sexta-feira, 22 de novembro de 2013

Os 'verdadeiros e bons' portugueses querem derrubar um governo eleito por 'falsos e maus' portugueses...

Vitor Cunha
artigo 326 do Código Penal é apenas um exemplo do desajustamento dos textos legais à sociedade portuguesa. Incitar à insurreição violenta só é verdadeiramente crime se este incitamento for proveniente de pessoas más; tal não é o caso de Mário Soares, que é uma pessoa boa.

Ontem foi um dia paradigmático da nossa disposição mental para a verdadeira democracia. Tudo é tolerado, desde que oriundo de pessoas boas, com boa-fé, sem intenção de fazer verdadeiramente mal aos outros. Forças policiais invadem a escadaria do Parlamento mas isso não é grave, não é como se tivessem mesmo invadido o Parlamento; apenas mostraram que o podiam fazer, se quisessem, algo que não querem porque são pessoas boas. É como ir um careca na rua a acenar o bastão de basebol à pacata freira que passa: não é grave, é uma demonstração de bondade; se quisesse espalhar a mioleira da idosa pelas paredes do bairro podia fazê-lo mas, como no fundo é boa pessoa, tal como Mário Soares o é, não o faz.

Vasco Lourenço diz que o governo pode ser corrido “à paulada”. Isto não é grave; não é como se Vasco Lourenço fosse pegar ele próprio no pau e correr com o governo; Vasco Lourenço é bom, as pessoas boas não fazem isso; poderiam fazer, mas não fazem, porque são boas.

Mário Soares diz que governo e presidente devem apresentar a demissão “enquanto ainda podem ir para as suas casas pelo seu próprio pé”. Isto é só bondade; é um aviso – de uma pessoa boa – dos riscos que governo e presidente correm; não é como se fosse um vulgar fascista a dizer semelhante coisa; não é como se um membro do PNR andasse a afirmar coisas graves, isso seria inaceitável, esses não são pessoas boas; Soares é boa pessoa.

No país da cunha, só é crime aquilo que é feito mesmo (mas mesmo) por mal, por maldade pura. Se é para o bem, se não faz mal a ninguém bom, se não causa qualquer transtorno ao lado do bem, o crime não é crime, é uma pequena malandrice, inconsequente, de pessoas que só querem o paraíso terreno.

E este governo é ilegítimo; é ilegítimo porque houve pessoas más que votaram neles; pessoas com mau fundo, sem coração, gente que não pensa no bem comum, pessoas que não merecem o privilégio de votarem já que não sabem o que andam a fazer. Uma pessoa não pode andar por aí a estragar a democracia votando errado: isso põe em causa a própria democracia. Ou aprendem a votar como deve ser ou então nós, as pessoas boas, os guardiões da portugalidade, os que têm coração, nós teremos que vos correr “à paulada” e já têm sorte se conseguirem ir para as vossas casas “pelo vosso próprio pé”. Nós ainda não fizemos isso, mas podemos fazer. Porque nós sim, nós somos democratas e defendemos o país desses infiltrados no povo que continuam a achar que podem fazer tudo o que lhes apetece. É preciso respeitar a vontade dos verdadeiros portugueses.
Vitor Cunha, Blasfémias, 22-11-2013

Povo oferece-se para experiência
Helena Matos
Como reage um povo que elegeu um governo de centro-direita quando todos os dias a todas horas, televisões e rádios, antigos PR’s e ex-responsáveis militares os convocam à violência contra as instituições democráticas?

Obs: dos presentes na Aula Magna quantos, à excepção de Carlos do Carmo, cuja vida é cantar, já passaram pela experiência de não receber ordenado no fim do mês ou não ter dinheiro para os pagar, ser despedido ou ter de despedir, ver as encomendas a diminuir ou não ter trabalho? É que quem fala da queda de um governo com tanta facilidade e alegria deve viver naquela maravilhoso mundo dos militares de 1975 que levavam a vida em assembleias, congeminações de golpes e contra-golpes… mas recebiam sempre o dia certo.
Helena Matos, Blasfémias, 22-11-2013

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