Janer Cristaldo
Fim de festa! Estou cada vez
mais apaixonado pelo carnaval de São Paulo. É data que espero com ansiedade.
Peninha que acabou ontem. Eu, que abomino carnaval, festivais e multidões, bem
que gostaria de uma semana toda de carnaval em São Paulo.
Fosse São Paulo um eterno
carnaval, seria uma das cidades mais aprazíveis do mundo. Sexta-feira passada
saíram quase dois milhões de carros da cidade. Contando por baixo, são uns
quatro milhões de paulistanos a menos. É quando a cidade se torna habitável.
Conclusão que se impõe: há um excesso de quatro milhões de habitantes nesta
cidade. Fariam um grande favor aos homens sensatos – sim, eles ainda existem –
se ficassem no litoral pelo resto de suas vidas.
Carnaval? Ouvi até mesmo dizer
que existe em São Paulo. Parece que acontece lá pras bandas da Paulista. É o
que os jornais e a televisão me informam. Até acredito que seja verdade. Mas
não vi. É divino viver numa grande cidade brasileira onde se pode ter a
sensação de que carnaval não existe.
As pessoas que fogem do carnaval,
não só em São Paulo mas em todas as metrópoles brasileiras, nos levam a uma
primeira pergunta: será que brasileiro gosta de carnaval? É o que nos diz a
imprensa. Mas se só de São Paulo saem quatro milhões de paulistanos, quantos
turistas, nacionais ou estrangeiros, buscarão o carnaval em São Paulo. Quatro
milhões, certamente não. Nem mesmo um milhão.
São Paulo é o túmulo do samba,
dizia Vinicius de Moraes. Este é um dos encantos da cidade. Meus amigos
ocasionais – garçons, garçonetes, taxistas, a moça da banca de jornais, meu
barbeiro – sempre me perguntam onde vou passar o carnaval. Aqui, respondo.
Daqui não saio, daqui ninguém me tira, como dizia uma antiga marchinha. Ninguém
me arranca de São Paulo em um carnaval. Nem em feriadões.
Brasileiro só gosta de
carnaval em manchete de jornal ou televisão. É preciso manter o mito em pé.
Carnaval, na verdade, é algo que serve como fuga de muita gente rumo a um
melhor lazer. Ou atrapalha a vida de muita gente, que se obriga a fugir para
não ter de suportar seus ruídos. No fundo, uma minoria ruidosa que expulsa uma
maioria para o litoral.
Outro carnaval que não dá
certo é o transmitido pela televisão. Não passa de um desfilar monótono de
blocos, onde a coreografia anula até mesmo a beleza dos corpos. Não por acaso,
neste ano as TVs que transmitem os desfiles perderam pontos para os pastores
televisivos. Se os editores exibirem desfiles de anos passados, ninguém vai
notar a diferença.
Outro mito que está
intimamente associado a carnaval é o sexo. Carnaval é a versão tupiniquim das
lupercálias romanas. Ou melhor, a imprensa pretende que seja. Não sou
autoridade para falar do assunto, nunca participei de nenhum carnaval. O que
não me impede de matutar: se as pessoas ficam uma noite inteira olhando
desfiles ou sambando em blocos, onde o tempo – e a energia, que mais não seja –
para praticar sexo? Tendo a dizer que carnaval é um dos períodos mais castos da
nação brasileira.
Muito nu, muito rebolado,
muita paquera. Mas sexo, que é bom, duvido. Na rua não há de ser. Até pode ser,
mas é sexo pouco confortável. Nos motéis, suponho que não, afinal as pessoas
estão na avenida ou em salões. No dia seguinte, haja fôlego. Sexo em carnaval,
a meu ver, é tão mítico quanto Papai Noel. Ao contrário do que insinua a
imprensa, penso que as pessoas vão mais para pular e cantar, em suma, pour se défouler, como diriam os franceses.
Que mais não seja, o Brasil é
um eterno bacanal a qualquer dia do ano. As saunas e casas de swing estão sempre repletas de gente que
gosta do bom esporte e participa de partouses inimagináveis, nas quais não se
sabe onde começa nem onde termina o amontoado de carne humana.
Minha faxineira adoeceu e
enviou-me sua irmã. Que trabalha numa casa de swing. Como cozinheira, bem entendido. Sempre imaginei que tais
casas fossem algo mais ou menos paralelo à prostituição. Parece que não. Maria
me conta estarrecida:
- Professor, há casais que
freqüentam a casa há trinta anos. Outros vão em família. A avó, a mãe e a neta.
Uma delas me disse: “preciso me cuidar pra não pegar meu irmão na saleta”.
Ora, família que transa unida
permanece unida. Em uma sociedade permissiva, onde o sexo é moeda sonante, quem
vai perder tempo buscando sexo ocasional em carnaval? E se não for ocasional
não tem sentido. Sexo permanente sempre se tem. Nunca falta um chinelo velho
para um pé torto.
De minha parte, já estou com
saudades das carnes tolendas. Amanhã a cidade entra em seu ritmo infernal.
Verdade que isso não me afeta muito. Tenho a fortuna de viver em apartamento
extremamente silencioso, mesmo em épocas normais. Mas é muito agradável ver as
ruas desertas, os restaurantes sem fila, a vida transcorrendo mansa como em uma
cidadezinha interiorana.
Aos eventuais carnavalescos
que me lêem, deixo algumas perguntinhas. Brasileiro gosta de carnaval? Existe
sexo no carnaval? Quando? E onde?
Sou todo ouvidos.
Título e Texto: Janer
Cristaldo, publicado em seu blogue no dia 22-02-2012
Colaboração: Rafael Picate
Edição: JP
Foi em Salvador, Bahia, 2010
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