – não se quer lembrar do passado recente.
O PS de Seguro tem consciência
do beco em que o país se enfiou, o que é um dado positivo e novo no PS, mas
parece submeter qualquer tentativa de fazer oposição útil a essa tomada de
consciência. A lengalenga da “paixão do governo pela austeridade” e do “é
preciso mais crescimento” é a melhor forma que o líder do PS encontra de
disfarçar em público o facto de em privado ser uma muleta acrítica do governo.
Já o outro PS, o grupo de
rebeldes socráticos, prefere adoptar uma leitura estranhamente restritiva do
Memorando. Para esta facção, quando o PS aprovou o Memorando assinou apenas
aquele conjunto específico de medidas publicadas em Maio de 2011. É preciso
fazer mais porque há derrapagens e surpresas? Não pode ser, eles não assinaram
isso. É preciso mais porque há que dissipar dúvidas e mostrar que já que
estamos neste barco a coisa é mesmo para cumprir? Não pode ser, eles não
assinaram a favor disso. O problema desta posição é que o PS assinou um
programa para cumprir objectivos – são as metas que contam e não um conjunto de
medidas avulsas.
Estamos, então, perante um PS
balcanizado, que ora deixa passar tudo ora critica ferozmente tudo, sempre sem
fazer verdadeira oposição. E não era impossível fazer oposição.
O PS poderia funcionar como
fiscalizador da forma como o governo cumpre a missão. Cumprir o Memorando não
significa atirar uma manta para cima de todas as medidas com o rótulo da
inevitabilidade. Mesmo dentro da margem escassa que o documento oferece há a possibilidade
de fazer escolhas: como distribuir melhor a austeridade (dois terços sobre as
famílias é justo?), como gerir da forma menos danosa os cortes na máquina
pública (coutada socialista na qual o PSD precisa de bússola), onde traçar a
linha de cortes na saúde e na educação. O PS poderia zelar pela desprotecção de
negócios amigos do poder, pelo cumprimento da adiada renegociação dos contratos
das PPP.
O PS poderia fazer isto e
mais, mas não quer – e, sejamos justos, não pode. Afinal parte deste PS foi o
mesmo que andou a alimentar laços pouco saudáveis com negócios privados. A
outra parte talvez não saiba fazer melhor.
Pode argumentar-se que
alternativas viáveis e oposição responsável cairiam em saco roto – que o
governo não ouve, que é demasiado cedo para o PS se reorganizar depois da era
socrática. É verdade. Mas este PS não dá qualquer sinal de estar a caminhar
para algum lado. Isto é um problema porque o partido se demite do país, a
primeira vez que tal acontece num momento decisivo para Portugal. E é um
problema porque o PS pode vir a ser parte de um governo alargado, de
emergência. Reconstruindo-se como alternativa credível poderia ser relevante
num cenário de grande instabilidade – assim, valerá menos que as cadeiras que
ocupa no parlamento.
Título e Texto: Bruno Farias
Lopes, jornal “i”, 03-02-2012
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