O artigo 326 do Código Penal é apenas um exemplo do desajustamento dos
textos legais à sociedade portuguesa. Incitar à insurreição violenta só é
verdadeiramente crime se este incitamento for proveniente de pessoas más; tal
não é o caso de Mário Soares, que é uma pessoa boa.
Ontem foi um dia paradigmático
da nossa disposição mental para a verdadeira democracia. Tudo é
tolerado, desde que oriundo de pessoas boas, com boa-fé, sem intenção de fazer verdadeiramente mal
aos outros. Forças policiais invadem a escadaria do Parlamento mas isso não é grave, não é
como se tivessem mesmo invadido o Parlamento; apenas mostraram que o podiam
fazer, se quisessem, algo que não querem porque são pessoas boas. É como ir um
careca na rua a acenar o bastão de basebol à pacata freira que passa: não é
grave, é uma demonstração de bondade; se quisesse espalhar a mioleira da idosa
pelas paredes do bairro podia fazê-lo mas, como no fundo é boa pessoa, tal como
Mário Soares o é, não o faz.
Vasco Lourenço diz que o governo pode ser corrido “à paulada”. Isto não é
grave; não é como se Vasco Lourenço fosse pegar ele próprio no pau e correr com
o governo; Vasco Lourenço é bom, as pessoas boas não fazem isso; poderiam
fazer, mas não fazem, porque são boas.
Mário Soares diz que governo e presidente devem apresentar a demissão “enquanto ainda podem ir para as suas casas pelo seu próprio pé”. Isto é só bondade; é
um aviso – de uma pessoa boa – dos riscos que governo e presidente correm; não
é como se fosse um vulgar fascista a dizer semelhante coisa; não é como se um
membro do PNR andasse a afirmar coisas graves, isso seria inaceitável, esses
não são pessoas boas; Soares é boa pessoa.
No país da cunha, só é crime
aquilo que é feito mesmo (mas mesmo) por mal, por maldade pura. Se é para o
bem, se não faz mal a ninguém bom, se não causa qualquer transtorno ao lado do
bem, o crime não é crime, é uma pequena malandrice, inconsequente, de pessoas
que só querem o paraíso terreno.
E este governo é ilegítimo; é
ilegítimo porque houve pessoas más que votaram neles; pessoas com mau fundo,
sem coração, gente que não pensa no bem comum, pessoas que não merecem o
privilégio de votarem já que não sabem o que andam a fazer. Uma pessoa não pode
andar por aí a estragar a democracia votando errado: isso põe em causa a
própria democracia. Ou aprendem a votar como deve ser ou então nós,
as pessoas boas, os guardiões da portugalidade, os que têm coração, nós teremos
que vos correr “à paulada” e já têm sorte se conseguirem ir
para as vossas casas “pelo vosso próprio pé”. Nós ainda não
fizemos isso, mas podemos fazer. Porque nós sim, nós somos
democratas e defendemos o país desses infiltrados no povo que continuam a achar
que podem fazer tudo o que lhes apetece. É preciso respeitar a vontade dos verdadeiros
portugueses.
Vitor Cunha, Blasfémias,
22-11-2013
Povo oferece-se para experiência
Helena Matos
Como reage um povo que elegeu um governo de
centro-direita quando todos os dias a todas horas, televisões e rádios, antigos
PR’s e ex-responsáveis militares os convocam à violência contra as instituições
democráticas?
Obs: dos presentes na Aula Magna quantos, à excepção de
Carlos do Carmo, cuja vida é cantar, já passaram pela experiência de não
receber ordenado no fim do mês ou não ter dinheiro para os pagar, ser despedido
ou ter de despedir, ver as encomendas a diminuir ou não ter trabalho? É que
quem fala da queda de um governo com tanta facilidade e alegria deve viver
naquela maravilhoso mundo dos militares de 1975 que levavam a vida em
assembleias, congeminações de golpes e contra-golpes… mas recebiam sempre o dia
certo.
Helena Matos, Blasfémias, 22-11-2013
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Não publicamos comentários de anônimos/desconhecidos.
Por favor, se optar por "Anônimo", escreva o seu nome no final do comentário.
Não use CAIXA ALTA, (Não grite!), isto é, não escreva tudo em maiúsculas, escreva normalmente. Obrigado pela sua participação!
Volte sempre!
Abraços./-